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Contra o consumismo, empresas apostam em 'Black Friday sustentável'

Marcas apostam em versões alternativas para a data que se tornou uma das maiores do varejo. Tradição começou com a Patagonia, há 10 anos

(Farm/Divulgação)
RC

Rodrigo Caetano

Publicado em 26 de novembro de 2021 às 06h00.

Última atualização em 26 de novembro de 2021 às 09h46.

Há exatos 10 anos, em plena Black Friday , um anúncio no jornal The New York Times chamou mais atenção do que os descontos oferecidos pelas varejistas. “Não compre essa jaqueta”, dizia a peça publicitária da marca de roupas esportivas Patagonia. Criada a partir da filosofia humanista de Yvon Chouinard, um dos pais do capitalismo consciente, a marca fazia uma crítica ao consumismo desenfreado, o grande apelo da Black Friday, ao mesmo tempo em que exaltava a qualidade dos seus produtos, feitos para durar – o mote da campanha dizia que os consumidores deveriam pensar mais antes de comprar um produto, e escolher aquele que oferecer a maior durabilidade.

O impacto da campanha talvez não tenha sido o esperado, uma vez que, desde então, a tradição da Black Friday só cresceu. A data, inclusive, antes restrita aos grandes varejistas americanos, se tornou global graças ao avanço do comércio eletrônico. Este ano, 57% dos brasileiros pretendem fazer compras na data , segundo pesquisa realizada pela EXAME/IDEIA, alta de 13% em relação a 2020.

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Apesar disso, a ideia que parecia absurda em 2011 ganhou adeptos e algumas variações. Marcas brasileiras de vestuário, como Animale e Farm, e a fabricante de produtos de limpeza naturais YVY lançaram suas próprias versões da Black Friday com uma pegada menos consumista. Lá fora, a marca de bolsas suíça Freitag está direcionando seus clientes para um site de trocas, e na Inglaterra, 85% dos pequenos varejistas online dizem que vão boicotar a Black Friday em protesto contra as atitudes monopolistas das gigantes do comércio eletrônico, em especial a Amazon.

Questão de posicionamento

“As marcas precisam ser coerentes”, afirma Marcelo Ebert, fundador da YVY. “A empresa surgiu com uma proposta de consumo moderno, não podemos fugir disso.” O modelo de negócios da fabricante de produtos de limpeza é o de assinatura. Seus produtos levam apenas insumos naturais, um contraponto à indústria tradicional, que abusa dos químicos. Ela também utiliza recipientes reutilizáveis, que o cliente abastece com as cápsulas que chegam em sua casa mensalmente.

No lugar da Black Friday, a YVY aderiu à campanha Green Friday, que busca promover a compra de produtos naturais. A campanha não é nova, surgiu no Canadá ainda nos anos 90, mas só chegou ao Brasil em 2018. Segundo Ebert, o objetivo é fazer com que os consumidores, na busca por descontos, experimentem novos modelos de negócio. “As pessoas ficam mais abertas a experimentações na Black Friday, então, queremos aproveitar para fomentar o consumo consciente”, diz o empreendedor. Este ano, a YVY deve faturar cerca de 7 milhões de reais.

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Outra marca que aderiu à Green Friday é a Farm, de vestuário. A grife, que pertence ao Grupo Soma, dono de marcas como Hering e Dzarm, está fazendo uma liquidação de sua linha carbono neutro, com descontos que chegam a 80%. Para neutralizar as emissões, ela fez uma parceria com o Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam) para o plantio de árvores frutíferas.

Economia circular

A Animale, que também pertence ao Grupo Soma, optou por uma abordagem alinhada à economia circular e à diversidade. A marca lançou a We Friday. A cada peça vendida entre os dias 9 e 28 de novembro, será feita uma doação às ONGs Instituto Dona de Si, Ampara e Oficina Muda. São entidades que buscam capacitar mulheres na produção de moda feminina a partir do conceito de upcycling, que reaproveita peças descartadas para criar outros produtos.

“A tendência que observamos ao longo dos últimos anos é que os consumidores querem se conectar com marcas que trazem para além de uma proposta de estilo”, afirma Ana Freitas, líder de marketing da Animale. “A Black Friday é uma oportunidade onde os consumidores podem experimentar novos produtos e se conectar com novas marcas e suas essências. Sabemos disso porque nesse momento é quando mais adquirimos clientes novos na Animale.”

Já a marca suíça Freitag, de bolsas, decidiu radicalizar na economia circular. Em vez de mostrar ofertas, ela vai direcionar os clientes que entrarem em seu site para uma plataforma de trocas que funciona como o aplicativo de relacionamentos Tinder. O consumidor terá de registrar ao menos um produto na plataforma e, assim, poderá navegar por fotos de bolsas de outros clientes. Se gostar, arrasta para a esquerda e, se der match, é só fazer negócio.

Boicote às gigantes

É na Inglaterra que o movimento anti-Black Friday ganhou mais adeptos, especialmente entre pequenos varejistas. Um levantamento feito pela British Independent Retailers Association aponta que 85% dos comerciantes independentes não vai participar da Black Friday. Segundo a entidade, o número é o maior já registrado e é resultado de um movimento crescente contra práticas consideradas monopolistas de grandes companhias, notadamente a Amazon.

A maioria dos pequenos comerciantes que boicotam a data acaba se engajando em ações como o plantio de árvores ou doações de receita. “Estou doando 10% do que eu vender para o banco de alimentos da minha região”, disse Zoe Roberts, da Out of the Box Gifts, pequena varejista de presentes com apelo sustentável. “Há muitos motivos para eu não gostar da Black Friday, mas o principal é que a data incentiva as pessoas a comprar produtos que não precisam e, com isso, aumenta o desperdício.”

Roberts também enfatiza que é difícil para pequenos negócios competir com os gigantes em descontos. “Buscamos manter nossos preços justos o ano inteiro”, diz ela. “Não podemos dar grandes descontos às vésperas do período mais movimentado do ano.” Talvez essa seja a maior reflexão das Black Fridays alternativas: quanto realmente vale um produto que é vendido pela metade do preço?

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