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Vale a pena investir na oferta de ações do BB?

Os seis gestores consultados por EXAME acham que as ações do BB têm um desconto sobre os outros bancos, mas só três preveem comprar papéis na oferta

Banco do Brasil: ação é tida como barata, mas desperta cautela nos gestores (.)

Banco do Brasil: ação é tida como barata, mas desperta cautela nos gestores (.)

DR

Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h10.

São Paulo - Começa nesta segunda-feira o período de reserva de ações da oferta pública do Banco do Brasil. A instituição planeja levantar cerca de 10 bilhões de reais com a venda de 356,8 milhões de ações ordinárias (com direito a voto), que passarão a ser negociadas na BM&FBovespa a partir da próxima semana. Todos os seis gestores de fundos de ações consultados pelo Portal EXAME acreditam que os papéis do banco são negociados com um desconto em relação aos dos outros três grandes bancos listados na bolsa paulista (Itaú Unibanco, Bradesco e Santander). Também existe uma chance relevante de que os papéis saiam com um preço ainda mais atrativo na oferta pública - principalmente se as bolsas mundiais passarem por dias de turbulência até o dia 29, quando termina o período de reserva. Apesar de o governo federal (controlador do banco) já ter divulgado a intenção de ficar com mais da metade das ações ofertadas, o número de papéis que chegará de uma vez ao mercado é muito grande, o que deve pressionar as cotações. Foi o que aconteceu no mês passado, quando o Bank of America vendeu bilhões de dólares em ações do Itaú Unibanco e derrubou a cotação dos papéis em mais de 10%.

A tese de que as ações do BB estão descontadas se sustenta independentemente de qual múltiplo seja usado para a comparação entre os grandes bancos brasileiros. O Itaú Unibanco tem um valor de mercado equivalente a mais que o dobro do BB apesar de as duas instituições terem tamanhos parecidos - o BB leva vantagem em total de ativos, mas o Itaú possui mais depósitos. No passado, o Banco do Brasil já teve uma rentabilidade bem menor do que a dos concorrentes privados. Nos últimos meses, entretanto, o retorno sobre o patrimônio líquido do BB tem sido superior ao do Bradesco e está muito próximo ao do Itaú. Já o potencial de valorização das ações do BB é superior ao do Itaú e do Santander e quase igual ao do Bradesco se levada em consideração a média dos preços justos divulgados pelos analistas de corretoras. O principal indicador usado para comparações entre bancos também sustenta o investimento nas ações do BB. O banco estatal é negociado por 1,86 vez seu patrimônio líquido, enquanto o Itaú Unibanco vale 2,71 vezes (veja tabela abaixo). "Sempre que essa diferença ultrapassa 30% eu acho que vale a pena avaliar o investimento num banco estatal", diz André Gordon, sócio-fundador da GTI Administração de Recursos.

 Itaú UnibancoBradescoBanco do BrasilSantander
Valor de mercado (bilhões de reais)143,5947077,3
Patrimônio líquido (bilhões de reais)5343,137,665,2
Valor/patrimônio2,71x2,18x1,86x1,19x
Preço-alvo da ação (consenso de mercado)R$ 46,50R$ 41,25R$ 36,90R$ 26,30
Potencial de valorização32,30%35,90%35,50%29,90%
Fonte: Bovespa/ThomsonReuters/Central do Investidor    
*Dados coletados no dia 17/06    

Além da expectativa de que a oferta de ações saia a um preço atrativo, a operação também desperta o interesse do mercado porque o setor financeiro é visto como uma das melhores apostas em renda variável para este ano. Os investidores admitem que o aumento dos juros básicos da economia brasileira deve frear os índices de expansão do crédito bancário. No entanto, boa parte dos empréstimos dos bancos brasileiros são indexados a taxas pós-fixadas - ou seja, os juros cobrados dos clientes também sobem quando a Selic aumenta. Por esse motivo, os bancos estariam melhor posicionados que empresas de consumo, varejo e construção para enfrentar um período de aperto monetário. "Os bancos são a nossa principal posição entre as ações ligadas ao mercado doméstico", diz Will Landers, responsável pelos fundos latino-americanos da BlackRock, a maior gestora de recursos do mundo. 


