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Parada e com excesso de peso, Netshoes despenca 42%

Varejista online apresentou resultado trimestral sem crescimento e com custos em alta, numa enxurrada de números ruins que colocam em dúvida sua estratégia

Netshoes: grande problema da companhia é não conseguir convencer seus investidores de que tem um plano de crescimento sustentado (Marina Demartini/Site Exame)

Netshoes: grande problema da companhia é não conseguir convencer seus investidores de que tem um plano de crescimento sustentado (Marina Demartini/Site Exame)

LA

Lucas Amorim

Publicado em 15 de maio de 2018 às 17h15.

Última atualização em 12 de junho de 2018 às 15h41.

Há balanços ruins e balanços péssimos. A varejista online Netshoes, listada na bolsa de Nova York, apresentou nesta segunda-feira resultados trimestrais abaixo do previsto e, nesta terça-feira, seus papeis derreteram: queda de 42% até as 17h.

O grande problema da companhia é não conseguir convencer seus investidores de que tem um plano de crescimento sustentado. O número de usuários registrados até cresceu 21% no ano, de 19.011 para 23.068 no primeiro trimestre — desses, 6.760 são considerados ativos, 19,8% a mais do que no ano anterior. O problema é que a empresa cresce muito menos do que deveria, e gasta cada vez mais para conquistar novos clientes. Ou seja: é exatamente o contrário do que deveria estar fazendo.

As vendas líquidas da companhia fecharam o primeiro trimestre em 399 milhões de reais, apenas 0,8% acima do mesmo período do ano passado. No Brasil as vendas avançaram 1,4%, mas no mercado internacional, responsável por 10%, caiu 4,4%. A margem bruta caiu de 32,8% para 30,2%.

Segundo o presidente da companhia, Marcio Kumruian, afirmou no balanço financeiro, a estratégia para 2018 é buscar um crescimento mais moderado, priorizando lucratividade no curto praz enquanto ainda vê um ambiente de consumo ainda fraco por questões macroeconômicas. O problema é que o balanço — e o resultado na bolsa nas últimas horas — colocaram em dúvida a própria sustentabilidade do negócio.

“Eles falaram em crescimento mais moderado, mas simplesmente não estão crescendo. E continuam gastando tanto quanto antes. Como isso é possível?”, diz um executivo do setor. Ele faz referência ao custo das vendas, que subiu de 266 milhões de reais no início do ano passado para 278 milhões de reais no primeiro trimestre deste ano. As despesas operacionais cresceram ainda mais, 18,5% — de 126 milhões para 149 milhões de reais. Resultado: o Ebitda (lucro antes de impostos e amortizações) caiu de 3,1 para menos 31 milhões de reais. O prejuízo cresceu, de 37,7 milhões para 60,3 milhões de reais.

Perder mais dinheiro até seria aceitável para conquistar terreno, mas definitivamente não é o caso da Netshoes segundo os dados deste balanço.

Um ano difícil

A terça-feira negra marca um ano terrível para a Netshoes desde que abriu capital na bolsa de Nova York, em abril do ano passado. Depois de muito ensaio, com vários adiamentos, os primos Marcio Kumruian e Hagop Chabab, decidiram, junto com os fundos que são sócios da companhia, que o momento havia chegado e que era hora de pensar grande.

Em um ano, as ações da Netshoes caíram quase 80%, uma das maiores baixas da bolsa de Nova York. No mesmo período, o índice S&P 500 valorizou quase 15% e o Nasdaq 100 Technology, indicador que reúne papéis de empresas de tecnologia, subiu cerca de 25%. Com isso, o valor de mercado da empresa, que faturou 1,9 bilhão de reais no ano passado, foi para cerca de 100 milhões de dólares.

A queda se deve, em parte, a problemas na maneira como a abertura do capital foi estruturada, segundo executivos do mercado financeiro e profissionais da própria companhia. De acordo com eles, a oferta foi pequena para os padrões americanos. O plano inicial da Netshoes era captar cerca de 250 milhões de dólares. Na cabeça dos fundadores e dos fundos que são sócios da empresa — entre eles os americanos Tiger Global e Riverwood Capital e o GIC, de Singapura —, a Netshoes valia 1  bilhão de dólares.

O problema dessa estrutura muito concentrada é que qualquer pressão de venda derruba os preços dos papeis, como se vê nesta terça-feira. Em entrevista a EXAME em abril, Kumruian afirmou estar satisfeito com a estrutura de capital, e que estava tudo “dentro do previsto”, com a execução do plano traçado em 2016 para ser entregue em 2021.

Mas o balanço divulgado ontem mostrou que a empresa continua tendo dificuldade num ponto nevrálgico para seu negócio: negociar bons preços com seus fornecedores e acertar na escolha dos produtos ofertados aos clientes. A companhia é focada em roupas e calçados esportivos, um setor que deveria viver um bom momento em virtude da Copa do Mundo e temperaturas altas no início do ano. Mas vem pecando justamente nisso: o estoque é considerado duas vezes maior que o necessário, segundo concorrentes.

A companhia cita o cenário macroeconômico como um desafio, mas os grandes varejistas de moda listados em bolsa tiveram um trimestre melhor que o da própria Netshoes, mesmo com faturamento muito maior.

A Lojas Marisa teve, no primeiro trimestre deste ano, o melhor resultado entre as varejistas brasileiras de vestuário: um aumento de 63,5% no Ebitda em relação ao mesmo período de 2016, para 101,6 milhões de reais. A Lojas Renner registrou um aumento de 31% nos ganhos nesse mesmo intervalo, para 249,5 milhões de reais, enquanto a Riachuelo teve alta de 10,1%, para 177,3 milhões de reais; a Hering teve elevação de 7,2%, para 45,3 milhões de reais. “O cenário está de fato mais desafiador, mas está longe de explicar os resultados da Netshoes”, diz um executivo.

A EXAME, Kumruian afirmou em abril que não estava “numa corrida de 100 metros, mas numa maratona”. O problema é que o balanço desta segunda-feira mostrou que a companhia parou para o almoço, ganhando peso em vez de correr em direção à linha de chegada.

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