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Democratas abrem convenção tentando mostrar uma frente unida anti-Trump

Joe Biden fez uma aparição rápida, mas o tom geral da 1ª noite da convenção democrata foi mostrar os riscos de outros quatro anos de Trump na Casa Branca

Joe Biden: início da convenção democrata serviu para dar um gás em sua candidatura (Morry Gash/AP Photo/Bloomberg via Getty Images/Getty Images)

Felipe Giacomelli

Publicado em 18 de agosto de 2020 às 06h31.

Última atualização em 18 de agosto de 2020 às 06h50.

Na noite de estreia da convenção menos convencional da história americana, realizada com depoimentos em vídeo e sem a pompa tradicional, a única certeza era a enxurrada de críticas contra Donald Trump .

Joe Biden , que será formalmente indicado como candidato do Partido Democrata na quinta-feira, foi lembrado e fez uma aparição surpresa. Mas o tom geral da primeira noite – e provavelmente das três próximas – foi mostrar os riscos de outros quatro anos de Trump na Casa Branca.

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As menções diretas ao presidente foram poucas, mas ao ponto. Mesmo assim, o espectro de Trump esteve no ar durante todas as duas horas da transmissão pela TV: da divisão que ele semeou durante a convulsão racial de dois meses atrás aos tropeços no combate à pandemia do coronavírus.

A estrela da noite foi Michelle Obama, a última a discursar. Em depoimento gravado, a ex-primeira-dama levantou dúvidas sobre o caráter e a competência de Trump.

“O trabalho [do presidente] é difícil. Exige clareza para julgar, lidar com opiniões conflitantes e capacidade de ouvir. E a crença de que cada uma das 328 milhões de vidas deste país têm significado e valor”, disse Michelle Obama. “Não tem como enganar. [A presidência] revela quem você é.”

Michelle Obama mencionou a aparente falta de empatia de Trump, lembrando dos pais separados por filhos na fronteira com o México e a repressão violenta aos protestos na frente da Casa Branca. “Se você acha que as coisas não podem piorar, é o que vai acontecer se não elegermos Joe Biden.”

Outro discurso muito aguardado foi o do senador Bernie Sanders, líder da ala esquerdista democrata e maior rival de Biden na disputa pela candidatura.

Há quatro anos, Sanders levou sua campanha das primárias até o último momento possível, mesmo sabendo que não tinha chances de derrotar Hillary Clinton. Na convenção, seus apoiadores vaiaram a ex-primeira-dama – e essa divisão interna, na opinião de Hillary, ajudou a eleger Trump.

Desta vez, Sanders está inteiramente dedicado à chapa Biden-Harris – por causa de Donald Trump. Um autodeclarado socialista democrático, o senador anunciou há meses que será presença constante na campanha e conclamou seus apoiadores a fazer o mesmo.

“Vou falar para os milhões que me apoiaram. Obrigado pelo apoio. Movemos o país num direção nova e corajosa. Nossa campanha terminou há meses, mas nosso movimento continua. Mas sejamos claros: se Trump for reeleito, todo esse avanço estará em risco.”

A eleição de 3 de novembro será “a mais importante da história moderna” dos Estados Unidos, afirmou Sanders. Ele notou as diferenças entre seu programa de governo e o de Biden, mas na sua opinião o que está em jogo é algo maior: a própria democracia.

Sanders lembrou um tuíte recente de Trump aventando um adiamento da eleição por causa do coronavírus. Ontem, horas antes do início da convenção, Trump voltou a afirmar que a única explicação para uma derrota nas urnas seria uma eleição “fraudada”. “Nero tocou violino enquanto Roma pegava fogo. Trump joga golfe”, disse Sanders.

As críticas mais diretas à atuação do governo federal diante da pandemia do coronavírus – que deve ser o tema central da eleição – ficaram por conta de dois governadores.

Gretchen Whitmer, a quem Trump se referiu durante a pandemia como “aquela mulher de Michigan”, disse que o presidente “luta contra os americanos, em vez de lutar contra o vírus que está no matando e à economia”.

Andrew Cuomo, governador de Nova York e uma das lideranças regionais a ganhar projeção nacional no início da pandemia, disse que a Covid-19 é um sintoma de uma doença maior. “O vírus ataca quando o corpo está fraco”, afirmou Cuomo.

