Estádio Couto Pereira, em Curitiba: clube irá readequar estruturas para obter certificação resíduo zero (Leonardo Stabile / Wikimedia Commons/Wikimedia Commons)
Rodrigo Caetano
Publicado em 29 de agosto de 2022 às 16h23.
Última atualização em 29 de agosto de 2022 às 16h59.
O Coritiba Football Club, time que disputa a primeira divisão do Campeonato Brasileiro de Futebol, acaba de se filiar ao Pacto Global da ONU Brasil, organização das Nações Unidas que congrega o setor privado. É o primeiro clube brasileiro a aderir à iniciativa. Com isso, a agremiação se compromete a alinhar suas operações a dez princípios universais, distribuídos pelas áreas de Direitos Humanos, Trabalho, Meio Ambiente e Corrupção.
“Este é um dos passos para consolidarmos nosso programa de sustentabilidade que prevê minimizar os impactos ambientais, educar nossos colaboradores e torcedores, além de incentivar programas de preservação”, afirmou, em nota, o presidente do Coritiba, Juarez Moraes. “Um clube de futebol é mais que uma equipe em campo, os torcedores são inspirados pelo seu clube, é o amor do torcedor, uma relação inexplicável. E o futebol, pela força que tem, precisa estar diretamente envolvido e engajado.”
A primeira grande iniciativa alinhada à adesão ao Pacto se deu na área de tratamento de resíduos. O time contratou a consultoria da GreenPlat, que desenvolve softwares de monitoramento de indicadores socioambientais, para mapear a produção e o descarte de resíduos nas estruturas físicas do clube. O objetivo é adequar o Estádio Couto Pereira e o centro de treinamento do time para obter certificação de aterro zero.
Este ano, o Coritiba também pretende formalizar a adesão ao Sports For Climate Action, inciativa da ONU que busca usar o esporte como plataforma de conscientização climática. Há poucos clubes de futebol entre os signatários, mas um deles é de peso: o Arsenal, um dos mais tradicionais clubes da Inglaterra. E tem outro brasileiro, o pequeno Clube Atlético Tubarão, que atualmente joga a segunda divisão do futebol catarinense.
A pauta ambiental é uma novidade para o mundo do futebol, mas está presente. A Premier League, primeira divisão da Inglaterra e liga mais rica do mundo, está na vanguarda do movimento. Ela também é signatária do Sports For Climate Action e vem realizando ações para reduzir o impacto ambiental do campeonato, em especial no consumo de energia e no uso de plástico. No ano passado, os britânicos promoveram a primeira partida da elite do futebol carbono zero, entre Tottenham e Chelsea.
O crescimento da pauta ambiental no futebol inglês já produziu seus primeiros rankings. Desde 2019, a Sports Positive Leagues coleta dados e informações sobre compromissos ambientais dos clubes e elabora uma lista dos mais aderentes à pauta. No ano passado, o Liverpool ficou em primeiro, seguido de Tottenham e Manchester City. No ano passado, a organização iniciou a coleta da Bundesliga, da Alemanha, e, este ano, da francesa Ligue 1.
Entre os temas socioambientais e de governança (ESG, na sigla em inglês), no entanto, o racismo é o que tem mais incomodado os clubes. Um relatório do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, entidade que monitora casos de racismo no esporte, divulgado na semana passada, mostra um crescimento constante de incidentes discriminatórios contra atletas brasileiros. No ano passado, foram 158, sendo 137 no Brasil e 21 no exterior. A grande maioria envolve discriminação racial, mas há números relevantes de casos de LGBTfobia, machismo e xenofobia.
Um dos poucos treinadores negros na elite do futebol nacional, Roger Machado, atualmente no Grêmio, afirmou recentemente, em entrevista ao site Globo Esporte, que a falta de dirigentes e técnicos negros num esporte em que os negros são maioria não se deve apenas a questões sociais. Talvez o campo seja o espaço mais democrático de todos. No campo, a gente tem 50% de brancos e 50% de negros. Só que quando o campo acaba para ambos, nessa estrutura social do futebol, a gente olha para o topo da pirâmide e vê que os filtros começam a aparecer”, disse Machado. “Até agora, não se discutiu e não se resolveu nada. Atribui-se muitas vezes o desequilíbrio social, a desigualdade entre brancos e negros no Brasil, a uma questão econômica. Silenciar, para mim, é confirmar. Não é resolver”.
No artigo 243-G, o Código Brasileiro de Justiça Desportiva pune quem "praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência", com suspensão de cinco a dez partidas em caso de jogadores e treinadores. Não há nada específico em caso de racismo praticado por torcedores, o que é mais comum nos estádios.
O presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ednaldo Rodrigues, propôs, então, uma saída para reduzir os episódios de violência: a perda de pontos no campeonato. “Acredito que, somente com pena desportiva diretamente ao clube, o racismo e o preconceito deixarão o futebol”, afirmou Rodrigues, durante seminário sobre o tema na CBF. “Sou democrático e quero que essa pena seja discutida no tribunal. Vou propor para que o time perca ao menos um ponto na competição”. Não há sinalização de que os clubes irão aceitar esse regulamento. Mas o futebol precisa entender que o compromisso ambiental é, acima de tudo, um compromisso com as pessoas.