Margaret Thatcher is back? Reino Unido corta impostos para relançar economia
A nova primeira ministra britânica, Liz Truss, decretou um corte dos impostos no Reino Unido na tentativa de dar um choque para uma economia na beira da recessão
Carlo Cauti
Publicado em 23 de setembro de 2022 às 11h13.
Ela tinha prometido. Ela sabia que poderia "ser uma medida impopular". Mas ela cumpriu a promessa, pois cortar impostos "é a coisa certa para a economia britânica".
A nova primeira ministra britânica, Liz Truss, decretou nesta sexta-feira, 23, um corte dos impostos no Reino Unido. Uma media que fez lembrar para muitos observadores o estilo de governo da primeira mulher a liderar um governo britânico, Margaret Thatcher, que na década de 1980 realizou repetidos cortes de impostos, conseguindo reanimar a então periclitante economia local. Ganhando o sobrenome de "Dama de Ferro".
Segundo o plano anunciado por Truss - que por sinal diz abertamente se inspirar a "Dama de Ferro" - a alíquota de imposto de renda mais elevada, de 45% para quem ganha mais de 150 mil libras por ano, será substituída por uma menor, de 40%, sobre a renda superior a 60 mil libras por ano.
Mas também os cidadãos mais pobres vão pagar menos impostos. Os contribuintes britânicos que ganham entre 20 mil e 60 mil libras por ano terão uma redução da alíquota, que passará de 20% para 19%.
O corte do imposto de renda faz parte de um pacote de redução fiscal que o governo Truss está implementando, que inclui, entre outras coisas, isenção de impostos para as compras feitas por turistas e eliminação no "imposto do selo", obrigatório para documentos legais, como a transferência de propriedade e bens.
Além disso, o ministro da Economia de Londres (que por lá é chamado de "Chanceler do Tesouro), Kwasi Kwarteng, anunciou que em breve serão tomadas medidas microeconômicas liberais, como o fim ao limite dos bônus dos banqueiros, introduzidos no Reino Unido após a crise dos subprimes, de 2008-2009.
Essa medida é considerada anacrônica pelo governo Truss, pois limitaria o crescimento do país, definido pela própria primeira-ministra como "anêmico nas últimas duas décadas".
“A economia britânica só vai prosperar se o setor financeiro prosperar”, repetiu hoje o Chanceler do Tesouro na Câmara dos Comuns, “queremos investir e pagar impostos aqui. Não em Paris, nem em Frankfurt, nem em Nova York!”.
Custo da reforma fiscal vai ser financiado com maior dívida pública
O custo do pacote de redução fiscal vai ser de 45 bilhões de libras em cortes de impostos, a maioria desse montante financiado aumentando a dívida pública. Um ponto que gerou fortes críticas, somado ao fato que chega em um momento de inflação elevada, com a alta dos preços que alcançou o recorde dos últimos 40 anos: 9,9%.
Todavia, tentar dar um "choque" na economia para botá-la de novo nos trilhos do crescimento é algo urgente em um país como o Reino Unido, que já está praticamente em recessão. De acordo com os dados do Banco da Inglaterra, o Produto Interno Bruto (PIB) britânico vai cair 0,1% esse ano. Mesmo assim, o banco central de Londres está sendo forçado a elevar as taxas de juros no maior nível desde 2008, em 2,25%, para tentar conter a inflação. Sem contar a progressiva desvalorização da libra, que caiu para a mínima dos últimos 38 anos, cotada em 1,11 contra o dólar.
A maioria parlamentar do Partido Conservador comemorou essas medidas, definidas como "Trussnomics", com frases como “os conservadores finalmente voltaram! Redução de impostos e crescimento!".
Os economistas estão divididos sobre a oportunidade dessa reforma fiscal. Com os mais críticos que apontam como essa situação poderia desencadear um novo ataque especulativo contra a libra, nos mesmos moldes do que ocorreu em 1992, e que forçou o Reino Unido a sair do Sistema Monetário Europeu.
Isso pois esse corte de impostos chega logo após o congelamento por dois anos das contas de energia dos cidadãos do Reino Unido, até um máximo de 3 mil libras por ano. Este plano custará aos cofres públicos até 150 bilhões de libras, mas é indispensável para responder à grave emergência energética que será inevitável neste inverno europeu. Um custo muito maior até do mega-plano de 75 bilhões de libras que foi realizado em 2020, na fase mais aguda da pandemia de Coronavírus para tentar suportar a economia britânica.
Aposta arriscada do governo Truss
Em suma, a Truss está apostando tudo em uma dívida pública colossal que vai se acumular nos próximos anos, cuja consequências - e sustentabilidade - ainda são pouco claras.
Uma aposta bastante arriscada, mas poderia valer a pena a nível político. Após os anos de incerteza do governo Boris Jonshon, Liz Truss voltou ao caminho da pureza ideológica neo-thatcheriana, e dessa forma poderia reagrupar o eleitorado conservador tradicional. Se ele realmente conseguir reanimar a economia britânica, em dois anos poderá apresentar aos eleitores um resultado capaz de garantir mais uma vitória sobre o Partido Trabalhistas. Ou seja, Margaret Thatcher is back, e poderia derrotar os rivais de esquerda.
Sem contar que esse pacote fiscal não se aplica automaticamente a outras nações que compõem o Reino Unido, como a Escócia. E por lá, a líder do governo escocês, Nicholas Sturgeon, poderia se encontrar em apuros em sua própria casa caso também não realize o mesmo corte de impostos dos "primos" ingleses.