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Ajuda europeia: povo irlandês de orgulho ferido

População critica possível ajuda da União Européia e ressalta independência do país

O ministro das Finanças da Irlanda, Brian Lenihan, se reuniu com líderes da UE para discutir ajuda ao país (Georges Gobet/AFP)
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Da Redação

Publicado em 17 de novembro de 2010 às 16h39.

Bruxelas - "Prefiro continuar pobre a ser o lacaio de Bruxelas": o povo da Irlanda, orgulhoso de sua independência adquirida com sofrimento, considera uma "humilhação" o fato de a ilha procurar a ajuda da União Europeia para reduzir seu enorme déficit.

"Não enfrentamos os britânicos para renunciar agora à independência ante os novos mestres do Império de Bruxelas": desabafou em um pub de Dublin Sean, 54 anos, que nem precisou tomar muitas cervejas para ficar nervoso ante a menção das discussões entre dirigentes irlandeses em Bruxelas sobre um eventual plano de ajuda ao país.

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"Será a última afronta as bravas pessoas deste país: ir mendigar em Bruxelas", completou.

Seus avôs foram mortos para libertar a Irlanda do jugo britânico, lançou orgulhoso, relembrando o duro combate conduzido contra a potência colonial, das revoltas do século XVII até a independência em 1922.

"Isto será o fim da República da Irlanda independente", protestou Adam, 42 anos, entrando na conversa. "Devemos salvar o pouco de dignidade que nos resta, proteger nossa soberania a todo custo. Eu prefiro ficar pobre a ser o lacaio de Bruxelas", afirmou com veemência, provocando um clamor no bar.

"Se o país quer guardar um pouco de autoestima, precisamos tomar decisões difíceis. Senão, a Europa e o FMI (Fundo Monetário Internacional) cortarão o Seguro Social, a Previdência, a Saúde...", advertiu Dave, de trinta anos.

"Nós entramos nesta situação. É nosso problema, cabe a nós resolvê-lo", acrescentou sua namorada Niamh, 23 anos, ruiva de cabelos cacheados.


Nesta Irlanda amplamente 'eurocética', a perspectiva de creditar a salvação a Bruxelas é cada vez mais vista como uma humilhação suprema. Os irlandeses rejeitaram dois tratados europeus (Nice em 2001 e Lisboa em 2008), considerando que eles usurpavam a soberania do país. Todas as vezes, foi preciso organizar novos votos para finalmente conseguir a aprovação dos textos.

Ou seja, os irlandeses veem mal qualquer intromissão da UE em seus assuntos internos. "Se Bruxelas ficar com os cordões da bolsa, pode apostar que eles decidirão como gastar o dinheiro", ralhou Pete, interrompido em seu trajeto matinal até o trabalho.

O tema é recorrente nos fóruns de discussões, em particular no do jornal The Irish Times. Segundo uma pesquisa informal realizada pelo diário, 51% das pessoas entrevistadas se opõem a um eventual plano de ajuda da UE.

"Não precisamos abrir mão da nossa soberania a homens de terno, sem nome e não eleitos, em Bruxelas ou em outro lugar qualquer", escreveu, por exemplo, John Noel.

O descontentamento é ainda mais poderoso do que os bilhões de euros que Bruxelas poderia desbloquear para os cofres dos bancos, para os quais Dublin já enviou cerca de 50 bilhões de euros.

"O problema não é de onde vem o dinheiro, mas sim o que faremos com ele. Deveríamos ter deixado os bancos afundarem", opinou Les, um motorista de táxi de cinquenta anos.

"Isto vai revirar os estômagos das pessoas, se a Irlanda receber o dinheiro e passar imediatamente aos bancos, mais uma vez. Detestamos os bancos, sabemos que precisamos deles, mas os desprezamos", destacou Andrew.

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