Mundo

Após discurso e sob pressão para aceitar acordo em Gaza, Netanyahu se encontra com Kamala e Biden

Casa Branca reitera apoio a Israel, mas desconfiança mútua é crescente

Agência o Globo
Agência o Globo

Agência de notícias

Publicado em 26 de julho de 2024 às 06h56.

Um dia depois de fazer um discurso duro e de ser alvo de protestos no Congreso dos EUA, o premier de Israel, Benjamin Netanyahu, se encontrou com a vice-presidente e virtual candidata democrata à Presidência, Kamala Harris, em meio a pressão para que aceite um acordo de cessar-fogo em Gaza, que permitirá o retorno dos mais de 100 reféns capturados pelo grupo terrorista Hamas. Antes, Netanyahu se reuniu com Joe Biden, um líder que conhece, como fez questão de frisar, há quase 50 anos, mas com quem as relações estão estremecidas.

Netanyahu chegou ao gabinete da vice-presidente no final da tarde desta terça-feira, sem falar com a imprensa, e foi recebido de forma sucinta. Ele foi o primeiro líder estrangeiro a se encontrar com Kamala desde a saída de Biden da disputa pela reeleição, no domingo.

"Bem-vindo, sr. primeiro-ministro. Estou ansiosa pela nossa conversa. Temos muito o que conversar", disse Kamala, apertando a mão de Netanyahu. Em seguida, a imprensa foi retirada do local.

Harris tem uma posição considerada equilibrada, mas com algumas lacunas, sobre Israel e a Palestina. Ela defende a solução de dois Estados e o apoio anual fornecido pelos americanos ao país, além de pacotes adicionais, como os aprovados desde o início do conflito em Gaza. Também condenou os ataques do Hamas em 7 de outubro, e participou de um fórum que discutiu as acusações de estupro cometidas por militantes do Hamas durante os atentados, uma alegação que enfrenta questionamentos entre os críticos de Israel.

Na quarta-feira, ela criticou manifestantes que queimaram uma bandeira americana durante protestos contra a presença de Netanyahu em Washington, afirmando que a "retórica pró-Hamas é abominável, ​​e não devemos tolerá-la em nossa nação".

Por outro lado, Kamala foi uma das poucas vozes dentro do governo Biden a pressionar seus colegas — incluindo o presidente — para que externaram preocupações com a crise humanitária em Gaza, onde, segundo o Ministério da Saúde local, quase 40 mil pessoas morreram, 90 mil ficaram feridas e centenas de milhares tiveram que sair de casa. Durante os protestos que tomaram os campi de universidades ao redor dos EUA, ao mesmo tempo em que expressou repúdio a discursos antissemitas, não atacou o movimento de forma geral, como fizeram vários de seus colegas dentro do Partido Democrata.

O marido de Kamala, Doug Emhoff, que é judeu, garante que ela será uma grande defensora do Estado de Israel, e também da manutenção da ajuda americana ao país, uma análise compartilhada por vários assessores da Casa Branca. Mas Kamala também dá sinais de que poderá ao menos recalibrar essa relação.

Segundo a CNN, ela tem sinalizado que, caso seja eleita em novembro, poderá indicar Phil Gordon, ex-integrante do governo de Barack Obama, como seu conselheiro de Segurança Nacional. Em 2016, ele escreveu, em artigo no Conselho de Segurança Nacional, que “a relação dos EUA com Israel estava em perigo”, citando as mudanças estratégicas ocorridas no Oriente Médio nas últimas décadas, incluindo sobre a Palestina. Mas poucos acreditam em mudanças radicais em um eventual governo Kamala.

"Ela sempre garantirá que Israel possa se defender de ameaças, inclusive do Irã e de milícias apoiadas pelo Irã, como o Hamas e o Hezbollah", disse o vice-conselheiro de segurança nacional de Kamala, Dean Lieberman, à CNN. "Podemos criticar políticas específicas do governo de Israel e ao mesmo tempo apoiar fortemente o Estado de Israel e o povo de Israel. E esse apoio a Israel não entra em conflito de forma alguma com a visão da vice-presidente de que o povo palestino merece liberdade, dignidade e autodeterminação".

