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Eleições na Argentina: Milei é favorito, mas eleição está acirrada, diz CEO da AtlasIntel

Para Andrei Roman, candidato ultraliberal deve levar 80% dos votos de Bullrich e teve poucos danos por ir mal em debate

Javier Milei: candidato fez discurso de encerramento da campanha em Córdoba, na quinta, 16 (Diego Lima/AFP)

Javier Milei: candidato fez discurso de encerramento da campanha em Córdoba, na quinta, 16 (Diego Lima/AFP)

Rafael Balago
Rafael Balago

Repórter de macroeconomia

Publicado em 17 de novembro de 2023 às 15h08.

Última atualização em 17 de novembro de 2023 às 18h06.

O deputado ultraliberal  Javier Milei é o favorito para vencer a eleição argentina e conquistar a Presidência neste domingo, 19, avalia Andrei Roman, CEO do instituto de pesquisas AtlasIntel, mas o cenário é bastante incerto.

"Milei aparece na frente na nossa pesquisa, fora da margem de erro de quatro pontos de diferença, então o cenário-base é uma vitória. Ele não é um favorito categórico, é uma margem relativamente estreita, em um contexto de volatilidade eleitoral. É uma margem que pode desaparecer com alguma facilidade", diz Roman, em entrevista à EXAME.

Na última pesquisa AtlasIntel, divulgada na sexta-feira passada, 10, Milei lidera com 52,1% das intenções, ante 47,9% de Sergio Massa, candidato do peronismo. Uma pesquisa da instituição foi a que mais se aproximou do resultado do primeiro turno, que teve vitória de Massa, enquanto muitos estudos apontaram que Milei chegaria na frente. 

A seguir, mais trechos da conversa com Roman: 

Como vê o cenário para a votação deste domingo?

A gente tem, pela primeira vez na Argentina, a emergência de um candidato muito forte de direita radical [Milei], que tem um uso muito forte das redes sociais, um discurso político irreverente, mais agressivo, não politicamente correto. Mas, ao mesmo tempo, ele engloba referências muito fortes ao popcountry da Argentina, então eles se comporta como uma espécie de músico de rock.

Existe também uma grande raiva em relação à situação econômica do país depois do fracassado governo de Alberto Fernández, que não conseguiu estabilizar a economia, muito pelo contrário. Vemos uma escalada quase hiperinflacionária, grandes níveis de desemprego e uma desvalorização brutal da moeda nacional. Nesse contexto, a eleição de uma plataforma de continuidade seria bem difícil. 

E a outra proposta de oposição, da Patrícia Bullrich, carecia de entusiasmo, de um lado por conta do carisma, que não foi tão forte da Patrícia, e por uma lembrança de que o governo Macri não entregou o esperado. 

Milei tem conseguido atrair os votos de Bullrich?

É razoável pensar que ele poderia acumular mais ou menos 80% dos votos da Patricia Bullrich e metade dos votos de Juan Schiaretti (4º colocado no 1º turno)  falando de maneira aproximada. E então ele poderia chegar a 56, 57% dos votos. Nossa última pesquisa apontou 52%. 

Como avalia o desempenho de Milei na campanha do segundo turno e sua aproximação de Bullrich e Macri?

Milei já tinha um trânsito bastante natural no eleitorado de Patricia Bullrich e do [ex-presidente] Mauricio Macri, que é um eleitorado do PRO, o núcleo de direita dura dentro do Juntos por el Cambio, o veículo de centro-direita de Macri quando ele era presidente. Esse núcleo mais político é talvez mais sedimentado do ponto de vista ideológico, se trata de um eleitorado anti-peronista e que com muita dificuldade poderia votar em um candidato de esquerda. 

A tendência natural era que esses eleitores fossem aderir a Milei simplesmente por ele representar a oposição e o kircherismo de Massa. Evidentemente, o apoio explícito e a mobilização ajudam ainda mais nessa aderência e a mobilizar esses eleitores para que eles compareçam no dia da votação. 

Como avalia a estratégia de Massa, que tem apostado na questão do medo, ao destacar possíveis cortes de subsídios, por exemplo?

