Reforma é matemática, não ideológica, diz presidente do Morgan Stanley
Para Alessandro Zema, a retomada do crescimento do Brasil passa obrigatoriamente pela aprovação da reforma da Previdência
Estadão Conteúdo
Publicado em 24 de abril de 2019 às 07h20.
Última atualização em 24 de abril de 2019 às 09h05.
São Paulo — A retomada do crescimento do Brasil passa obrigatoriamente pela aprovação da reforma da Previdência, que está em discussão no Congresso. "É absolutamente crítico resolver o equilíbrio das contas públicas. E isso passa pela reforma da Previdência . Não é uma questão de ideologia, mas de matemática", diz Alessandro Zema, presidente do banco de investimentos Morgan Stanley no Brasil. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Como o sr. avalia os 100 dias do governo de Jair Bolsonaro?
Antes de responder essa pergunta queria fazer uma contextualização. Acredito que as menores tensões comerciais e atuação dos bancos centrais têm trazido uma melhora ao ambiente internacional. E isso favorece mercados emergentes. Dito isso, o Brasil tem potencial para capturar boa parte dos investimentos destinados a mercados emergentes.
Como os investidores estrangeiros estão olhando o Brasil neste momento?
É absolutamente crítico resolver equilíbrio das contas públicas. E isso passa pela reforma da Previdência. Não é uma questão de ideologia, mas de matemática. O déficit gerado pela Previdência é insustentável: corresponde por 8,5% do PIB do Brasil.
Há ambiente político para que a reforma seja aprovada?
Há 25 anos que se discute a reforma da Previdência. Foram 5 presidentes. Acredito que o Congresso e a sociedade estão preparados para entender que não dá mais para se empurrar com a barriga. A Previdência é a primeira parte do reequilíbrio das contas públicas. Depois, a gente consegue aumentar o nível de confiança da economia, fazendo com que as empresas invistam mais, gerando renda e emprego.
O sr. ainda está confiante na aprovação da reforma mais ambiciosa, mesmo com os recentes conflitos em Brasília?
Enquanto não houver a reforma, o Brasil está condenado a um crescimento pífio de PIB. Torço pela aprovação da reforma de R$ 1 trilhão. Uma reforma abaixo disso só resolve o problema do governo Bolsonaro. Não podemos empurrar para as gerações futuras o desequilíbrio fiscal que temos hoje.
O que significa um crescimento pífio?
Crescimento de 0,6% na média dos últimos 10 anos. Nos últimos dez anos, tivemos soluções paliativas que nunca endereçaram à questão fiscal.
Se aprovada a Previdência, quais serão as outras prioridades do governo?
O Brasil, para desenvolver todo o seu potencial, precisa de uma série de reformas. A Previdência é a primeira delas. Em seguida vem a reforma tributária, independência do Banco Central, mudança tamanho do Estado.
Havia uma expectativa dos investidores de que a recuperação do Brasil fosse mais rápida...
Essa incerteza política tem gerado desapontamento. Com o resultado das eleições, os investidores locais, por estarem mais próximos da situação, conseguiram se reposicionar melhor. Dito isso, os investidores globais, que não são focados em América Latina e países emergentes, só devem injetar mais recursos aqui quando a reforma de fato acontecer. Mas já há movimentos concretos de investimentos no País.
Quais movimentos?
Os leilões de concessões de aeroportos e da Ferrovia Norte-Sul foram bem sucedidos. O programa de privatização do governo também deve atrair muitos investidores. Sem contar que as empresas estão acessando mais o mercado de capitais. Quando há boas histórias, há interesse de investidores. Neste ano, já foram sete operações de mercado de capitais: seis transações de "follow on" (emissões de ações) e um IPO (abertura de capital, na sigla em inglês), movimentando US$ 2,7 bilhões. Os investidores estrangeiros participaram ativamente.
Como será este ano?
Dependendo da velocidade das privatizações e aprovação da Previdência, podemos chegar US$20 bilhões em ofertas, com emissões de ações e IPOs.
Sobre as privatizações, o que sr. acha imprescindível e quais são as 'vacas sagradas'?
O programa de leilões de infraestrutura prevê levantar R$ 130 bilhões de ativos. Se tomar uma perspectiva mais holística, o governo enviou uma proposta mais ambiciosa de reforma da Previdência, enviou projeto de lei de independência do Banco Central, vem discutindo a reforma tributária. Já fez bastante coisa. A Petrobrás tem feito desinvestimentos. É normal que haja resistências. Está claro, pelo que ouço, que Petrobrás, Banco do Brasil e Caixa são as vacas sagradas.
O mercado reagiu mal à interferência do presidente no reajuste do diesel...
A questão do diesel causou surpresa, mas governo respondeu rápido sobre a Petrobrás ter independência e a questão dos caminhoneiros. O período que Petrobrás foi usada como política macroeconomia, a gente quer esquecer. Os resultados foram desastrosos para empresa e para a economia.
Quais são os planos do Morgan Stanley para o Brasil?
O banco tem, nos últimos 22 anos, atuação forte em renda variável, renda fixa e banco de investimento. São os três grandes carros-chefes no Brasil. Mas queremos crescer outros negócios. Começamos a atuar aqui desde o ano passado na área de "asset management" (gestão de ativos). Somos o segundo maior gestor global de fortunas e queremos aumentar a participação de clientes brasileiros em nossa operação fora do País.