Antes da reunião com Kamala, Netanyahu se encontrou com o Biden, que na véspera explicou aos EUA os motivos para abandonar a disputa pela reeleição, um ato, segundo ele, em defesa da democracia. Antes de se reunirem a portas fechadas no Salão Oval, ambos deram rápidas declarações à imprensa, nas quais Netanyahu pontuou que ambos se conhecem há 40 anos, e que Biden conheceu “todos primeiros-ministros” de Israel desde Golda Meir (1969-1974).

"De um orgulhoso judeu sionista para um orgulhoso sionista irlandês-americano, quero agradecê-lo pelos 50 anos de serviço público, e pelos 50 anos de apoio ao Estado de Israel", disse o premier. "Estou ansioso para conversar com você hoje, e trabalhar em conjunto pelos próximos meses sobre os grandes temas diante de nós".

Pressão por acordo em Gaza

Se em público as aparências são as boas, nos bastidores o cenário é um pouco menos florido. Netanyahu se queixa das críticas vindas do governo americano — inclusive de Kamala Harris — sobre a condução da guerra em Gaza, em especial sobre a grave crise humanitária enfrentada pelos palestinos e pelo elevado número de mortos.

Apesar de garantir o apoio militar aos israelenses, algo reiterado em um bilionário pacote aprovado pelo Congresso, o governo apresenta algumas ressalvas sobre o uso das armas, como as chamadas “bombas burras”, que pesam quase uma tonelada, não têm sistema de navegação e foram usadas em grande quantidade sobre Gaza: em maio, Biden ordenou que um carregamento de 3,5 mil bombas desse tipo fosse suspenso, provocando a ira do premier israelense e aliados.

Durante o discurso de quarta-feira, Netanyahu cobrou que os EUA intensifiquem o envio de armas, mas a Casa Branca disse que nada muda por enquanto, inclusive sobre as bombas retidas.

Biden também pressiona Netanyahu para que aceite um acordo para suspender os combates em troca da libertação dos mais de 100 reféns que ainda estão em poder do Hamas. Na quarta-feira, um grupo de parentes dos capturados foi preso ao realizar um ato contra o premier no Congresso — eles não estavam entre os parentes que se reuniram com Biden e Netanyahu na Casa Branca nesta quinta-feira. Em entrevista coletivam após o encontro, o pai de uma das reféns disse que "algo poderá acontecer nos próximos dias", sugerindo novos termos colocados sobre a mesa pelos israelenses.

"Está tudo dentro da estrutura do acordo proposto em três etapas que o presidente anunciou no final de maio",  disse o pai de Sagui Dekel-Chen, Jonathan Dekel-Chen, citado pelo jornal Times of Israel. "Penso que o primeiro-ministro compreende que neste momento os olhos do mundo não estão apenas voltados para o Hamas, mas também para ele. Porque muitos lados diferentes, tanto dentro de Israel, como mas também fora de Israel, estão dizendo que as condições existem".

Para John Kirby, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, a decisão de Biden de abandonar a corrida eleitoral não deve afetar os esforços para egarantir um acordo sobre os reféns e sobre um cessar-fogo

"Não acreditamos que isso aconteça, e nas conversas que temos tido nas últimas horas, não há razão para suspeitar que a sua decisão de não concorrer à reeleição terá um impacto na nossa capacidade de conseguir o acordo", disse, em entrevista coletiva — Hoje [quinta-feira] é o 293º dia em que estes reféns estão mantidos em cativeiro pelo Hamas, e nas circunstâncias mais horríveis.

 

Acompanhe tudo sobre:Conflito árabe-israelenseIsraelEstados Unidos (EUA)Kamala HarrisJoe BidenBenjamin Netanyahu

Mais de Mundo

Biden assina projeto de extensão orçamentária para evitar paralisação do governo

Com queda de Assad na Síria, Turquia e Israel redefinem jogo de poder no Oriente Médio

MH370: o que se sabe sobre avião desaparecido há 10 anos; Malásia decidiu retomar buscas

Papa celebrará Angelus online e não da janela do Palácio Apostólico por resfriado