Figueiredo: "O risco é algo que conseguimos medir e embutir nos preços dos ativos. A incerteza, não. Por isso, o mercado perdeu o norte"
Da Redação
Publicado em 29 de maio de 2018 às 14h35.
Última atualização em 29 de maio de 2018 às 18h31.
Ainda é difícil mensurar o impacto da greve dos caminhoneiros para a economia brasileira, mas os protestos já contribuíram para deteriorar ainda mais as expectativas em relação ao país. Para Luiz Fernando Figueiredo, sócio da gestora Mauá Capital e ex-diretor do Banco Central, a incerteza sobre o futuro do país ficou mais evidente, e isso se refletiu no comportamento caótico do mercado financeiro nos últimos dias. Em poucos mais de dez dias, o Ibovespa caiu 13%. Apenas ontem, desvalorizou 4,5%. Hoje, opera em alta. O dólar sobe pelo quarto dia seguido.
As perspectivas para o país pioraram?
Sim. Um dos motivos é que a incerteza eleitoral está ficando mais evidente. A eleição está completamente em aberto. Não está claro se os candidatos que lideram as pesquisas de intenção de voto querem e, caso queiram, se conseguirão resolver a questão fiscal. Isso está se refletindo no preço dos ativos, como o dólar e as ações. O risco é algo que conseguimos medir e embutir nos preços dos ativos. A incerteza, não. Por isso, o mercado perdeu o norte. É possível que haja exageros: os investidores costumam passar do ponto em situações assim, mas não sei se é o que está acontecendo agora. Na Mauá, não vemos esse como um bom momento para voltar a comprar ações. Essa é uma situação que pode prejudicar a economia.
Pode prejudicar a economia de que maneira?
Um aumento nas expectativas de juros, por exemplo, tem um efeito contracionista, que pode reduzir o crescimento do PIB. O desempenho da bolsa é um indicador antecedente, que sinaliza uma disposição menor de investir no país. Além disso, o cenário externo está mais complicado. O aumento dos juros nos Estados Unidos reduz o fluxo de recursos para países emergentes, o que explica boa parte da desvalorização do real. Também estamos vendo mais conflitos lá fora. A disputa comercial entre China e Estados Unidos e, mais recentemente, a dúvida sobre se a Itália pode deixar a zona do euro geram instabilidade.
Quais podem ser os impactos da greve dos caminhoneiros para a economia?
O crescimento deve ficar abaixo de 2% neste ano, mas é cedo para fazer uma estimativa mais precisa porque ainda não sabemos quando a situação voltará ao normal. A economia ficou praticamente paralisada nos últimos dias. Percebe-se isso no cotidiano: as pessoas estão cancelando viagens, tentando se locomover menos. De forma mais ampla, a indústria diminuiu ou parou suas atividades. Parece que o movimento está arrefecendo. A dúvida é se protestos assim vieram para ficar.
E vieram para ficar? Há novas greves e protestos planejados pelo país.
Nesse ponto, sou mais otimista. Acho que, depois de tantos dias de greve, com consequências terríveis, como a morte de animais e o desperdício de comida, a maioria das pessoas se convenceu de que houve abusos e tende a ser contra outros movimentos do gênero.
O governo deveria ter agido de outra maneira? Afinal, a conta para encerrar a greve é alta.
Mas qual seria a alternativa? O governo tinha de escolher entre economizar 10 bilhões de reais e deixar as pessoas sofrendo ou gastar os recursos e aliviar o sofrimento. Prefiro a segunda opção.