Economia

Segurança é um problema de gestão

Sim, é verdade: faltam recursos para refrear a violência na metrópole, há problemas sociais graves e crimes acontecem em qualquer lugar do planeta. Mas é verdade também que se faz muito pouco com os recursos disponíveis, e a situação poderia estar bem melhor se eles fossem usados de forma correta. Nesta entrevista a EXAME SP, […]

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h24.

Sim, é verdade: faltam recursos para refrear a violência na metrópole, há problemas sociais graves e crimes acontecem em qualquer lugar do planeta. Mas é verdade também que se faz muito pouco com os recursos disponíveis, e a situação poderia estar bem melhor se eles fossem usados de forma correta. Nesta entrevista a EXAME SP, José Vicente da Silva, coronel reformado da Polícia Militar e pesquisador do Instituto Fernand Braudel, aponta medidas simples que poderiam amenizar a situação.

O problema da segurança em São Paulo é irreversível?

Claro que não. Não se vai acabar com a violência. Caim matou Abel e não foi por falta de polícia. Mas é possível baixar os índices para níveis suportáveis. Hoje a relação de homicídios é de 50 para 100 000 habitantes por ano. O suportável é 20 por 100 000. Em bairros paulistanos como Moema é 5 por 100 000.

O que é preciso para melhorar a situação?

O fundamental não custa quase nada: informação e gestão. É preciso usar a informação para alocar melhor os recursos. Se há mais crimes nas zonas sul e leste da capital, por exemplo, é preciso que os esforços sejam concentrados nessas áreas. O que ocorre há muito tempo é que existe uma divisão igual, sem levar em conta o tipo de problema de cada área. Para ter uma idéia, 70% dos crimes do estado ocorrem na Grande São Paulo. E só 35% do efetivo de policiais está nessa região.

O que está errado na gestão da segurança pública?

Em primeiro lugar, eu colocaria um executivo, um administrador para ser secretário. Não adianta um jurista ou um promotor, que pode saber muito de leis e teorias, ser nomeado para resolver um problema de administração. O ideal seria um Abílio Diniz (presidente do Grupo Pão de Açúcar). A rede de polícia é muito parecida com uma rede de supermercados.

Como assim?

O Abílio Diniz conseguiu levantar sua empresa fazendo uma profunda reestruturação. Deu liberdade e motivou os gerentes de cada supermercado a tirar o melhor que poderiam de cada uma de suas lojas. As delegacias da Polícia Civil e os batalhões da Polícia Militar são como lojas de supermercados. Os delegados e comandantes são os gerentes e são eles que melhor conhecem os problemas da área.

A polícia não sabe usar as informações?

Há poucas informações, e o pouco que existe é mal usado. Apenas 25% dos crimes que ocorrem são denunciados pela população. Com isso, fica difícil fazer um mapa exato do que acontece. Mas em regiões onde se melhorou o uso de informações, mesmo elas sendo escassas, como na zona oeste, o roubo de carros, por exemplo, diminuiu. É preciso saber onde o crime ocorre e mandar a polícia para lá. É simples e funciona.

O senhor concorda que a população não denuncia crimes porque não acredita mais na polícia?

É verdade. O atendimento é ruim porque o policial está desmotivado. E isso acaba gerando um círculo vicioso. Além disso, os crimes pequenos são deixados de lado, e isso colabora para o aumento dos crimes grandes. Se você pega um assaltante em início de carreira, ele vai pensar duas vezes antes de tentar alguma coisa maior.

Como motivar os policiais se não há dinheiro?

São atitudes. Uma delas é valorizar o policial, mostrando que ele é peça fundamental do jogo. A outra é a política de promoção. Na Polícia Militar, as promoções por mérito são concedidas em 80% dos casos a policiais que desempenham atividades burocráticas. Aqueles que estão na rua, correndo maior risco, são desvalorizados.

A relação entre a Polícia Civil e a Polícia Militar não é das melhores. Isso não atrapalha?

Atrapalha, e muito. Esse é um dos motivos pelos quais defendo a unificação das polícias. Hoje, um policial militar atende a uma ocorrência no local. Por exemplo, um homicídio. O caso é levado a uma delegacia, onde é feito um boletim de ocorrência. Se for numa sexta-feira, o delegado só vai examiná-lo na segunda e a investigação começará uma semana depois. A essa altura o assassino já fugiu.

Hoje há muito medo, principalmente da classe média para cima, de seqüestro. O que se pode fazer?

A população de um modo geral corre pouquíssimo risco de ser vítima de um seqüestro. Temos um seqüestro a cada dois dias na Grande São Paulo, mas temos 2 000 assaltos e 25 homicídios por dia. A violência não se distribui de maneira uniforme. Os principais focos ficam nos locais mais pobres. Parece que não, porque quando a classe média grita aparece na mídia. Já os pobres não têm microfone para reclamar. O mais importante é ter consciência do que está ocorrendo e cuidar da segurança como se cuida da saúde, ficar atento e não entrar em paranóia.

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