Economia

Desemprego persistente muda personalidade, diz estudo

Trabalho que analisou alemães antes e depois de um período de desemprego encontrou mudanças significativas em vários traços de personalidade

Homens desempregados jogam xadrez do lado de fora de agência de empregos em Manila, nas Filipinas (Stephen Shaver/Bloomberg)

Homens desempregados jogam xadrez do lado de fora de agência de empregos em Manila, nas Filipinas (Stephen Shaver/Bloomberg)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 5 de março de 2015 às 14h42.

São Paulo - O surgimento de uma legião de desempregados nos Estados Unidos e na Europa após a crise de 2008 rendeu uma profusão de dados e pesquisas sobre o tema.

Já sabemos que o desemprego de longo prazo tem efeitos duradouros sobre a renda, a satisfação pessoal e até sobre a taxa de suicídios

Agora, um novo estudo publicado pelo Journal of Applied Psychology mostra que quem procura e não acha trabalho é afetado em sua própria personalidade.

Já há algumas décadas, os psicólogos tendem a analisar a personalidade em 5 eixos: neuroticismo (ou instabilidade emocional), extroversão, amabilidade, escrupulosidade e abertura para as experiências.

A tendência era considerar que estes traços se fixavam por volta dos 30 anos, mas isso vem sendo questionado, e o debate agora é se as mudanças de personalidade na fase adulta são moldadas mais pelo amadurecimento natural ou por fatores externos.

É aí que entra o estudo de Constantine Sedikides, da Universidade de Southampton, Michael Daly, da Universidade de Stirling, e Christopher J. Boyce e Alex M. Wood, pesquisadores em Stirling e na Universidade de Manchester. 

Eles usaram uma amostra de 6.769 alemães que responderam a um teste de personalidade em dois momentos: 2005 e 2009. Destes, 201 ficaram desempregados por um período de um a quatro anos e 251 por menos de um ano.

A amostra foi controlada por variáveis como idade, educação e outros acontecimentos do período (como um casamento, por exemplo). Ainda assim, é preciso cuidado em generalizar os resultados, que naturalmente refletem condições específicas do momento econômico e das concepções do povo alemão.

Resultados

A pesquisa confirmou várias expectativas dos pesquisadores, entre elas a de que "o desemprego geralmente cria tanto ameaças quanto oportunidades, que serão mais ou menos salientes em vários estágios de desemprego (curto prazo contra longo prazo) e vão se diferenciar de acordo com o gênero".

Quanto mais tempo os homens ficam desempregados, maior é a redução em seus traços de "escrupulosidade" (o cuidado em fazer algo de forma meticulosa e vigilante). No caso das mulheres, há uma linha de queda que depois volta a subir.

"Desempregados podem experimentar pressões para reduzir gradualmente seus níveis de escrupulosidade, o que pode ser uma forma de lidar com o próprio desemprego. Indivíduos desempregados com predominância deste traço são os que experimentam as maiores quedas em satisfação pessoal após o desemprego", dizem os pesquisadores.

Surpreendentemente, não foram verificados efeitos claros no "neuroticismo", enquanto a "abertura" foi reduzida em ambos os gêneros. Nos homens, a "amabilidade" sobe em um primeiro momento para depois cair. Nas mulheres, a queda é constante e gradual.

"Nos estágios preliminares de desemprego, pode haver incentivos para os indivíduos agirem de forma amável, parte do esforço de assegurar um novo trabalho ou aplacar aqueles em volta, mas nos estágios posteriores, quando a situação se torna endêmica, estes incentivos se enfraquecem", continuam.

Veja na figura um resumo da pesquisa (agreeableness significa amabilidade e conscientiousness significa escrupulosidade. A linha pontilhada é a evolução da personalidade dos nunca desempregados e a linha contínua, dos desempregados ao longo do tempo):

(Journal of Applied Psychology)

 

(Journal of Applied Psychology)

Acompanhe tudo sobre:AlemanhaDesempregoEuropaPaíses ricosPsicologia

Mais de Economia

Qual é a diferença entre bloqueio e contingenciamento de recursos do Orçamento? Entenda

Haddad anuncia corte de R$ 15 bilhões no Orçamento de 2024 para cumprir arcabouço e meta fiscal

Fazenda mantém projeção do PIB de 2024 em 2,5%; expectativa para inflação sobe para 3,9%

Mais na Exame