37 mil venezuelanos já pediram refúgio ao Brasil em 2018
Aumento da imigração de venezuelanos fez disparar o número de pedidos de refúgio, que já chega a mais de 48 mil em 2018, um recorde no país
Filipe Serrano
Publicado em 26 de agosto de 2018 às 08h30.
Última atualização em 26 de agosto de 2018 às 09h58.
São Paulo — A entrada de imigrantes venezuelanos na fronteira com o Brasil já alcança níveis preocupantes. Apenas entre janeiro e meados de agosto, o número de pedidos de refúgio de venezuelanos no Brasil chegou a 37.607. Ao todo, 48.445 pessoas haviam solicitado reconhecimento do status de refugiado este ano até agosto, um recorde no país. Depois dos venezuelanos — que representam 77% dos pedidos de refúgio —, as nacionalidades com maior número de pedidos são Haiti, (3.755), Cuba (1.483), China (839), Bangladesh (632) e Angola (525). Os dados são do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), subordinado ao Ministério da Justiça, e foram obtidos com exclusividade por EXAME.
O número de pedidos de refúgio em 2018 já supera o total registrado em todo o ano passado, que foi de 33.866 solicitações. Em comparação com o período entre janeiro e julho do ano passado, o aumento no número de pedidos de refúgio foi de 158%. Apenas em julho, foram registrados 9 610 pedidos, um recorde mensal.
Ao contrário de outras ondas imigratórias enfrentadas pelo Brasil nos últimos anos — como a chegada de milhares de imigrantes haitianos e bolivianos —, o caso da Venezuela preocupa porque a maioria dos imigrantes chega ao país em situação de miséria, sem quaisquer recursos e com a saúde precária por causa da fome e de doenças. É uma situação que dificulta ainda mais a inserção dos imigrantes na sociedade brasileira.
"É necessário que fique claro que a característica que deixou essa situação migratória em evidência não foi o número, pois no passado o Brasil recebeu números muito mais significativos de imigrantes italianos, portugueses, japoneses, mas, sim, a situação de vulnerabilidade com que a população venezuelana tem chegado ao Brasil", diz Bernardo Laferté, coordenador-geral do Conare. "No passado recente, o Brasil recebeu mais de 80.000 haitianos. Eles entravam pelo Acre, mas tinham condições de migrar voluntariamente para as regiões com maior oferta de emprego e foram rapidamente absorvidos pelo mercado de trabalho."
Os estados de Roraima e Amazonas concentram 95% dos pedidos de refúgio de venezuelanos no país, o que explica a tensão na fronteira com a Venezuela verificada nos últimos meses. No sábado, 16 de agosto, um grupo de manifestantes na cidade de Pacaraima (RR), na fronteira com a Venezuela, atacou imigrantes venezuelanos que estavam vivendo acampados na cidade em protesto contra o roubo a um comerciante da cidade. Mais de 1.200 venezuelanos acabaram cruzando a fronteira de volta para a Venezuela para fugir dos ataques.
Para a professora Rosana Baeringer, autora do Atlas Temático do Observatório das Migrações em São Paulo — um importante trabalho sobre imigração no Brasil — a tensão social causada pela entrada de imigrantes leva a população local a culpar os refugiados pelos problemas sociais não resolvidos no país, como violência, desemprego e desigualdade social. "A sociedade brasileira não está preparada para lidar com o crescimento o fluxo de imigrantes, com a nova circulação de populações no mundo˜, diz Rosana, que é pesquisadora do Núcleo de Estudos de População da Unicamp.
POR QUE PEDIR REFÚGIO?
Ser reconhecido como refugiado é importante para garantir os direitos fundamentais de quem é obrigado a fugir de seu país, de forma que o imigrante possa reconstruir sua vida em outro lugar com a maior rapidez possível. Uma vez que a pessoa dá entrada num pedido de refúgio, ela recebe uma permissão de residência temporária no Brasil, pode tirar um CPF e solicitar uma carteira de trabalho provisória, que permite ser contratado para um emprego no país.
O Brasil reconhece como refugiado a pessoa que é obrigada a sair do seu país de origem por causa de alguma grave violação de direitos humanos ou por motivo de perseguição política, social, de raça ou religião. Os pedidos são analisados pelo Comitê Nacional para os Refugiados e costumam levar anos.
A alternativa ao pedido refúgio é solicitar uma permissão de residência no país, mas este processoexige documentos que nem sempre estão disponíveis — como certidão de nascimento ou de casamento. Por esses motivos, a maioria dos venezuelanos tem solicitado o pedido de refúgio.