Minhas Finanças

Os falsos romances que se tornam pesadelos financeiros

Britânica perde economias da vida inteira em golpe virtual que já fez milhares de vítimas ao redor do mundo

Ao conhecer alguém pela internet, todo cuidado é pouco: verifique suas referências (Dreamstime.com)

Ao conhecer alguém pela internet, todo cuidado é pouco: verifique suas referências (Dreamstime.com)

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Da Redação

Publicado em 15 de fevereiro de 2012 às 13h28.

São Paulo – Uma história cinematográfica veio à tona nesta terça-feira na Inglaterra. Enquanto o mundo comemorava o dia de São Valentim – o equivalente ao nosso Dia dos Namorados – o tabloide Daily Mail publicava uma reportagem sobre uma mulher de 59 anos que foi enganada por um falso namorado que conhecera pela internet, e acabou por entregar ao estelionatário suas economias da vida inteira.

Vicky Fowkes conheceu em um site de relacionamentos um suposto engenheiro civil que dizia se chamar John Hawkins. O homem dizia ser sul-africano e viver na Inglaterra, mas estaria na Nigéria a trabalho. A certa altura, Hawkins disse que retornaria à Inglaterra e que poderia encontrar Vicky. Porém, teria sido impedido de sair da Nigéria por dever impostos. O falsário pediu, então, ajuda à vítima, que entregou de bandeja 40.000 libras, o equivalente a pouco mais de 100.000 reais.

Esse tipo de golpe é bastante comum no Reino Unido. De acordo com a reportagem do Daily Mail, um estudo da Universidade de Leicester constatou que cerca de 200.000 pessoas já foram enganadas em namoros virtuais. Os valores entregues a título de ajuda ao falso namorado ou namorada variaram de 50 a mais de 275.000 libras.

Mas não é só em terras britânicas que ocorre o golpe do namoro pela internet. Esquemas como o que vitimou Vicky são aplicados em todo mundo, e a história do sujeito que está em terras estrangeiras e precisa de ajuda financeira é largamente aplicada. O Brasil mesmo já teve a sua Vicky Fowkes, que, no entanto, entregou uma quantia bem menor ao bandido.

Em 2009, uma mulher de Belo Horizonte conheceu pela internet um brasileiro que dizia morar nos Estados Unidos. Ele pediu dinheiro para comprar sua passagem ao Brasil e, depois, para custear despesas médicas. No fim das contas, a vítima depositou-lhe 2.900 reais. Quando constatou a fraude, foi à delegacia registrar a ocorrência. “A moça nem desconfiou do fato de a conta do sujeito ser de São Paulo”, diz Bruno Tasca Cabral, delegado que cuidou do caso à época.

Histórias convincentes

Ao se deparar com uma história desse tipo, a reação de muita gente pode ser de incredulidade frente à aparente ingenuidade das vítimas. Mas é bom atentar para o fato de que muitos dos estelionatários que aplicam esse tipo de golpe muitas vezes sofisticam suas histórias pessoais para ganhar a confiança da vítima, que frequentemente está passando por um momento de fragilidade emocional. Os relatos são tão ricos em detalhes que poderiam virar roteiros de cinema.

No caso britânico, fraudador e vítima conversaram durante alguns meses antes que ele pedisse dinheiro pela primeira vez. Os dois se falavam inclusive por telefone, possibilitando a Vicky identificar um sotaque sul-africano que ela achou “encantador”. “Nós conversávamos sobre tudo que existia sob o sol – famílias, relacionamentos, hobbies, interesses, animais de estimação, nosso passado. Eu confiava nele completamente”, disse a britânica ao Daily Mail.


Segundo ela, Hawkins pintou um cenário rico em detalhes de como seria sua vida na Inglaterra. Enviou-lhe fotos convincentes – aparentava ter cinquenta e poucos anos – e tinha resposta para todos os questionamentos de Vicky. Por que ele precisava do dinheiro dela para pagar o débito com o governo nigeriano? Por que tinha sido roubado, estava sem seus cartões e, portanto, sem acesso a suas contas britânicas. Por que não pedia ajuda à família? Porque não queria alarmar sua mãe. “Para tudo que eu perguntava – como por que a embaixada não poderia ajudar – ele sempre tinha uma resposta”, disse Vicky ao jornal.

