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Com Congresso hostil, conservadores disputam a presidência do Peru

Keiko Fujimori e Pedro Castillo disputam eleição, mas nenhum dos dois tem apoio da maioria da população

Protestos no Peru em 2020: candidatos têm projetos econômicos opostos, mas posições conservadoras em relação aos costumes (Ernesto Benavides/Getty Images)
EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 6 de junho de 2021 às 08h56.

De um lado, jogadores de futebol, antigos políticos e alguns empresários, além do Nobel de Literatura e colunista do jornal O Estado de S. Paulo Mario Vargas Llosa, endossam a candidatura de Keiko Fujimori e sua agenda voltada à recuperação econômica do Peru. Do outro, professores, sindicatos, setores do campo e políticos de esquerda apoiam Pedro Castillo e sua agenda de um Estado mais atuante.

Em meio à pandemia e um Congresso rachado, os eleitores escolherão neste domingo, 6, o presidente do Peru entre dois candidatos que têm projetos econômicos opostos, mas posições conservadoras em relação aos costumes.

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Castillo, de uma esquerda radical que se aproxima do chavismo na Venezuela, e Keiko, da direita conservadora, encerraram a campanha pedindo aos peruanos que não deixem de votar. Mas nenhum deles representa a maioria do eleitorado — Castillo venceu o primeiro turno com 18,9% votos e Keiko teve 13,4% — e quem quer que seja eleito terá o desafio de buscar acordos com o Congresso e conter a crise que levou o país a ter quatro presidentes desde 2018.

"Não podemos esquecer que eles representam minorias do país, as minorias mais importantes, mas ainda assim minorias. Nenhum obteve 20% ou mais dos votos. Com isso, não acredito que haja condição, no curto prazo, para existir uma aliança nacional. A sociedade em seu conjunto está muito ferida, essa campanha insultou e rechaçou o contrário", explicou o cientista político peruano Carlos Meléndez ao jornal O Estado de S. Paulo.

Um dos temas que expõem as diferenças entre os dois é o discurso sobre o combate à covid-19. Keiko fala em parcerias público-privadas para a compra de imunizantes de qualquer origem. Castillo, por sua vez, tem uma visão mais estadista e fala em comprar vacinas de países com o mesmo alinhamento ideológico, como China e Rússia.

Mas uma abordagem em comum entre os dois é a sobre a imigração venezuelana. "Keiko usa muito isso para aflorar os medos, diz que Castillo terá um modelo comunista para tratar do assunto. Castillo disse ao encerrar a campanha que expulsará todos os venezuelanos associados a delitos", diz Meléndez.

Surpresa do campo

Castillo foi a grande surpresa da eleição, nenhuma pesquisa ou analista falava em tê-lo na disputa do segundo turno. Nascido na região de Cajamarca, o professor primário e ativista liderou o primeiro turno representando a extrema esquerda e prometendo políticas marxistas e leninistas.

Com 51 anos, Castillo nega ser chavista, mas defende um papel econômico ativo do Estado na economia. O professor representa hoje uma ala que diz ser uma opção ao establishment político, mas tem práticas populistas que preocupam setores peruanos.

"Em um momento, (Castillo) disse que dissolveria o Congresso, em outro que dissolveria o Tribunal Constitucional ou a Defensoria do Povo, mas nunca disse por meio de qual mecanismo. A nossa Constituição não permite a dissolução do Tribunal ou da Defensoria, apenas do Congresso, segundo as normas que mencionei. Há um temor de que Castillo não respeite a institucionalidade democrática. Há setores preocupados com o Estado de Direito e isso causa instabilidade política e jurídica", afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo o advogado penalista Carlos Caro Coira.

"Se considerarmos populista aquele que adota um discurso de divisão, no qual o povo é o máximo soberano do país, Castillo representa isso perfeitamente. Acho até que é mais populista do que comunista, ele é um líder de assembleias, criado em protestos e greves", diz Melendez.

Um cenário de avanço da pandemia e da diferença social no país, a descrença com a política tradicional, somada ao descontentamento da ala do campo, que se sente abandonada por Lima, pode levar à vitória do professor de origem camponesa.

Continuidade

Representando o establishment político e a continuidade do projeto neoliberal de seu pai, Alberto Fujimori, Keiko chega ao segundo turno apesar de ser acusada de lavagem de dinheiro e ver seu partido envolvido com o escândalo da Lava Jato peruana. "Não queremos que o país fique nas mãos de um comunista", disse à AFP Cecilia Yep, comerciante de 52 anos, filha de imigrantes chineses, ao explicar por que apoia Keiko.

"O fujimorismo de Alberto foi populista, tinha o mesmo discurso antiestablishment, mas com o tempo foi mudando. Hoje, Keiko é a que melhor representa o status quo. O abraço de Álvaro Vargas Llosa e Keiko na quinta-feira é uma demonstração de reconciliação para o mercado financeiro. Keiko defende a Constituição de 1993, o modelo econômico neoliberal", diz Melendez.

Com 46 anos, Keiko já havia se candidatado em 2011 e 2016. Chegou a ser detida no âmbito do escândalo de corrupção envolvendo a Odebrecht, mas chega ao segundo turno em empate técnico com Castillo.

Apesar de ter os maiores índices de rejeição entre os candidatos a recuperação econômica e o combate à covid-19, combinados com o apoio de grupos leais ao fujimorismo e movimentos como o de Vargas Llosa, que pede o voto de Keiko para manter o país no atual rumo, podem levar Keiko à presidência.

Valores mantidos

Seja Castillo ou seja Keiko, o povo peruano não sentirá muita diferença quando o tema é política social. Castillo é contra a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo, do aborto e da eutanásia. Keiko defende "mão dura" com a questão de segurança e defende uma "demodura", ou "democracia dura".

"Esses temas não são muito discutidos aqui. O Peru não fez parte da onda progressista que tomou países da América do Sul, como Argentina, Uruguai e Chile. Lamentavelmente, a classe média peruana, de forma geral, é muito conservadora. Aqui, como no Brasil, os setores conservadores têm grande capacidade de mobilização", afirma Meléndez.

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