OPINIÃO: Fim da linha
Solução fiscal passa por reduzir a brutal rigidez orçamentária, escreve Gabriel Barros, economista-chefe da ARX Investimentos
Redação Exame
Publicado em 14 de novembro de 2024 às 14h12.
Por Gabriel Barros*
É grande a expectativa dos agentes de mercado para o anúncio do pacote fiscal, esperado para esta semana, após três semanas de adiamento. Além do montante global da economia estimada, sua composição será fundamental na avaliação da qualidade da consolidação fiscal almejada pelo governo, com efeitos tanto diretos quanto indiretos sobre a percepção de risco fiscal.
Para uma mesma economia efetiva estimada — de pelo menos R$80 bilhões no próximo biênio — o efeito sobre a curva de juros e taxa de câmbio são bastante diferentes se vier (ou não) acompanhada de medidas estruturais e recorrentes.
Não há atalho para endereçar o quadro fiscal.
De acordo com dados compilados pela Moody´s Investor Relations, em média, a rigidez do orçamento para uma amostra de 15 países emergentes (ex-Brasil) é de 69%, com destaque para Costa Rica, Argentina e Colômbia que apresentam o maior comprometimento das despesas com gastos obrigatórios (gráfico abaixo).
O Brasil, de acordo com a mesma fonte, apresenta rigidez de 93%, o maior dentre os países selecionados e 24 pontos percentuais acima da média. De acordo com as nossas estimativas, a redução do grau de liberdade no orçamento público vem acentuando-se ao longo do tempo, de modo que a rigidez atualmente estimada é na realidade de, pelo menos, 95%.
Rigidez orçamentária: participação do gasto obrigatório na despesa primária
Fonte: Moody´s Investor Relations e ARX Investimentos
A rigidez orçamentária é entendida como o tamanho das obrigações vis-à-vis o total da despesa não financeira (primária) do governo federal.
Em outras palavras, é a medida de quanto do orçamento público está "carimbado" com despesas obrigatórias, a exemplo do salário de servidores, pisos de saúde, educação e programas de transferência de renda. Um alto grau de rigidez reduz a capacidade fiscal de absorção de choques e limita o grau de liberdade da gestão da política fiscal.
Além da reavaliação de gastos ( spending review ), é preciso retomar a agenda DDD, que busca desvincular, desindexar e desobrigar uma série de despesas atualmente carimbadas no orçamento público.
O caminho que o país deveria seguir em termos de gestão de política fiscal é bastante conhecido e uma série de medidas já foram propostas de modo a compatibilizar a responsabilidade social com a fiscal, elegendo a probidade no uso dos recursos públicos e o fim de privilégios de castas e elites do serviço público como prioridade.
Há exatos dois anos , antes mesmo do término do governo anterior e posse do atual, propusemos no debate público um conjunto de medidas com potencial de economizar até R$700 bilhões em 10 anos. Mais recentemente, incorporando parte do que estaria sendo objeto de potencial análise pela atual administração, estimamos que mais de 0,5% do PIB poderia ser otimizado pelo lado do gasto no mesmo horizonte.
De outra forma, significa dizer que o largo espaço para adoção de medidas pelo lado da despesa, após exaustão da agenda fiscal pelo lado das receitas,é substancial e pode chegar a quase 6 pontos percentuais do PIB.Após o sucesso (e fadiga) do ajuste empreendido pelo lado da arrecadação, é passada a hora de atacar o problema fiscal estrutural, ligado à insustentável dinâmica de crescimento das despesas.
*Gabriel Barros economista-chefe da ARX Investimentos