Era a única estratégia que Massa tinha. Quando você tem um governo com 80% de desaprovação, uma situação econômica desastrosa e representa a continuidade dessa proposta política, sua única chance é atacar o adversário. A campanha dele entregou com muita competência essa desconstrução do adversário a partir de uma campanha de medo muito contundente, muito agressiva. 

A gente viu vídeos de crianças pegando armas atirando em corredores de escola para representar o perigo do que seria uma flexibilização do direito de porte de armas no país. É uma campanha de agressividade que a gente nunca viu no Brasil. Vimos também o uso do aparelho do Estado para fazer esse tipo de propaganda em todo território nacional de uma maneira muito intensa. 

Foi uma estratégia conduzida com muito agressividade, então abre um dilema se não passou do ponto, se foi agressiva ao ponto de algumas pessoas questionarem se foi justa. Mas em grandes linhas, foi uma estratégia acertada. Isso não necessariamente quer dizer que é fácil mover esses votos. A agressividade da estratégia indica quanto é difícil desmobilizar os eleitores da oposição nesse contexto de desaprovação tão alta do governo atual 

A Argentina tem também toda uma máquina política do peronismo, que é muito relevante e mobiliza os eleitores no dia da votação, que oferece de fato compra de votos. É um fenômeno bem detalhado na literatura sobre o assunto.

Qual o peso da rejeição aos candidatos nessa disputa?

Vai ser um voto de rejeição para quase um quarto do eleitorado, talvez até mais. Quem vai decidir de fato a eleição são os eleitores que não têm uma imagem favorável nem do Massa nem do Milei, mas precisarão decidir qual o mal menor. 

Que fatores podem definir a eleição no domingo? Há regiões e perfis de público que podem ser decisivos?

Essa máquina peronista é mais forte na região da periferia de Buenos Aires. A mobilização nessa região no passado foi decisiva para o resultado eleitoral em vários ciclos. Se o Sergio Massa ganhar, provavelmente será por conta de uma mobilização muito mais forte do que o esperado nessa região.

Do lado do Milei, ele tem uma grande fortaleza no público jovem, então qualquer desmobilização dos jovens até 24 anos, será um grande prejuízo para a campanha dele. Ele tem uma massificação da campanha mais no interior do país, em regiões rurais e em capitais de províncias distantes de Buenos Aires. Uma desmobilização nessas regiões mais distantes afetará o desempenho do Milei. 

Nessa semana, as pesquisas são vetadas, mas tivemos dois fatos. Um foi o debate, em que Massa se saiu melhor, e a divulgação de dados da inflação, que veio um pouco abaixo do esperado. Esses dois fatos podem mexer com a votação?

Em princípio, poderia. O debate era muito esperado, teve uma audiência enorme. Massa ganhou o debate. A intuição lógica era a de que em um debate em que um candidato vence de maneira bem clara, isso o ajudaria em termos da preferência dos eleitores. No entanto, não acredito do que isso aconteceu, por conta da dinâmica do debate, em que o Milei não assustou nem projetou nenhum tipo de ameaça autoritária ou propostas demasiadamente problemáticas para eleitores mais moderados. Era talvez o grupo de eleitores que era vulnerável para o Milei, no sentido de que teria incentivos para se distanciar dele. No entanto, ele simplesmente projetou uma imagem muito mais moderada. 

Sobre a inflação, um ponto percentual acima ou abaixo não vai mudar a percepção dos argentinos de que há uma taxa absolutamente aceitável de inflação no país.

A Argentina terá um feriado na segunda. Isso pode afetar o resultado da eleição?

Acredito que não, porque é uma eleição extremamente polarizada. Teremos um índice de participação muito alto. Poucos eleitores decidirão não votar. Os eleitores que poderiam viajar seriam mais os de alta escolaridade e renda, e não há uma vantagem muito clara do Milei nesse perfil, e ele aparece na frente nas nossas pesquisas. Não vejo isso como um fator que pode afetar o desempenho eleitoral do Milei. Na margem poderia afetar um pouco, talvez o desempenho do Massa, mas de maneira quase irrelevante. 

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