Algoritmos salvam bolsas de derrocada e soam alarme
Investidores passam a buscar ação com qualquer sinal de automação, particularmente gigantes de tecnologia
Guilherme Guilherme
Publicado em 10 de maio de 2020 às 11h04.
Última atualização em 10 de maio de 2020 às 11h05.
Ari Rubenstein sabe que é uma opinião que muitos não querem ouvir. Que duas décadas de expansão dos computadores nas bolsas de valores, avanços que deixaram milhares de pessoas desempregadas e operadores de alta frequência como ele no controle, foram responsáveis por manter os mercados funcionando durante a pandemia de coronavírus.
O cofundador e CEO da formadora de mercado eletrônica GTS, cuja carreira começou em pregões de commodities no World Trade Center, fica sem resposta quando perguntado o que teria acontecido se ainda fosse necessário levar um exército de operadores para Lower Manhattan em março e abril.
“Isso criaria grande incerteza e exacerbaria tremendamente o problema”, diz Rubenstein, cuja empresa às vezes compra e vende um bilhão de ações por dia. “Se alguma vez houve dúvida de que tecnologia e inovação são o futuro de Wall Street, estamos vendo esse futuro agora.”
Ultimamente, de Wall Street e de todo resto ao que parece. Logo após serem salvas pelas máquinas, as bolsas se tornaram destino da debandada de investidores por qualquer ação com sinal de automação, particularmente gigantes de tecnologia. Embora tenha sido a salvação dos otimistas, diante da alta de 27% do S&P 500 em relação à mínimas de março, é uma escalada que desperta preocupação entre pessoas preocupadas com os trabalhadores e a desigualdade nos Estados Unidos.
O tema alimenta diariamente comentários otimistas de empresas de pesquisa. O peso crescente do setor de tecnologia significa que “o desempenho notável do S&P 500 faz sentido”, escreveu a DataTrek Research na terça-feira. O Goldman Sachs repetiu a observação frequentemente ouvida de que Facebook, Apple, Amazon, Microsoft e Google compõem 20% do índice, o nível mais alto para quaisquer cinco componentes em mais de 30 anos.
Mas a pandemia também facilitou a crítica dos que veem o mercado como um lugar que incentiva e valoriza empresas cuja característica distintiva é a remoção de seres humanos do processo.
“Existe uma relação simbiótica entre o mercado e o que as empresas estão fazendo”, disse Christian Weller, pesquisador sênior do Center for American Progress e professor de políticas públicas da Universidade de Massachusetts, em Boston. “Tanto o lucro quanto o comportamento das empresas são ‘antitrabalhador’ e aumentam os preços das ações.”
Embora pareça um ponto de vista extremo, mostra como a questão pode ser polêmica. Atualmente, a lista de vencedores do Russell 1000 é pontilhada com nomes sistemáticos. Amazon.com, cujas ações dispararam, pode ser uma grande empregadora, mas deslocou mais postos de trabalho do que contratou. A ação da MarketAxess Holdings, uma operadora de títulos automatizada, acumula alta de 38% desde o pico de fevereiro, enquanto o salto da formadora de mercado eletrônica Virtu Financial foi de 41%. Até a Netflix, que supera o S&P 500 em cerca de 40 pontos percentuais neste ano, pode ser vista como um tipo de “líder” na categoria quando se trata de canais de TV e cinemas.