Jefferson Laatus, sócio-fundador do Grupo Laatus e especialista em câmbio (Exame/Exame)
Guilherme Guilherme
Publicado em 7 de maio de 2021 às 16h13.
Última atualização em 7 de maio de 2021 às 22h38.
Com queda acumulada de 8,5% desde o início de abril, o dólar tocou nesta sexta-feira, 7, sua menor mínima em quase quatro meses, chegando a ser vendido a 5,205 reais. Para Jefferson Laatus, estrategista-chefe e sócio-proprietário do Grupo Laatus, a moeda americana ainda tem espaço para cair, mas dificilmente ficará abaixo de 5 reais.
“É uma mudança de patamar muito brusca. Estamos falando de dólar a 5 reais e dólar a 4 reais. Mesmo que seja 4,99, já é 4 reais. Tem esse patamar psicológico, que é uma defesa muito forte [da moeda]”, disse em entrevista à EXAME Invest.
Para quebrar essa barreira, segundo Laatus, seria necessário um evento extraordinário na economia local, como a aprovação da reforma tributária. “Se aprovarem só um pedaço da reforma já passa uma sinalização muito boa [para o mercado] de que a questão fiscal está sendo cuidada.”
Sem a reforma, Laatus acredita que a retomada da economia brasileira e a esperada elevação da taxa Selic para 5% até o fim do ano devem ser suficientes para derrubar a moeda para próximo de 5 reais -- mas não além disso.
Desde quarta-feira, 5, quando o Comitê de Política Monetária (Copom) elevou a taxa de juros em 0,75 ponto percentual para 3,5% ao ano e comunicou que planeja uma nova alta na próxima reunião, o dólar caiu cerca de 3,75%.
“A sinalização acaba sendo positiva para a volta do carry trade, que envolve captar dinheiro mais barato no exterior e colocar aqui, onde os juros estão começando a ficar mais atraentes”, comenta Laatus.
Confira a entrevista:
O que explica essa forte queda do dólar desde o início de abril?
Internamente, o Banco Central subir juros e sinalizar que dará continuidade ao movimento acaba sendo positivo para a atração de fluxo estrangeiro. Volta-se a fazer operações de carry trade no país, que envolve captar dinheiro mais barato no exterior e colocar aqui, onde o dólar ainda vale muito e os juros estão começando a ficar mais atraentes.
Lá fora, começaram a ventilar cada vez mais o novo pacote trilionário de infraestrutura dos Estados Unidos, o que é mais injeção de capital nas economias. Por isso, o dólar começou a desacelerar no mundo. Quanto mais dinheiro injetado na economia, não importa como, mais desvaloriza o dólar.
Na sexta, o dólar caiu novamente, com os dados do payroll [relatório de empregos não-agrícolas do Estados Unidos] vindo abaixo do esperado. Isso pressiona o Federal Reserve a continuar injetando dinheiro e a manter o juro baixo por muito mais tempo, beneficiando a bolsa e derrubando o dólar.
O dólar deve continuar caindo contra o real ?
Acredito nessa continuidade. A economia americana está voltando a crescer e a chinesa está de vento em popa. E quando as economias de grandes parceiros comerciais crescem, a brasileira cresce junto, independentemente de como está o cenário interno.
Do outro lado, o Banco Central continua sinalizando alta de juro para fechar o ano com a taxa Selic em cerca de 5%, o que é bem positivo e deve continuar levando o dólar para mais próximo de 5 reais.
O dólar pode cair abaixo de 5 reais?
Eu não acredito ainda em um cenário de dólar abaixo de 5 reais. Tem que acontecer uma série de coisas boas, mas cada vez vai estar mais próximo de 5 reais.
A marca dos 5 reais acaba sendo uma espécie de resistência psicológica?
Muita. É uma mudança de patamar muito brusca. Estamos falando de dólar a 5 reais e dólar a 4 reais. Mesmo que seja 4,99, já é 4 reais. Então tem esse patamar psicológico, que é uma defesa muito forte. E para perder precisaria de uma motivação muito boa.
Do quê, por exemplo?
A aprovação, mesmo que de um pedaço, da reforma tributária. Isso passa uma mensagem muito boa [para o mercado] de que a questão fiscal está sendo muito boa. Soma-se a isso o crescimento do país, aí sim podemos ter um dólar abaixo de 5 reais.
A possível aprovação do plano de infraestrutura do presidente Joe Biden deve derrubar ainda mais o dólar ou pode ter o efeito contrário, com o aumento dos temores sobre inflação?
Acaba sendo positivo, porque investimento em infraestrutura é a melhor forma de fazer a economia crescer. E o Brasil tem componentes que pode fornecer para os Estados Unidos, como aço, o que pode ser bom [para a economia do país].
Sobre a inflação, quanto maior for neste ano, mais o mercado vai gostar, justamente pela sinalização do Copom de continuar subindo a taxa de juros para começar 2022 com ela em desaceleração. E quanto mais a taxa de juros subir, mais o estrangeiro vem para investir aqui, aproveitando que o dinheiro lá fora ainda está barato.
Com a perspectiva de desvalorização da moeda americana até o fim do ano, faz sentido ficar vendido em dólar?
Sempre falo “nunca aposte contra o dólar”. Acho que estar vendido no dólar é complicado porque o dólar tem um reflexo muito amplo. Aqui pode estar tudo bem, mas se alguma coisa acontece no exterior, o dólar pode ficar pressionado de forma agressiva para cima, ainda que pontualmente.
Apostar contra o dólar é um negócio complicado. Mas tem outras formas de aproveitar a movimentação negativa sem estar exposto diretamente à moeda.
Quais são as formas?
Há ativos que se beneficiam com a queda do dólar, como empresas importadoras. As de turismo também são um exemplo. Esse mercado vai aquecer muito no segundo semestre. Com o dólar barato e a retomada do turismo, essas empresas, como CVC (CVCB3), vão bombar.