No Brasil, a mentira do fraudador de 2009 também era rica em detalhes. Após conversar pela internet durante certo tempo, a vítima se apaixonou pelo falsário, que marcou sua ida ao Brasil para vê-la. No entanto, alegando estar desempregado, o homem pediu dinheiro a vítima para a passagem, e forneceu-lhe dados de uma conta bancária em São Paulo. Na véspera da suposta viagem, ele disse que não poderia embarcar, pois havia sofrido um acidente de carro.

Para dar veracidade à história, o estelionatário buscou fotos de acidentes de carro na internet e forjou imagens de si mesmo ferido, que foram enviadas à moça pelo correio. “Ele deitou numa cama, se enfaixou todo, maquiou-se para parecer ter um olho roxo e pôs um canudinho para parecer que estava tomando soro”, descreveu o delegado. A vítima, então, enviou-lhe mais dinheiro para as despesas médicas, numa quantia que totalizou 2.900 reais.

“Você jamais deve considerar que está conversando com a pessoa. Até que você tenha referências suficientes para checar seu background, não é uma pessoa, são letras e números”, diz Alexandre Atheniense, advogado especializado em Direito da Tecnologia da Informação que atua em Minas Gerais.

Outros casos

Em ambos os casos, as vítimas só perceberam o esquema quando já era tarde demais, e foram à polícia fazer o registro. No caso brasileiro, o bandido foi identificado e o processo agora corre na Justiça de São Paulo, de onde o fraudador cometeu o crime. Porém, em fóruns e comunidades da internet não faltam comentários de pessoas que dizem já ter sofrido tentativas de golpes semelhantes em sites de relacionamento.

Quase sempre o fraudador diz estar baseado em um país estrangeiro e precisar de ajuda financeira por algum motivo mirabolante. Um golpe muito comum, inclusive no Brasil, é o das supostas russas que tentam extorquir homens que conhecem em sites de namoro. São estelionatários que usam e-mails e nomes falsos - Anastasiya, Angelica, Anna Strokova, Elenka Vasilyeva, entre outros -, enviam fotos de lindas mulheres russas para fisgar suas vítimas e pedem dinheiro para as mais variadas despesas.


A Nigéria é um país constantemente mencionado em casos de embustes amorosos, assim como outros países africanos, como Gana e Serra Leoa. Muitos dos golpistas são de fato nigerianos e de outras partes da África, mas também há fraudadores em países como Inglaterra e Canadá.

Não é de hoje que a Nigéria é mencionada em mensagens de golpistas. Mesmo antes de a internet se popularizar, já existia o golpe da “carta da Nigéria” – que hoje vem por e-mail – com uma oferta de emprego na África ou gordas recompensas em dinheiro para quem depositar, para o remetente, uma determinada quantia. Quem se dispõe a conversar com o golpista vai se deparar com histórias incríveis e ricas em detalhes.

Dicas

Fazer amizades e começar namoros pela internet já é uma realidade. Mas antes de confiar na pessoa com quem você se corresponde, é preciso checar suas referências virtuais e reais. “Qualquer golpista evita dar referências presenciais sobre si. Ele vai tentar conduzir toda a sua interlocução pelo meio eletrônico”, diz Alexandre Atheniense.

O primeiro passo é checar o nome da pessoa nas redes sociais e nos mecanismos de busca. A falta de informações é um primeiro sinal de suspeita. Busque também seu e-mail nos mecanismos de busca para verificar se aquela conta já não foi usada em golpes anteriores. Existem centenas de sites e fóruns online em que os internautas alertam sobre golpistas reincidentes.

“Mas não se contente com as referências virtuais, cheque também referências presenciais”, alerta o advogado. Verifique se a pessoa realmente trabalha onde diz trabalhar. E se, depois de um tempo de relacionamento, ela não fornecer um endereço físico, não embarque. É claro que existem golpistas que chegam a se relacionar presencialmente com as vítimas para, depois, roubá-las. Mas a prevenção virtual já evita boa parte dos embustes.

Existem ainda outros elementos que evidenciam os golpes logo de cara. “São comuns erros de português nesses e-mails. Se houver, logo no primeiro contato, uma oferta mirabolante mediante depósito em dinheiro, mesmo que o remetente seja conhecido, é golpe na certa. Ninguém faz uma abordagem assim tão direta, por melhor que seja a proposta”, diz Atheniense.

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