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Alan Detmeister, economista do UBS: impacto das mudanças climáticas na inflação deverá ser de 20 a 30 pontos base por ano, o que é relevante, porém manejável (Rodrigo Caetano/Exame)
Editor ESG
Publicado em 29 de janeiro de 2024 às 17h56.
Última atualização em 29 de janeiro de 2024 às 23h04.
O economista sênior do banco de investimentos UBS, Alan Detmeister, tem um pequeno problema com discursos. “Tendo a não parar de falar”, confessa, diante de um pequeno grupo de jornalistas, ao ser instado a fazer uma breve apresentação sobre o cenário econômico global, com ênfase na eterna pergunta “quando o FED irá baixar os juros” – ele acredita que em algum momento entre março e abril, por sinal. Entrevistas tendem a render mais quando o entrevistado fala pelos cotovelos, então, a confissão de Detmeister foi bem recebida.
Suas respostas foram, de fato, abrangentes, exceto quando perguntado sobre os países emergentes, sobre os quais não é especialista, e eleições americanas, sob a justificativa de nunca mais ser autorizado a conversar com jornalistas -- abordou ambos os assuntos, no entanto, de forma mais genérica. O que Detmeister ofereceu de mais relevante foi um cenário amplo sobre a inflação americana, a perspectiva de recessão nos Estados Unidos, e a relação entre bancos centrais e riscos sistêmicos globais, como as mudanças climáticas e as guerras.
A respeito das mudanças climáticas – tema que mais interessa ao EXAME ESG – ele foi taxativo: todo banco central precisa considerar esse tipo de risco em seus cálculos inflacionários. A questão é que essa é uma questão, de certa forma, pacificada. “O impacto deverá ser de 20 a 30 pontos base por ano, o que é relevante, porém manejável”, disse o economista. “O quanto esse impacto será levado em conta, depende de cada cenário interno.”
O recente processo inflacionário nos EUA, que deve terminar nos próximos meses, está relacionado a uma mudança na dinâmica econômica, com uma guinada em direção a bens de consumo, e um afastamento do setor de serviços. Isso criou um problema de demanda, mas não em função de um aumento da demanda em si, mas da mudança de foco do consumidor. Soma-se a esse processo aumentos de custo de energia, dos alimentos e logísticos. A estimativa inflação para março é de 2,4%, ante 2,9% em janeiro. A queda se deve a ajustes feitos em infraestrutura, que começaram há mais de um ano e, agora, dão resultado.
A pergunta é se as variáveis que levaram ao cenário inflacionário seguem presentes, afinal, as mudanças climáticas já se apresentam como um problema para o setor de alimentos e conflitos na Ásia criam gargalos em importantes rotas marítimas, como o Canal de Suez. “Esses gargalos estão atrasando as entregas em 7 a 9 dias, bem menos do que na pandemia, quando o atraso chegou a dois meses”, explica o economista. Em relação ao clima, vale a lógica do curto versus longo prazo: o impacto existe, é relevante, mas será gradual e, por isso, não muda as previsões para o início deste ano.
Outro aspecto econômico importante são os investimentos em energia renovável. No final do ano passado, houve um acordo entre mais de 100 países, durante a COP28, a conferência do clima da ONU, de triplicar a capacidade instalada de geração de energia limpa. A previsão da Agência Internacional de Energia é de que, nos próximos 5 anos, serão adicionados mais gigawatts do que nos últimos 20. Os investimentos são trilionários, e o pagamento da conta pode impactar no custo da energia. Mas, de novo, não neste ano. “Eu diria que em uma década”, afirma Detmeister.
Ao que tudo indica, e pelo menos por enquanto, há boa dose de previsibilidade no ar, apesar do aumento da preocupação com as guerras e as consequências do aquecimento global. Até a eleição americana, fonte usual de instabilidade e, até o momento, amplamente indefinida, oferece aos investidores cenários conhecidos, já que tanto Donald Trump, provável candidato republicano, quanto o democrata Joe Biden, atual presidente, estiveram no cargo por quatro anos.
Estabilidade, não é o que o mercado mais deseja? “Bom, existem fundos que ganham com a volatilidade”, diz Detmeister. Em tempos assim, é sempre bom lembrar um dos mais antigos ditados populares do setor financeiro: ursos ganham dinheiro, touros ganham dinheiro e porcos, vão para o abatedouro.