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Campanha militar da Venezuela leva 5 mil civis a fugirem para a Colômbia

Megaoperação tem como alvo suposto grupo criminoso que opera dentro de sua fronteira perto da Colômbia

A operação representa uma abordagem diferente da usada contra as organizações ilícitas nas fronteiras (Carlos Garcia Rawlins/Reuters)

A operação representa uma abordagem diferente da usada contra as organizações ilícitas nas fronteiras (Carlos Garcia Rawlins/Reuters)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 5 de abril de 2021 às 10h21.

A Venezuela está empreendendo sua maior campanha militar em décadas, tendo como alvo o que diz ser um grupo criminoso que opera dentro de sua fronteira perto da Colômbia. A operação forçou a fuga de 5 mil venezuelanos para o país vizinho e alguns dos que se refugiaram na cidade colombiana de Arauquita denunciam que o Exército matou civis e os fez passar por guerrilheiros.

A operação - que começou com vários ataques aéreos - representa um afastamento da abordagem empregada contra as organizações ilícitas nas fronteiras. Durante anos, funcionários do governo de Nicolás Maduro toleraram e até cooperaram com esses grupos armados, muitos deles com raízes na Colômbia, enquanto transportavam drogas e outros contrabandos. Agora o país atacou um deles.

Maduro afirmou que o ataque reflete a política de "tolerância zero em relação aos grupos armados colombianos irregulares". Mas analistas são céticos sobre a explicação. "Nunca vimos algo assim nessa escala", disse Kyle Johnson, fundador da Conflict Responses, uma organização sem fins lucrativos com foco em questões de segurança com sede em Bogotá.

A campanha militar começou no dia 21 em Apure, um dos Estados mais pobres da Venezuela, e causou a morte de nove pessoas que o governo venezuelano considera guerrilheiros.

No município colombiano de Arauquita, Emir Ramírez diz que fugiu da Venezuela antes que seus pais, um irmão e um tio fossem mortos por militares venezuelanos. Ramírez mostra com revolta as fotos de seus parentes assassinados, alguns usando botas e portando armas que ele diz nunca ter visto. "Por que os assassinaram?", questiona o comerciante de 26 anos, defendendo a inocência dos parentes. "Não eram guerrilheiros."

Ramírez temeu por sua vida e a de sua mulher e fugiu com ela em uma canoa pelo Rio Arauca para o lado colombiano, onde tem mais parentes e um filho de 7 anos. Em vão, tentou convencer os pais a acompanhá-lo.

Os parentes de Ramírez foram mortos no dia 25. Naquela mesma noite, um conhecido lhe mostrou pelo celular fotos dos corpos dos pais dele, do irmão Uriel e do tio Yanfran, vestidos com uniforme militar e armados.

"A primeira foto que vi foi a da minha mãe, com um revólver jogado no chão ao lado dela. Com botas que dizem ser de guerrilheira", lembra, incrédulo. Na imagem seguinte, seu pai jaz com botas, calças verdes e um revólver do lado.

Carlos Valdés, ex-diretor de Medicina Legal na Colômbia, investigou execuções de civis pelas mãos de militares colombianos que os faziam passar por guerrilheiros. Para o analista forense, os corpos da família de Ramírez foram dispostos para que aparecessem de barriga para cima, com uma arma na mão em um mesmo "padrão de simulação".

O governo Maduro culpa seu vizinho de descuidar os 2.200 km de fronteira e permitir a expansão de grupos armados. Mas a Colômbia e a oposição venezuelana asseguram que Caracas pretende com esta ofensiva ajudar guerrilheiros dissidentes colombianos na luta que travam com outra facção pelo controle do tráfico de drogas.

O ataque, centrado em torno de La Victoria, uma cidade de cerca de 10 mil habitantes, tem como alvo uma facção de dissidentes das Farc conhecida como a Décima Frente, segundo moradores locais, levando especialistas em segurança a sugerir que eles podem ter quebrado regras estabelecidas pelo governo Maduro ou seus aliados.

Os ataques aéreos foram seguidos de combates terrestres entre os militares venezuelanos e a Décima Frente, disse Juan Francisco García, do grupo venezuelano de direitos humanos Fundaredes. Ele descreveu "uma população civil presa entre grupos beligerantes".

Ataque

"Ainda estava escuro quando comecei a ouvir os caminhões", disse Miguel Antonio Villegas, de 66 anos, porta-voz chefe do conselho comunitário de La Victoria. "Depois, as bombas começaram."

Os bombardeios continuaram na área próxima a La Victoria e soldados começaram a invadir a cidade, interrogando civis e entrando em suas casas, acusando-os de colaborar com a guerrilha.

Aparentemente, os dissidentes das Farc responderam à ofensiva. Dois dias após o início da campanha militar, uma bomba explodiu deixando a cidade sem energia elétrica, um ataque que a Fundaredes atribuiu aos guerrilheiros.

No dia seguinte, os ataques aéreos foram tão perto de La Victoria que centenas de pessoas começaram a cruzar o estreito rio que separa a cidade venezuelana de Arauquita, na Colômbia.

O governo venezuelano designou dois promotores para investigar as acusações de abusos, anunciou o procurador-geral, Tarek Saab. Mas também procurou limitar a cobertura noticiosa da campanha militar, segundo Fundaredes.

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