 

Riscos

Apesar da atratividade do setor financeiro, apenas três dos seis gestores consultados dizem que planejam comprar papéis do BB na operação. Para os demais, há opções melhores na bolsa. O desconto das ações seria plenamente justificado pelas características do BB, um banco que oferece mais risco aos investidores que o Bradesco e o Itaú Unibanco. O banco estatal é o mais alavancado entre as grandes instituições financeiras brasileiras. Isso quer dizer que o BB libera mais empréstimos com menos capital próprio. A estratégia é arriscada porque o banco torna-se o menos preparado para enfrentar momentos de crise econômica, aumento do desemprego e disparada na inadimplência. "Se o país crescer, a ação do BB tende a performar melhor que as dos demais bancos, e vice-versa", diz o gestor de um grande fundo de investimentos que pediu para não ser identificado, mas que ganhou muito dinheiro com papéis de instituições financeiras nos últimos anos.

A grande exposição do BB ao crédito agrícola também gera preocupações no mercado. Fatores como o clima ou quebras de safra mexem com a qualidade da carteira de crédito do banco, tornando seus resultados menos previsíveis. O BB também tem anunciado medidas para crescer no crédito imobiliário, um segmento considerado bastante interessante pelos bancos, mas que igualmente embute maior risco. "São empréstimos de prazo bastante longo, e não dá para prever como estará a situação financeira de alguém daqui a 15 anos", diz Luis Miguel Santacreu, analista da Austin Rating.

O que deixa o mercado mais cauteloso com as ações do BB, no entanto, é a ingerência política do governo federal. O nível de governança do banco evoluiu muito nos últimos 15 anos. "Para manter-se competitivo em relação aos bancos privados, o BB teve que adotar padrões de gestão que o tornaram a estatal federal mais bem-administrada", diz Daniella Marques, sócia da Oren Investimentos. Isso não significa, entretanto, que o banco sempre tome decisões visando o lucro e os interesses dos acionistas minoritários. Em abril de 2009, por exemplo, o presidente Lula tirou Antonio Francisco de Lima Neto do comando do banco e colocou Aldermir Bendine em seu lugar porque não concordava com os altos spreads (ganho bruto dos bancos com empréstimos).

Já no final de 2008, no auge da crise econômica que assolou a economia global, o BB aumentou a concessão de empréstimos em um momento em que todos os bancos privados colocavam o pé no freio. A recuperação da economia nos meses seguintes impediu que a deterioração da carteira de crédito do banco estatal. No entanto, ficou claro que o BB vai se expor a riscos maiores caso o governo tenha interesse em adotar medidas anticíclicas para resguardar a economia. O mercado também chama a atenção para o aumento do poder de fogo dos sindicatos no BB durante o governo Lula. "Não temos ações do BB nem vamos entrar na oferta devido à ingerência política que existe no banco", afirma Jorge Augusto Saab, analista de renda variável da Rio Bravo Investimentos. A proximidade das eleições não representa um alívio. Na opinião do mercado, tanto o tucano José Serra quanto a petista Dilma Rousseff são vistos como mais imprevisíveis que Lula e tendem a acentuar o uso político do banco.


Oportunidades

Nos últimos anos, o BB se esforçou para compensar os problemas de governança com a adoção de medidas que lhe deram uma embalagem até melhor que a dos rivais. O banco estatal é o único entre os grandes que só possui ações ordinárias e que está listado no Novo Mercado da Bovespa - o segmento mais elevado de governança corporativa da bolsa paulista. A atual oferta pública também deve aumentar o percentual de ações em circulação no mercado para cerca de 32% do total - elevando junto a liquidez. Por último, o banco já anunciou a intenção de ter suas ações negociadas na Bolsa de Nova York - hoje os ADRs do BB só podem ser comprados e vendidos nos Estados Unidos no mercado de balcão.

Mas o principal motivo para a valorização das ações do BB nos próximos meses deve ser o crescimento do crédito no Brasil. A relação entre o crédito e o PIB no país chega hoje a 45%. Em muitos países desenvolvidos, supera 100%. Por esse motivo, tanto o governo quanto economistas isentos acreditam ser possível chegar a um nível de 70% nos próximos anos. O BB tem aproveitado a alta demanda dos clientes para melhorar a qualidade de sua carteira. Recentemente o banco cresceu muito nos segmentos de crédito consignado e a pessoas físicas - considerados de menor risco. Além disso, o BB tem duas fontes bem baratas de recursos para emprestar: os depósitos judiciais e as contas correntes de funcionários públicos.

