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Disparada do dólar pode levar a reversão em intervenções do BC

A alta pode elevar os preços de importados e pressionar a inflação, que já está no maior nível em seis anos, caso o BC não venda a moeda americana para sustentar o real

O BC não compra dólares no mercado à vista desde 13 de setembro, interrompendo uma prática diária desde maio de 2009 (Getty Images)

O BC não compra dólares no mercado à vista desde 13 de setembro, interrompendo uma prática diária desde maio de 2009 (Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 22 de setembro de 2011 às 08h56.

Nova York e São Paulo - A maior alta do dólar para um período de cinco dias desde 2008 está alimentando especulações de que o Banco Central poderá vender a moeda americana para sustentar o real. Seria uma reversão na estratégia de 28 meses para conter a valorização cambial.

O dólar acumula uma alta de cerca de 9 por cento contra o real desde 14 de setembro, a maior desde o ganho de aproximadamente 11 por cento nos cinco dias até 3 de dezembro de 2008, que foi causado pela crise financeira mundial, segundo dados compilados pela Bloomberg. A valorização do dólar levou investidores em títulos denominados em reais a uma perda de 13,5 por cento em dólares este mês, o pior desempenho entre os papéis de mercados emergentes, de acordo com números compilados pelo JPMorgan Chase & Co.

Crescem as especulações de que a alta do dólar pode se acelerar, o que elevaria os preços de importados e pressionaria a inflação, que já está no maior nível em seis anos, caso o BC não use parte dos US$ 352 bilhões em reservas internacionais para defender a moeda brasileira. O receio de que o BC tenha desistido de tentar frear a inflação ajuda na desvalorização do real, ao mesmo tempo em que a crise de dívida da Europa afeta a demanda por ativos de mercados emergentes.

“O BC deveria começar a vender dólar no mercado à vista”, disse Newton Rosa, economista-chefe da Sul América Investimentos DTVM SA. “Com o câmbio assim, isso vai alimentar ainda mais a alta da inflação”.

O ciclo atual de queda do real reverte a disparada de 46 por cento da moeda brasileira desde o fim de 2008. Essa alta levou o governo a comprar dólares, a elevar impostos para investidores de renda fixa e a impor restrições em operações financeiras para tentar conter a valorização e proteger exportadores do País.

Corte de juros

O BC não compra dólares no mercado à vista desde 13 de setembro, interrompendo uma prática diária desde maio de 2009. A instituição comprou US$ 47,6 bilhões nos primeiros oito meses do ano, superando os US$ 41,4 bilhões em todo o ano passado. A última vez que o BC vendeu dólares foi em 3 de fevereiro de 2009, quando a moeda americana fechou a R$ 2,3052. Ontem o dólar encerrou a R$ 1,8756.

O BC não quis fazer comentários sobre o assunto, segundo comunicado de sua assessoria de imprensa, enviado por e-mail.

Em 31 de agosto, o Brasil se uniu à Turquia como únicos países do G-20 a reduzir o juro básico nos últimos dois meses para estimular a economia. Sob comando do presidente do BC, Alexandre Tombini, o Comitê de Política Monetária cortou a Selic em meio ponto percentual, para 12 por cento, citando uma “deterioração substancial” da economia mundial. O Copom havia elevado a taxa nas cinco reuniões anteriores.

O dólar acelerou a alta ontem depois que o Federal Reserve disse que vai trocar a maior parte da dívida de curto prazo em sua carteira por títulos do Tesouro Americano com prazo mais longo para reduzir custos de captação e evitar a economia volte a entrar em recessão.


‘À prova de bala’

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo acumulou alta de 7,23 por cento nos 12 meses até agosto, superando o teto de 6,5 por cento da meta de inflação do País pelo quinto mês consecutivo. O centro da meta é de 4,5 por cento, com tolerância de dois pontos percentuais.

“Eu achava que a situação do Brasil era à prova de bala, mas parece que muitas falhas têm aparecido na armadura nos últimos seis a nove meses por causa das autoridades”, disse Win Thin, chefe mundial para estratégia cambial de mercados emergentes no Brown Brother Harriman & Co. em Nova York, em entrevista por telefone. “Não tenho como pensar que isso está a caminho de terminar bem.”

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem a jornalistas em Washington que a queda do real tem sido gradual e só uma “grande desvalorização” seria preocupante. No ano passado, Mantega acusou os EUÄ, Japão e Europa de criarem uma “Guerra cambial” ao manterem suas taxas de juros próximas a zero.

A presidente Dilma Rousseff fez um apelo ontem a líderes mundiais para que imponham controles à guerra cambial, antes do anúncio do plano do Fed.

Swaps

O BC decidiu ontem que não faria um leilão de swap cambial reverso para rolar contratos que vencem em outubro, o que vai desmontar US$ 2 bilhões em contratos que apostavam contra o dólar. Foi a primeira vez desde janeiro que a instituição decidiu não rolar os contratos.

A volatilidade do real para um período de um mês, que mede a flutuação da moeda, chegou a 17,7 por cento ontem, o maior nível desde 2010 e o dobro do patamar de julho.

O real perdeu 24 por cento nos três meses até dezembro de 2008, depois que o colapso do Lehman Brothers Holdings Inc. travou o mercado mundial de crédito e as apostas de empresas brasileiras na moeda desapareceram. O dólar chegou a R$ 2,6202 em 5 de dezembro de 2008, a máxima de três anos.

Resultados da Petrobras

“Nestes níveis, não estou certo de que o governo está seriamente preocupado com isso”, disse Roberto Melzi, estrategista para mercados locais no Barclays Plc em Nova York, em entrevista por telefone.

Almir Barbassa, diretor financeiro da Petróleo Brasileiro SA, disse em entrevista ontem no Rio de Janeiro que a alta do dólar pode levar a uma queda do lucro deste trimestre devido ao custo do serviço da dívida da estatal em moeda estrangeira. A Petrobras deve contabilizar uma perda financeira, depois do ganho de R$ 2,9 bilhões no segundo trimestre, caso o dólar se mantenha acima de R$ 1,70, disse Barbassa.

O dólar acima de R$ 1,70 levaria a um acréscimo de 0,5 ponto percentual na inflação nos próximos 12 meses, disse Zeina Latif, economista da RBS Securities em São Paulo. A inflação deve ficar em 5,71 por cento nos próximos 12 meses e em 5,5 por cento em 2012, segundo a previsão da última pesquisa Focus do BC com cerca de 100 economistas.

“Para uma inflação com toda a cara de que vai superar o centro da meta em 2012, isso seria uma péssima notícia”, disse Zeina. “Meu receio é que este impacto possa ser maior à medida em que a inércia inflacionária aumenta. Isto não é uma situação confortável”.

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