Marcio Aguiar, diretor da divisão Enterprise da Nvidia para América Latina (Nvidia/Divulgação)
Repórter
Publicado em 23 de fevereiro de 2024 às 13h29.
Última atualização em 26 de fevereiro de 2024 às 14h27.
Não há dúvidas de que a Nvidia, antes assunto somente entre os fanáticos por tecnologia, agora é a conversa nos elevadores de todos os grandes centros financeiros. A empresa de Jensen Huang, que começou no início dá decada de 90 desenvolvendo processadores gráficos para jogos, hoje alcançou US$ 2 trilhões em valor de mercado e é a quarta companhia mais valiosa do mundo, atrás de Microsoft, Apple e Saudi Aramco.
O balanço da companhia, divulgado na quarta-feira, 21, só reforçou o sucesso da gigante. No quarto trimestre de 2023, a Nvidia apresentou um lucro líquido de US$ 12,28 bilhões, um aumento de mais de 779% em relação ao mesmo período do ano anterior. Sua receita trimestral alcançou US$ 22,1 bilhões, mais que triplicando em comparação ao ano anterior.
Hoje a fabricante de chips domina atualmente mais de 70% das vendas globais de chips de inteligência artificial (IA), um mercado que deve atingir US$ 140 bilhões até 2027, segundo a consultoria Gartner. A Nvidia se encontra em primeiro lugar em uma corrida que ainda está aceitando inscrições, e gigantes como Google, Amazon e até Intel estão apostando neste mercado.
"Trabalhamos num mercado de colaboração e competição, isso é fato. E temos um ecossistema de grandes corporações que atuam conosco, como provedores de cloud como a Amazon, Microsoft, Apple e Google. Quando eles falam “ofereço técnicas de IA”, sim, é verdade. São softwares deles e nossos, e um hardware 100% Nvidia", disse Marcio Aguiar, diretor da divisão Enterprise da Nvidia para América Latina. Em entrevista à EXAME, o executivo brasileiro detalhou o que define o sucesso da empresa americana, os setores que mais se destacam no Brasil e as expectativas para o próximo ano.
Quais os fatores que contribuíram para o sucesso no último balanço?
Somos muito conhecidos no mercado de games, que foi como a empresa surgiu. Mas ao longo de 2010, a Nvidia vem se recriando, lançando novos processadores gráficos e criando infraestrutura de softwares para entrar nos 16 mercados em que hoje atuamos.
Agora, o grande ‘boom’ que todos estamos vendo vem em virtude desta demanda para atender às técnicas de inteligência artificial. Alguns anos atrás, todo mundo sabia que existia inteligência artificial, mas ninguém conseguia botar em prática porque faltava conhecimento em relação a infraestrutura de hardware que é onde todos esses dados são processados.
Começamos essa jornada entre 2015 e 2016, quando anunciamos novos conceitos em termos de infraestrutura de hardware para atender essa demanda que até então ninguém sabia o que que era. Então o que nós estamos vendo hoje é resultado de algo plantado desde 2010.
Então a antecipação e o preparo são os ingredientes da receita de sucesso da Nvidia?
Com certeza. Nós vamos estar sempre posicionados como pioneiros, tudo que fazemos não existe no mercado. Isso vem desde a concepção da empresa. Nosso CEO [Jensen Huang] é alguém super visionário, que sempre fala: o que precisamos fazer para liderar nesse mercado? Todo setor que estamos hoje, na época era de “0 bilhões de dólares”, como ele sempre fala.
Quando entrei na companhia em 2010, 100% da nossa receita era proveniente do mercado de games. No último balanço, temos quase US$ 2.9 bilhões deste setor, enquanto o de data center foi de US$ 18.4 bilhões, um crescimento de 400% ano após ano. Nós sabíamos que a demanda ia vir, nos preparamos para tal e estamos agora tendo essa oportunidade de continuar levando conhecimento para várias empresas.
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A relação entre EUA e China ainda tem algum impacto significativo na produção global de semicondutores?
A tensão vai sempre existir. É que nem a vida adulta: quanto maiores formos, mais expostos estamos. Somos uma empresa americana e entendemos muito bem as restrições impostas pelo governo dos EUA, mas não vamos parar de inovar.
Hoje temos um ecossistema muito grande que depende das nossas inovações. Nossa postura é de uma grande startup: uma empresa que trabalha com tecnologia e não tem medo de inovar, que está lá para aprender com o ecossistema. Com isso, ganhamos credibilidade com os clientes, porque não estamos lá para vender GPU. Estamos lá para falar: como te ajudo? Como melhorar seu trabalho?
E hoje, qual a avaliação que a Nvidia faz da competição emergente? A Intel, por exemplo, anunciou ontem que vai passar a fabricar chips para IA.
A competição sempre existiu para a Nvidia. Quando começamos, existiam 20 empresas de semicondutores. Hoje só temos uma, que é a MD. A Intel sempre esteve nesse mercado, e recentemente temos os exemplos da Amazon, Google e Apple. Mas enquanto eles focam em funções específicas, nós desenvolvemos uma tecnologia mais genérica para os nossos mais de 50.000 clientes em todo o mundo.
Cerca de oito meses atrás, Jensen Huang chegou a falar: não vejo problema nenhum [com a chegada do Intel Foundry]. Inclusive podemos até pensar em um casamento entre as empresas, como usar a fábrica deles para produzir nossos chips. Hoje nossa produção é junto com a TSMC, um dos maiores fabricantes atualmente.
Trabalhamos num mercado de colaboração e competição, isso é fato. E temos um ecossistema de grandes corporações que atuam conosco: empresas de consultoria, provedores de cloud como a Amazon, Microsoft, Google e Apple. Quando eles falam “ofereço técnicas de IA”, sim, é verdade. São softwares deles e nossos, e um hardware 100% Nvidia.
Qual é hoje a relação da Nvidia com o Brasil?
O Brasil é o principal país para a Nvidia na América Latina. Hoje, o mercado de educação e pesquisa é o segundo maior aqui do País porque ele recebe muita verba dos mercados de energia, oriundos das empresas de óleo e gás. Como elas têm que investir em inovação e pesquisa, nós temos um ecossistema de universidades federais que possuem bastante infraestrutura de hardware da Nvidia.
Trabalhamos muito com a Petrobras, que está entre os top 10 clientes do mundo. A empresa faz bastante investimento em grandes supercomputadores para atender a área de exploração e produção, e é disparado o cliente brasileiro que mais investe em tecnologia da Nvidia.
Mas hoje, no Brasil, estamos focados em quatro mercados: energia (óleo e gás), educação e pesquisa, telecomunicações e finanças. Além disso, temos 38 startups no País que trabalham com IA generativa e, com o tempo, com a necessidade do cliente final, elas estarão mais incorporadas dentro dessas instituições privadas.
Quais as expectativas para o próximo trimestre?
Fechamos o último trimestre com US$ 22.1 bilhões de dólares a nível global e já orientamos o mercado que o Q1 deve ficar nos US$ 24 bilhões. Ao longo do próximo ano, temos tudo bem planejado e vamos ter um crescimento constante porque agora as empresas entenderam o que é inteligência artificial e como podem aplicá-la nos seus negócios. Também trazemos eles um pouco à realidade, porque nem todas as companhias precisam adotar um conceito tão avançado e cuja infraestrutura não é barata para uma empresa de início.
Existem várias empresas oferecendo tecnologias similares às nossas, e por isso nós já estamos um pouco mais à frente. Sabemos que não temos como parar agora, e isso nos impulsiona muito. A Nvidia viu que com a IA generativa, tudo é possível.