Economia

Queda-de-braço pode pôr em risco um acordo bilateral Brasil-EUA

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva deixou a Casa Branca, sede do governo dos EUA, em Washington, com a promessa de se reunir com o presidente George Bush, em janeiro, para discutir um acordo comercial entre os dois países. O pragmatismo de Lula ao aderir à Alca foi elogiado em editorial até pelo […]

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h56.

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva deixou a Casa Branca, sede do governo dos EUA, em Washington, com a promessa de se reunir com o presidente George Bush, em janeiro, para discutir um acordo comercial entre os dois países. O pragmatismo de Lula ao aderir à Alca foi elogiado em editorial até pelo sóbrio diário britânico Financial Times. Mas não seria mais vantajoso para o Brasil fechar de cara um acordo bilateral de livre comércio com os Estados Unidos? Em tese, sim. Tirá-lo do papel, porém, pode ser mais difícil do que as declarações da maioria dos políticos dão a entender.

"Um relacionamento mais próximo e solidário com o Brasil representaria para Bush a melhor estratégia para evitar uma crise financeira ainda mais profunda e, assim, proteger os interesses das corporações americanas presentes no país", afirma o editorial do FT. mas um acordo bilateral é algo muito mais complexo. Depende da disposição de os dois países fazerem concessões e, até agora, ninguém deu o primeiro passo.

Para Walter M. Bastian, vice-secretário assistente do Departamento de Comércio Americano, um acordo bilateral com os Estados Unidos seria muito importante para os dois países. "Queremos fazer um acordo de cooperação econômica com a maior economia da América Latina, mas isso não excluiria a Alca", afirmou Bastian no World Economic Forum, realizado em novembro no Rio de Janeiro.

Depois do debate no Fórum entre o senador Aloízio Mercadante e Kenneth Dam, vice-secretário do Tesouro dos Estados Unidos, a conclusão geral foi que será uma experiência enriquecedora assistir ao progresso da negociação comercial entre os dois países. "Os americanos são duros nas negociações. E Mercadante também já mostrou que o PT também será assim", disse Jose-Maria Figueres, diretor gerente do World Economic Forum. "Isso pode render um bom acordo para os dois."

Mas o entendimento entre os dois países não é tão simples e esbarra na política de defesa comercial dos EUA. "Abrir mais espaços na maior economia do mundo é, em princípio, bom para o Brasil", afirma José Augusto Guilhon Albuquerque, coordenador do núcleo de relações internacionais da USP. "Mas depende de quanto teremos de ceder. Eles não abrem mão da prerrogativa de criar barreiras quando os interesses deles são feridos. São salvaguardas e medidas anti-dumping que praticamente inviabilizam qualquer acordo."

De acordo com os especialistas ouvidos pelo Portal EXAME, os pontos divergentes entre Brasil e EUA na costura de um acordo bilateral são os mesmos que emperram a discussão da Alca (Área de Livre Comércio das Américas). "Temos enormes dificuldades definir uma agenda de interesses comuns. O Brasil corre o risco de perder economicamente", afirma Sandra Maria Polonia Rios, coordenadora da unidade de integração internacional da CNI (Confederação Nacional da Indústria).

Dois países emergentes, México e Chile, já trilharam o caminho que Lula pode seguir a partir de janeiro. Travessia calma para o primeiro; tempos de duras negociações para o segundo. México e EUA estavam muito próximos do acordo: 70% das exportações mexicanas já iam para o território americano, o que facilitou as negociações. "Os Estados Unidos também mais disposição porque têm interesses geopolíticos no México, o que não ocorre no Brasil." Já a parceria entre chilenos e americanos foi consolidada em Washington nesta terça-feira depois de dois anos de negociações. "Foi um processo longo", diz Guilhon. O acordo elimina imediatamente tarifas em 85% dos bens industriais e de consumo. Em quatro anos, caem a zero.

Barreira diplomática

De acordo com Guilhon, no entanto, qualquer avanço na relação do Brasil com os Estados Unidos também depende de uma outra resposta: quem vai mandar na política externa no próximo governo? "Se o presidente delegar a tarefa à burocracia diplomática, dificilmente avançaremos nessas discussões", diz Guilhon. "O Itamaraty pensa que o Brasil não pode negociar sozinho e precisa focar sempre em acordos maiores."

Em reunião reservada no World Economic Forum, no Rio de Janeiro, representantes de várias instituições comerciais internacionais criticaram o Itamaraty por não ter técnicos nem consultores especializados em exportações e parcerias. Esse fator foi apontado pela maioria como um dos maiores impedidores de o Brasil conseguir elevar seu volume de exportações. "As empresas americanas fazem muito lobby para os Estados Unidos. De modo geral, a América Latina não é muito boa com lobbies para empresas exportarem, talvez devido às constantes crises na região", afirmou Ortrun Froehling, vice-economista-chefe e vice-presidente de Economia e Desenvolvimento da Alemanha.

O Itamaraty também não costuma dar prioridade à discussão de acordos bilaterais. "Nosso interesse é tratar os acordos de maneira multilateral", afirmou um porta-voz do ministério ao Portal EXAME. Sandra Rios, da CNI, também reprova a postura da diplomacia brasileira. "O Brasil não pode fechar os olhos para os acordos bilaterais", diz ela. "Quem não fizer parte desses acordos prejudica-se. É importante sentar em todas as mesas de negociações possíveis."

Os parceiros ideais

Mas será que os Estados Unidos são o país mais indicado para uma negociação bilateral? Nem isso é consenso. De acordo com Sandra, o México é o país-chave. As duas economias são emergentes e têm interesses complementares em praticamente todos os setores da economia. "Temos um acordo bem restrito, mas que já mostra um avanço", diz ela. "É preciso ampliá-lo." Assinado no meio do ano, o acordo começa a dar resultado na ponta do lápis: as exportações para o México cresceram 26% neste ano, enquanto as importações caíram 18%. Nos dez primeiros meses de 2003, o Brasil registrou superávit comercial de quase 1,5 bilhão de reais com os mexicanos. A CNI ainda aponta os países andinos, África do Sul, Rússia, China e Índia na lista dos principais pretendentes a um namoro econômico com o Brasil. Mas, afirma Sandra, os acordos não atenderiam a todos os setores da economia como seria o caso com o México.

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