Solidão e preconceito: pesquisa aponta percepções de mulheres negras em cargos na liderança
Pesquisa da 99jobs.com, em parceria com o Pacto Global da ONU no Brasil, traz dados sobre a realidade das mulheres negras em cargos de liderança nas empresas
Repórter de ESG
Publicado em 25 de julho de 2023 às 10h01.
Última atualização em 25 de julho de 2023 às 17h52.
Segundo pesquisa, 95% das mulheres negras afirmam que ainda existe preconceito de outras pessoas em colocá-las em posições de liderança no mercado de trabalho. Além disso, 60% das entrevistadas afirmam que nas empresas em que trabalham não existem outras mulheres negras na liderança, é o que diz o estudo Mulheres Negras na Liderança 2023, realizado pela 99jobs.com, em parceria com o Pacto Global da ONU no Brasil. Outro dado é que, em 2023, 60% das mulheres disseram que se sentem solitárias em posições de liderança. No ano passado, esse número era de 54%.
“O objetivo da pesquisa é apontar cada vez mais caminhos e engajar mais líderes para que mulheres negras avancem. E que não seja uma ação de Julho, quando no dia 25 se comemora o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha. Mas, que seja uma ação permanente até que a reparação social tenha sido feita”, disse Priscila Salgado, diretora de diversidade e inclusão da 99jobs.com.
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Se é sabido que existem desigualdades estruturais entre homens e mulheres, os abismos podem ser bem maiores quando são consideradas as mulheres negras. Dito isso, a pesquisa traz dados sobre as desigualdades de gênero e, ainda, com o recorte de raça.
O levantamento, por sua vez, ouviu 257 mulheres, dentre as respondentes, 69% afirmaram ter entre 26 a 40 anos, 58% são de São Paulo, 54% tem pós-graduação ou MBA, 30% são coordenadoras e 29%, gerentes - enquanto 14% são do setor de varejo ou comércio.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as pessoas negras representam 56,1% da população brasileira. Ou seja, a população é minorizada socialmente em termos de representação, mas não é minoria quando são considerados os dados populacionais. E, a situação se agrava em cargos de liderança – sem fazer distinção de gênero. Segundo pesquisa com o perfil social, racial e de gênero do Instituto Ethos, as pessoas negras ocupam apenas 4,7% dos cargos de liderança nas 500 maiores empresas do país.
De acordo com Salgado, o sonho é não precisar mais de pesquisas como essa. Mas, para ela, a importância do estudo está além do mapeamento e levantamento de dados. E sim, em levantar questionamentos importantes como “Porque mulheres pretas ainda são poucas nos espaços de poder? Quais os caminhos para começarmos a resolver essa questão?. “Queremos avançar e mudar não só os números apontados em pesquisa, mas alavancar carreiras de mulheres pretas”, afirma.
Mulheres negras em cargos de liderança
Segundo o estudo da 99jobs.com, a maior parte das mulheres negras ouvidas pela pesquisa (75%) assumiram a liderança nas empresas na faixa etária de 26 a 40 anos – enquanto apenas 17% assumiram a liderança com menos de 25 anos. Pensando na porcentagem de mulheres negras nas lideranças das empresas, 55% das entrevistadas afirmaram que nem 5% das lideranças corporativas são formadas por mulheres negras.
Muito desse contexto, se dá pela proeminência desigual entre homens e mulheres nas empresas. Ainda de acordo com o estudo, 70% das entrevistadas afirmaram que o presidente da empresa é um homem – além disso 67% disseram que o líder do setor ou presidente é um homem.
Ou seja, esses dados expõem como a realidade das mulheres líderes – e principalmente, líderes negras – trazem alguns desafios. Pensando nisso, 49% das mulheres ouvidas disseram que abriram mão de algum sonho ou valor para se tornar líder – número 4% maior do que o contingente de 2022.
Para Salgado, a solidão da mulher preta tem muitas camadas. “No mercado de trabalho é o perigo das histórias únicas, a falta de projeto de inserção e de um olhar que derrube barreiras raciais para que essa mulher alcance em novos espaços de poder. O racismo é estrutural e como estrutura mantém longe dos espaços de lideranças as mulheres negras. É necessário vencer o racismo institucional e estrutural que coloca como possibilidade o corpo de uma mulher negra apenas em cargos de subserviência”, disse.
Comportamentos, inspirações e dificuldades
De acordo com a pesquisa, 71% das mulheres ouvidas afirmaram terem que mudar seus comportamentos, como falar mais alto, ser mais incisiva ou arrogante para ter credibilidade ou ser aceita no mercado. Mas há uma grande busca por propósito por parte dessas líderes, 79% afirmaram que as mulheres responsáveis pela criação de líderes se tornaram inspirações para a sua trajetória.
Pensando em dificuldades, segundo as profissionais ouvidas, em primeiro lugar (56%) está o racismo estrutural, seguido do machismo institucional (46%) e do acesso a experiências (35%). Para elas, os fatores que ajudaram ao alcance de um cargo de liderança foram: o tempo de experiência no mercado (50%), qualificação acadêmica (46%) e mentoras ou mentores (33%).
O papel de ações afirmativas
Ainda segundo o estudo, 71% das empresas têm no máximo 10% de mulheres negras nas suas lideranças. Então, ações afirmativas para mudar esse cenário se mostram de grande importância. Além disso, 49% das mulheres negras que são líderes afirmam se sentir mais à vontade quando os chefes diretos eram mulheres. Mas, apesar das dificuldades, 95% das mulheres acreditam que ser uma mulher negra na liderança abre portas como forma de incentivo para outras mulheres negras;
Salgado afirma que o papel das empresas é simples. “Tire uma fotografia da sua liderança. Se nesta fotografia não tiver nenhuma mulher negra. Faça uma mulher negra ser a próxima a sentar na cadeira de liderança, e mais, faça com que as mulheres negras estejam representadas em todos os espaços. Olhe para a composição do seu time e boa vontade para fazer acontecer. Esses são passos importantes para as empresas”, afirmou.