Luiza Helena Trajano Rodrigues, diretora-superintendente do Magazine Luiza (Germano Luders/EXAME)
Da Redação
Publicado em 25 de novembro de 2010 às 13h38.
Rio de Janeiro - O aumento do poder de compra dos brasileiros das classes C e D nos últimos anos abriu o olho das companhias, que não podem mais deixar de se preocupar com esse consumidor se quiserem destaque no mercado brasileiro. Hoje, esse público representa 95 milhões de pessoas dispostas a comprar novos produtos e ter novas experiências. Mas se engana quem pensa que para atingir esse consumidor basta lançar produtos mais baratos. Os brasileiros das classes C e D exigem qualidade e estão dispostos a pagar por isso.
Além de disponibilizar bons itens a preços acessíveis, as empresas têm que atender em cheio as necessidades do consumidor. Para isso, executivos devem se despir de qualquer preconceito. “O desafio de desenvolver produtos para esses consumidores é enorme. Até porque a gente lida com verdades com as quais não estamos familiarizados. Então, precisamos de toda uma abordagem diferente no pensamento, na ativação da marca e no desenvolvimento do produto”, afirma Eduardo Aron, diretor de marketing da Kimberly Clark, em debate no Primeiro Congresso Nacional sobre Mercados Emergentes, realizado pelo Data Popular.
A empresa de produtos de higiene lançou no início deste ano a Fralda Mágica da Turma da Mônica, destinada ao consumidor de baixa renda. A Kimberly aproveitou o licenciamento já consolidado, embora isso represente o desafio de conquistar novos públicos sem perder o antigo. “É perigoso uma empresa que tem sucesso explorando outras classes se apoiar nessa história. No caso da Turma da Mônica, a marca poderia nos ajudar nessa empreitada, mas é uma responsabilidade muito grande de tratar essa jóia que a gente tem, porque os seus valores são muito fortes e isso nos motivou a ser cautelosos na abordagem”, afirma o executivo.
Atingindo a massa e ganhando espaço no mercado
A quantidade de consumidores que formam as classes C e D faz com que qualquer empresa que pense em volume sinta a necessidade de alcançar esse público. Hoje, para ser líder em qualquer segmento é necessário primeiro ser líder na classe C. “Se você quer ter massa crítica, tem que estar na classe C. É impensável ir para uma questão exclusivamente de nicho se você quer vender volume. E, para atingi-los, temos que estar abertos a ouvir e ter a capacidade de aprender”, afirma Hugo Bethlem, vice-presidente do Grupo Pão de Açúcar.
Pensando em atingir essa massa, a Ambev tem um quiosque da Brahma na estação de trem Central do Brasil, no Centro do Rio de Janeiro. “Começamos com a história dos quiosques de chopp focando na classe A. Mas para a nossa grande surpresa, os locais que tiveram melhor desempenho foram as praças de alimentação da classe C. Isso ajuda a marca Chope Brahma a se tornar mais democrática”, afirma João Paulo Badaró, diretor de desenvolvimento de mercado da AmBev.
Hoje, segundo a própria empresa, esse é o local onde mais se vende chopp por metro quadrado em todo o mundo. Para João Paulo, o segredo é apenas disponibilizar o produto para aqueles que já possuem dinheiro para comprá-los. “Não é só questão de renda e sim de acessibilidade, dar oportunidade para ele consumir. É você colocar um produto que antes ele não consumia na frente dele, na porta do gol”, afirma o executivo, em entrevista a Renato Meirelles, presidente do Data Popular.
Muito além de preço e promoção
Investir na Classe C também impressionou o gigante McDonald’s. O restaurante da rede que mais cresce em todo mundo é o de Itaquera, periferia de São Paulo. Mesmo assim, a rede reconhece que ainda precisa se aproximar desses novos consumidores. “A classe C come Big Mac, a gente tem que fazer com que ela perceba as outras opções. Também temos que fazer com que a classe D coma o Big Mac. Ainda temos que penetrar no ambiente da classe D, que tem outros códigos, e que está vindo para ficar”, conta Mauro Multedo, vice-presidente de marketing do McDonald´s.
Achar que para atrair a classe C preços baixos são o suficiente é um grande erro. Esses consumidores, como os de qualquer outra classe, têm a qualidade como prioridade na hora de escolher o que vai comprar. “Não há mais condição de impactar esse indivíduo apenas por ser de uma determinada classe dizendo que o produto é de qualidade, esse é o mínimo. Lá atrás, buscávamos a qualidade como diferenciação, hoje isso não faz mais sentido”, afirma Carlos Ferreirinha, presidente da MFC, consultoria especializada em luxo.
Para Multedo, do McDonald’s, para conquistar esse público uma empresa deve manter o seu posicionamento e tratar esse consumidor como sempre tratou qualquer outro. “Para atingir esse consumidor não ofereçam descontos promocionalmente. Não comecem a avaliar isso como a variável preço. Olhe para produto e para consumidor como sempre fizeram”, afirma o executivo.
Eles chegaram ao poder
O Magazine Luiza, que sempre teve foco nas classes mais baixas, garante que esse segmento nunca esteve tão movimentado e poderoso como agora. “Eles são muito simples, mas não são simplistas. Eles sabem o que querem, mas ainda não descobriram que estão mandando. Na hora que descobrirem, se prepare, pois eles vão saber muito bem como mandar”, afirma Luíza Helena Trajano, presidente do Magazine Luiza e do Instituto de Desenvolvimento do Varejo – IDV.
A executiva também confirma que o desejo dessas classes é por produtos de boa qualidade. “Em dois anos, o mercado das classes C e D consumiram mais LCD do que qualquer expectativa. O pessoal gosta de coisas boas, geladeira frost free, de duas portas e fogão de inox com cinco bocas”, completa Luíza, sobre o consumidor que antes era esquecido e hoje se tornou prioridade, desafiando executivos a aprenderem a falar a sua língua. “Temos que ir para a rua, conhecer a vida”, afirma Eduardo Aron, da Kimberly Clark.
Veja os principais destaques do Congresso promovido pelo Data Popular
Veja a entrevista com Luiza Helena Trajano
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