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Com dengue em alta, América Latina enfrenta duas epidemias ao mesmo tempo

A chegada do coronavírus afastou a atenção e os recursos da luta contra a doença transmitida pelo mosquito Aedes aegypti

Dengue: agente de saúde faz fumegação para combater proliferação do mosquito transmissor da dengue em escola (Jorge Adorno/Reuters)

Dengue: agente de saúde faz fumegação para combater proliferação do mosquito transmissor da dengue em escola (Jorge Adorno/Reuters)

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Reuters

Publicado em 12 de maio de 2020 às 20h00.

Última atualização em 12 de maio de 2020 às 20h42.

Enquanto o coronavírus mata milhares de pessoas e domina a atenção dos governos na América Latina, outra infecção viral letal está silenciosamente afetando países da região.

A dengue é endêmica em grande parte da América Latina, mas a chegada da Covid-19 afastou a atenção e os recursos da luta contra a doença transmitida pelo mosquito Aedes aegypti, dizem médicos e autoridades.

A Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) prevê que 2020 seja marcado por altos índices de dengue, que podem encher unidades de terapia intensiva e matar pacientes em meio à pressão da Covid-19, a doença respiratória causada pelo novo coronavírus.

Em todo o mundo, a Covid-19 afetou outras doenças de maneiras diferentes. Embora na Europa as medidas para conter o coronavírus tenham banido a gripe sazonal, na África o fechamento das fronteiras interrompeu o transporte de vacinas contra sarampo e outros suprimentos.

Na América Latina, uma epidemia de dengue que começou no final de 2018 ainda está sendo sentida. As infecções por dengue nas Américas subiram para uma alta histórica de 3,1 milhões em 2019, com mais de 1.500 mortes na América Latina e no Caribe, de acordo com a Opas.

Os casos da doença devem começar a cair no segundo semestre do ano, disse a organização.

Os surtos de dengue geralmente ocorrem três a cinco anos após a epidemia anterior. E com quatro cepas de dengue em circulação, as pessoas podem pegá-la mais de uma vez, sendo mais provável que o segundo caso seja grave.

"A Covid é a estrela no momento, então toda a atenção está sendo dedicada à Covid, mas ainda há problemas com a dengue", disse o doutor Jaime Gomez, que trabalha em um hospital em Floridablanca, na província de Santander, na Colômbia.

Embora a dengue geralmente não seja fatal e possa ser tratada com analgésicos, alguns sofrem com sintomas persistentes como fadiga, perda de peso e depressão que afetam a capacidade de trabalhar. A dengue grave é tratada com fluidos intravenosos e aqueles que não são testados correm risco de complicações perigosas.

Esse tipo de intervenção médica não pode ser dada se os pacientes ficarem em casa, preocupados em contrair coronavírus, ou se os hospitais superlotados tiverem que recusá-los.

Com relativamente poucos casos de Covid-19 na província onde ele trabalha, Gomez disse que sua clínica viu as hospitalizações caírem pela metade, pois as pessoas temem se aventurar ao ar livre.

"Sistema em colapso"

A advogada paraguaia Sonia Fernández evitou procurar atendimento quando ela e suas duas filhas, de 11 e 8 anos, ficaram doentes com dengue no início de abril.

"Nós três tínhamos dengue, todos os sintomas, mas não fomos a uma clínica ou centro de saúde para não nos expor (à Covid-19)", disse Sonia Fernández.

As três conseguiram se recuperar.

Os casos de dengue no Paraguai explodiram este ano. Nas primeiras 18 semanas de 2020, o país registrou 42.710 casos confirmados e 64 mortes, em comparação com 384 casos confirmados e seis mortes no mesmo período do ano anterior.

No Brasil, quando se compara a distribuição dos casos prováveis de dengue por semana epidemiológica de início dos sintomas em relação aos anos epidêmicos de 2015, 2016 e 2019, observa-se que em 2020, a curva epidêmica dos casos prováveis ultrapassa o número de casos dos anos epidêmicos de 2015 e 2019 até a semana 7 (9 a 15 de fevereiro), de acordo com boletim do Ministério da Saúde.

Entre as semanas 7 e 11, no entanto, o número de casos prováveis diminui em relação ao ano de 2015. A partir da semana 11, observa-se também uma diminuição dos casos prováveis em relação ao ano de 2019.

"Vale destacar, no entanto, que os dados ainda estão em processo de atualização e digitação, podendo contribuir para uma subnotificação dos casos nesse período", disse o Ministério da Saúde em boletim epidemiológico.

Até o momento, foram confirmados 485 casos de dengue grave e 6.050 casos de dengue com sinais de alarme no Brasil, com 265 óbitos por dengue no país.

No Equador, onde o surto de coronavírus atingiu fortemente e os hospitais da cidade de Guayaquil ficaram sobrecarregados, uma aparente queda no número de casos de dengue pode mascarar outros problemas.

Segundo o Ministério da Saúde do Equador, os casos de dengue chegaram a 888 na semana que terminou em 14 de março, duas semanas depois que o país confirmou seu primeiro caso de Covid-19. Na semana até 4 de abril, os casos caíram para 257.

"Claramente, a dengue está sendo subnotificada", disse Estebán Ortiz, pesquisador de saúde global da Universidade das Américas de Quito.

"Os casos não diminuíram, o diagnóstico de casos diminuiu, o que confirma que o sistema entrou em colapso total", acrescentou.

O Ministério da Saúde do Equador informou em comunicado que o país não estava mais exposto ao duplo impacto da Covid-19 e da dengue do que qualquer outro na região, acrescentando que possui suprimentos suficientes para tratar casos da doença transmitida por mosquitos.

A dengue também aumentou muito na América Central. Casos na Costa Rica quase triplicaram até 1º de maio em comparação com um ano atrás, para mais de 2.000.

"Estamos passando por um momento difícil ao lidar com a Covid-19, mas infelizmente outras doenças continuam seu ciclo", disse recentemente a jornalistas Rodrigo Marin, diretor da agência de vigilância sanitária da Costa Rica.

No Panamá, onde a dengue causou pelo menos duas mortes este ano, a autoridade de saúde da Cidade do Panamá Yamileth López também fez o alerta em uma entrevista à Reuters. "A dengue também mata", disse ela.

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