O aumento da bancarização da população brasileira com a continuidade do crescimento da renda também favorece o BB. Junto com Bradesco e Caixa Econômica Federal, o banco estatal possui uma rede de agências espalhada até mesmo em regiões remotas do território nacional. E o banco estatal aposta nos cartões para captar mais clientes. Em abril, BB e Bradesco anunciaram a criação da primeira bandeira inteiramente nacional de cartões de crédito, débito e vale-refeição, a Elo. A intenção é atingir as classes de menor renda e aumentar a bancarização da classe C. Outra área em reestruturação que deve crescer muito nos próximos anos é a de seguros. Apesar de sua enorme rede de agências, o BB nunca teve uma presença nessa área comparável à do Bradesco e Itaú. Por meio de parcerias com empresas especializadas, o banco estatal planeja deter uma participação relevante de mercado em todos os segmentos de seguro de massa.

Com a redução do potencial de consolidação do setor financeiro brasileiro devido ao enorme número de aquisições dos últimos anos, o BB também começa a voltar seus olhos para o exterior. Em abril, o banco comprou 51% do argentino Patagônia por 840 milhões de dólares. A administração do BB diz estar agora em busca de uma aquisição nos Estados Unidos que lhe permita atender melhor os cerca de 1,5 milhão de brasileiros que vivem em território americano. Para Antonio Bento de Mendonça Neto, vice-presidente da consultoria Solving Efeso, no entanto, a internacionalização de uma organização deveria levar mais em conta as sinergias com o mercado de origem e a situação econômica do país-alvo. "O BB deveria priorizar Colômbia, o Chile e o México em sua internacionalização", afirma.


 

O BB também tem oportunidades para capturar nos próximos meses sinergias a partir de acordos já anunciados. Considerado no mercado um banco com despesas maiores que as dos rivais, o BB ainda pode cortar custos duplicados a partir da aquisição da Nossa Caixa. Outro acordo que deve reduzir custos foi fechado com o Bradesco e o Santander para o compartilhamento de caixas eletrônicos - pacto semelhante já havia sido fechado com a Caixa Econômica Federal. Os dois bancos públicos também anunciaram no mês passado uma fusão operacional da estrutura de TI, com a criação de um único data center para centralizar as soluções de tecnologia e informática. Para o mercado, o mais racional seria que o BB e a CEF se tornassem um único banco por meio de uma fusão. Entre os gestores consultados, entretanto, nenhum considera alta a probabilidade que isso aconteça nos próximos anos devido a interesses políticos.

Conclusão

De forma geral, os gestores de fundos de investimento acreditam que é recomendável investir no setor bancário brasileiro neste momento para lucrar com a expansão do crédito quando ela se materializar. O setor financeiro costuma apresentar uma rentabilidade superior à da indústria no mundo todo - e isso é ainda mais real no Brasil. É verdade que os bancos já não são tão rentáveis quanto na década de 90, quando o Itaú chegava a apresentar retornos anuais equivalentes a 35% do patrimônio líquido. Mas a rentabilidade dos bancos brasileiros não deixa nada a dever à média internacional. Pelo contrário, os retornos médios dos grandes bancos se mantêm entre 20% e 25% do patrimônio líquido, uns dos maiores do mundo.

Cronograma da oferta de ações do BB 
21/junInício do prazo para reserva dos papéis para o varejo
23/junFim do prazo para os atuais acionistas exercerem o direito de preferência na compra das ações
29/junFim do prazo de reserva para o varejo
30/junfixação do preço por ação
02/julInício da negociação das ações na BM&Fbovespa
06/julData da liquidação financeira da operação
Fonte: Banco do Brasil 

 

De certa forma, a alta lucratividade do setor financeiro sempre compensou a baixa penetração do crédito bancário no Brasil. O governo costuma fazer declarações contra os spreads bancários - mas não toma medidas reais para baixá-los. Os impostos sobre o setor financeiro são e devem continuar altos. A oferta de dinheiro melhorou, mas ainda é escassa. E a consolidação do setor bancário não foi positiva. "Não há motivos para esperar a queda da rentabilidade dos bancos em um país com baixo nível de poupança, concorrência reduzida e enorme demanda por crédito", diz Flavio Sznajder, sócio-fundador da Bogari Capital. Esse cenário mantém a expectativa de que os bancos brasileiros continuem a oferecer aos investidores retornos altos com risco baixo. Dentro do universo bancário, o Itaú Unibanco é o preferido do mercado, apesar de já estar caro. O conglomerado controlado por Roberto Setubal negocia com múltiplos semelhantes ao dos melhores bancos internacionais. Se o Brasil continuar a dar certo, as ações do BB aparecem como uma ótima opção de diversificação.

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