Super Quarta: entenda o que o mercado espera das decisões de juros nos EUA e Brasil (Eric Baradat/AFP/Bloomberg via/Getty Images)
Repórter de finanças
Publicado em 30 de julho de 2024 às 19h55.
Última atualização em 30 de julho de 2024 às 20h11.
Os comitês de políticas monetárias do Brasil e dos Estados Unidos iniciaram, nesta terça-feira, 30, o primeiro dia do encontro para decidir o rumo dos juros de ambos os países. Nesta quarta-feira, 31, conhecida como Super Quarta, serão anunciadas as novas taxas básicas de juros da economia brasileira e americana.
A expectativa do mercado é que o Banco Central (BC) do Brasil mantenha os juros em 10,50%, da mesma forma que o Federal Reserve (Fed, banco central americano) decida pela manutenção na faixa entre 5,25% e 5,50%. Ao observar a curva futura de juros, 86% do mercado precificam uma manutenção dos juros no Brasil na reunião de amanhã, frente a 14% que precificam uma alta. Para os EUA, a plataforma do FedWatch mostra que 95,9% apostam na manutenção dos juros americanos.
Apesar do consenso do mercado apontar para ambas as manutenções, investidores estão de olho nos sinais sobre as reuniões de setembro - e aqui, Brasil e EUA se distanciam. Se por um lado a curva de juros americana precifica um corte em setembro, a curva do Brasil já aponta para um aumento dos juros por aqui até o final de 2024.
Lucas Farina, analista econômico da Genial Investimentos, ainda acrescenta que a decisão da manutenção da Selic deverá ser unânime entre os diretores do BC. Já José Maria Silva, coordenador de alocação e inteligência da Avenue explica que, nos EUA, a decisão também deve ser unânime, porém com mais discussões.
“O que é interessante ver posteriormente é se a reunião de amanhã foi mais ‘viva’, com mais discussão do que aquilo que era esperado anteriormente. Ou seja, a manutenção da taxa terá sido consensual, mas poderá ter havido mais discussão. Dos 19 membros, certamente haverá alguns dissidentes que falarão sobre cortar os juros”, diz Silva.
Apesar dos dados de inflação (CPI e PCE) terem apresentado uma melhora significativa no segundo trimestre em relação ao primeiro trimestre deste ano, a primeira leitura do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre de 2024 veio acima do esperado. De acordo com o Departamento de Análises Econômicas, a atividade cresceu a um ritmo anualizado de 2,8% na comparação trimestral, ante expectativa de 2%.
Especialistas explicam que o Fed teme se antecipar no corte de juros e causar um efeito inflacionário. Por conta disso, Jerome Powell deve citar, novamente, que precisa de dados mais confiáveis de que a inflação está convergindo para a meta de 2% de forma sustentável. Silva destaca que esse será o ponto-chave de amanhã, com investidores tentando justamente medir, dentro das falas do presidente do Fed, qual é esse grau de confiança.
Álvaro Frasson, estrategista Macro do BTG Pactual (mesmo grupo controlador da EXAME) Portfolio Solutions, também concorda que o Fed não dará sinais tão claros, mas cita que o discurso deverá ter um tom mais 'dovish' (tendência a redução de juros). O especialista também pontua que não vê o PIB como um fator tão negativo. “O Fed tem olhado mais para o crescimento do PIB doméstico, que acelerou também, por isso houve um freio no otimismo, mas veio abaixo do crescimento do PIB total. Então acho que isso pode ajudar, de alguma maneira, para uma leitura um pouco mais positiva.”
Silva também explica que o PIB mais elevado ajudou a remover ruídos de que a economia americana e o mercado de trabalho (também foco do mandato do Fed) estavam desacelerando. “Acredito que isso irá colaborar na difusão dessa tensão de recessão que podia existir durante a reunião de amanhã. Sendo assim, todos estarão de acordo em esperar mais dados, mas devem discutir sobre espaço para cortar na próxima reunião.”
Do lado do Brasil, riscos consideráveis de que a inflação possa ultrapassar o limite superior do intervalo da meta, de 4,5%, é o que deve sustentar a decisão do Copom, explica Farina. E segundo o especialista, o que pesa nesse aumento das expectativas inflacionárias é a taxa de câmbio, cuja desvalorização foi forte e concentrada em um curto período de tempo, o que pode ameaçar o cumprimento da meta de inflação já ao final desse ano.
“Na nossa visão, esse é o principal motivo por trás da necessidade do Banco Central manter em aberto a possibilidade de elevar a taxa Selic ainda em 2024. A taxa de câmbio se tornou a principal preocupação do Banco Central.”
Por conta disso, Frasson explica que para além da manutenção dos juros amanhã, o BC enfrenta um desafio sobre a precificação da alta de juros na curva futura. “Se o BC não entregar essas altas de juros que estão precificadas na curva, isso poderá resultar em uma depreciação do real. Se o real depreciar, a expectativa de inflação piora ainda mais. Então o BC deveria em teoria subir juros? Talvez, sim.”
Entretanto, segundo o especialista do BTG, tão importante quanto o nível da taxa é a implementação dessa elevação. Para ele, não entregar os juros que a curva precifica, é ruim, mas entregar uma elevação com dissenso, seria pior.
Sendo assim, para o ciclo de alta gerar uma apreciação no câmbio e controlar a expectativa de inflação, é preciso ser feito de forma unânime. “A política monetária interfere na precificação do câmbio. O movimento do câmbio, por sua vez, impacta na expectativa de inflação. Por isso que a decisão do Copom tem que estar muito bem comunicada e muito atenta ao que a curva tem precificado.”
Visando esse futuro, Frasson comenta que, nesta Super Quarta, o BC deve fazer uma comunicação com poucos ajustes e endurecendo o tom, mas sem indicar explicitamente que o balanço de riscos está assimétrico. “No final do dia, o Banco Central deve fazer uma comunicação que dê a ele próprio mais tempo para ver se o câmbio irá ficar nesse patamar até lá. Isso daria mais chances para o BC não ter que elevar os juros em setembro.”
Em relatório, o Santander também afirma que espera comentários mais ‘hawkish’ (favorável a juros mais altos) do Copom, assim como também não espera uma direção específica em relação às próximas reuniões, nem uma mudança na avaliação simétrica dos riscos de inflação.
Entretanto, o banco destaca que apesar de um agravamento significativo dos riscos, com o dólar chegando a cotação de R$ 5,70 no começo de julho, o tom mais ‘dovish’ do Fed pode gerar algum alívio na polícia monetária do Brasil. Outro fator citado como positivo, segundo o Santander, é o esforço fiscal do governo com o congelamento do orçamento, que também pode ajudar na apreciação do real e, consequentemente, na decisão do Copom.