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"Talvez fosse melhor ser funcionário público"

Para Maurício Loureiro, presidente do Cieam, privilégios da lei incentivam greves no setor público, em prejuízo da atividade econômica

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h31.

Ao contrário dos anos 70 e 80, quando o movimento grevista era sustentado pelos funcionários de empresas privadas, os anos 90 assistiram ao fortalecimento das greves do setor público. Para Maurício Loureiro, presidente do Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Cieam), os privilégios conquistados pelos servidores públicos, por meio de leis e do apoio da Justiça, incentiva as paralisações e dificultam ainda mais o dia-a-dia das empresas privadas que dependem de seus serviços. Leia, a seguir, o depoimento de Loureiro à EXAME:

"O movimento grevista no Brasil teve seu ápice até início dos anos 90, depois arrefeceu, e voltou a tomar forma mais vultosa não mais com o trabalhadores do ABC paulista, ou mesmo, de trabalhadores comuns de outras regiões do país. A grande surpresa foi o início do movimento grevista dos funcionários públicos a partir do governo Fernando Henrique Cardoso, que, por motivos óbvios, mexeu em questões que feriam os interesses das mais diversas categorias públicas de maneira geral. E aí, o movimento grevista tomou corpo e se aprimorou.

O que temos visto desde aquela época é uma movimentação cada vez maior do funcionalismo público em geral, sempre reivindicando mais e mais aumentos e sempre na suposição de que somente eles existem, e de que somente eles precisam ganhar cada vez mais. Até desembargadores fizeram greve. Veja que a partir daí fica cada vez mais difícil para que o cidadão comum entenda e defenda seus direitos, sem contudo, poder ter o mesmo nível de vida e de ganhos que cada uma dessas categorias tem hoje no Brasil.

Costumo dizer que ser empresário no Brasil é uma tarefa árdua, difícil, um esforço hercúleo. Talvez o melhor fosse ser funcionário público, pois até quando fazem greve, continuam recebendo seus vencimentos. O que, na realidade, não se caracterizaria como uma greve, mas sim como alguém que está de férias e recebe seus vencimentos e ou salário. É por isso que digo que ser funcionário público no Brasil é melhor do que ser empresário.

Os empresários normalmente e/ou compulsoriamente precisam pagar os impostos em dia, pagar os empregados em dia, concorrer em mercados regulados ou não pelo governo. Sejam as regulamentações do governo corretas ou não. Sejam elas lógicas ou não. Tenham elas lastro jurídico ou não. Assim é a nossa vida. Mas o pior dos mundos para nós é ver o estado brasileiro ser travado, parado, por greves feitas por funcionários públicos que, em princípio, deveriam servir ao povo, às suas necessidades, pois a maioria desse povo os sustenta com altos pagamentos de impostos.

As greves tomaram maior vulto a partir do segundo mandato do presidente Fernando Henrique. Em especial, o segmento funcional público estratégico para o país, como por exemplo: fiscais agropecuários, INSS, Anvisa, Polícia Federal, Receita Federal, marinha mercante, etc.

Isso demonstra que há uma articulação entre o funcionalismo público federal para que qualquer governo passe a entender que o Estado brasileiro não são os governantes de plantão, mas sim os funcionários públicos que, em sua maioria são concursados, e - pasmem -, muitas vezes nem o presidente da República tem autoridade legal para demiti-los. Há categorias que conseguiram colocar na Constituição brasileira seu grau de importância, sendo que, a partir daí, se atribui grau maior de importância a essa categoria, visto que, por ser constitucional, se tornam eventualmente privilegiados. Tudo isso ocorre porque o Estado brasileiro, os legisladores brasileiros, diga-se de passagem, foram considerados os piores nos últimos 40 anos, por não conseguirem exercer corretamente seu papel de legislar e seguir condutas de homens probos. Isso ocorre ou por pressão da divisão partidária, ou pelo despreparo geral, ou ainda em função da falta de visão de Estado-Nação. O fato é que os funcionários públicos podem fazer greve, podem reivindicar - existe até lei para isso, mas que nunca foi regulamentada. Normalmente, a Justiça reconhece tal direito, por meio de liminares, sem contudo, considerar o direito do cidadão comum.

Conceder liminares para que se faça uma greve, com direito a receber vencimentos sem trabalhar é, no mínimo, um estupro ao cidadão que trabalha, que recolhe impostos em dia, e que precisa lutar diuturnamente por seu trabalho, por sua segurança e por seu sustento, uma vez que o país deixa muito a desejar.

A greve da Receita Federal é uma demonstração inequívoca de que o estado brasileiro precisa de uma revisão urgente, caso contrário, estaremos sempre à mercê do humor deste ou daquele movimento grevista. Não podemos chamar tais movimentos grevistas de democráticos, pois, ao ferir o direito dos demais cidadãos, fere a Constituição brasileira, em seu art. 5º, que diz:

"DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS:

CAPITULO I

DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS.

Art. 5º. : Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, e à propriedade, nos seguintes termos: (...)"

Veja que o termo igualdade está grifado por mim. E é aí que está o nosso problema maior. A nossa Constituição cidadã, segundo o saudoso Ulisses Guimarães, deveria, quando aplicada as leis, seguir rigorosamente o artigo quinto."

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