“Trump não criou a divisão inicial. A divisão criou Trump; ele só a agravou. Nossa força coletiva se exercita no governo e ela de fato é nosso sistema imunológico. O governo atual é disfuncional e incompetente e não teria como combater o vírus. Hoje, seis meses depois, continuamos despreparados”, disse o governador.

Discurso de Michelle Obama: coronavírus obrigou a convenção democrata a ser virtual pela primeira vez (Daniel Acker/Bloomberg via Getty Images)

Republicanos anti-Trump

Republicanos de destaque também apareceram no vídeo para declarar apoio ao candidato democrata: Christine Whitman, ex-governadora de Nova Jersey, Meg Whitman, ex-presidente do eBay e da HP, e John Kasich, ex-governador de Ohio e pré-candidato republicano na eleição de quatro anos atrás.

“Sou republicano minha vida toda, mas essa associação fica em segundo lugar diante da minha responsabilidade perante meu país. Foi por isso que decidi aparecer nesta convenção”, afirmou Kasich. “Em tempos normais, algo assim provavelmente nunca aconteceria. Mas estes não são tempos normais.”

Horas antes do início da programação oficial, Miles Taylor, que foi chefe de gabinete do ministério da Segurança Nacional (Homeland Security), tornou-se o mais alto ex-integrante do governo Trump a apoiar Biden.

Num vídeo publicado pelo grupo Eleitores Republicanos Contra Trump, Taylor se disse “aterrorizado” com a incapacidade do presidente. Trump “queria explorar o ministério para seus objetivos políticos pessoais, para levar adiante sua agenda”.

Um formato inusitado

O evento foi apresentado de um estúdio em Los Angeles pela atriz Eva Longoria, famosa por sua participação na série “Desperate Housewives”.

Depois de uma introdução com montagens de crianças cantando o hino nacional e uma prece liderada por um pastor latino da Flórida, Longoria disse que “a esperança é que estivéssemos todos juntos” em Milwaukee, mas não seria possível fazê-lo com segurança. Longoria então entrevistou via videoconferência quadro cidadãos de diferentes partes do país falando de suas experiências com a pandemia.

A primeira hora da transmissão (que não foi exibida na TV aberta) teve menos nomes de peso. Sem a animação e os milhares de pessoas lotando um ginásio, os produtores tiveram de encontrar maneiras de preencher o tempo sem enfileirar um discurso depois do outro.

Philonise Floyd, irmão de George Floyd, cujo assassinato pela polícia de Minneapolis desencadeou uma onda de protestos raciais em junho, lembrou o irmão e outros negros vítimas de violência policial e pediu um minuto de silêncio – durante o qual a TV mostrou pessoas comuns de olhos fechados em suas casas.

Na sequência, o próprio Biden apareceu entrevistando, também via vídeo, ativistas negros e Gwen Carr, mãe de Eric Garner, também assassinado por policiais que o sufocaram em Nova York, em 2014. A aparição do candidato logo no começo dos trabalhos foi uma surpresa – normalmente eles só aparecem no momento de discursar.

Um dos ataques mais ferinos contra Trump foi o de Kristin Urquiza. Seu pai morreu aos 65 anos por complicações de Covid-19, e ela culpou diretamente Trump pela tragédia familiar. Urquiza afirmou que seu pai acreditou nas palavras do presidente quando ele disse que era hora de reabrir a economia. Em meados de maio, ele foi a um bar com amigos no Arizona (um dos primeiros estados a reabrir), onde contraiu o coronavírus.

“Basta. Trump pode não ter causado o coronavírus, mas sua desonestidade e suas ações irresponsáveis pioraram muito as coisas.” Momentos depois, uma montagem mostrou fotos de algumas das mais de 170 000 vítimas de Covid-19 nos Estados Unidos até aqui.

Para um formato completamente novo, a primeira impressão foi positiva. Em alguns momentos, a programação parecia mais um longo comercial de político, como observou um comentarista do New York Times. Mas, num ano como 2020, o simples fato de a transmissão ter corrido sem maiores problemas técnicos pode ser considerado uma vitória.

Na noite de hoje, aparecem diante das câmeras a deputada de Nova York e estrela ascendente da esquerda americana Alexandria Ocasio-Cortez, o ex-presidente Bill Clinton e a mulher de Joe Biden, Jill Biden.

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