CERIMÔNIA DE ABERTURA: o estádio, que custou 100 milhões de dólares, será demolido depois dos jogos (Pawel Kopczynski/Reuters)
Da Redação
Publicado em 9 de fevereiro de 2018 às 17h56.
Com a cerimônia de abertura realizada nesta sexta-feira, começaram oficialmente os XXIII Jogos Olímpicos de Inverno de PyeongChang, na Coreia do Sul. Realizadas a cada quatro anos, as Olimpíadas de Inverno se concentram em esportes relacionados a neve e gelo, como patinação artística, hóquei no gelo o snowboard. Todos esportes que requerem infraestruturas muito caras e complexas de serem realizadas. Não por acaso o governo sul-coreano teve que construir do zero seis novas estruturas esportivas invernais, como pistas de esqui e estádios refrigerados, e trabalhar em pesados projetos de modernização de outras seis.
Custo total da obra: cerca de 13 bilhões de dólares (ou 42,9 bilhões de reais). Quase o dobro de quanto programado no orçamento inicial de 2011, quando a localidade obteve o direito de sediar as Olimpíadas de Inverno. Naquela época PyeongChang era um pequeno vilarejo no meio de montanhas cinzas com apenas 4.000 habitantes, localizado a 180 km da capital, Seul, e completamente desconhecido ao resto do mundo.
Em poucos anos o governo sul coreano injetou 1 bilhão de dólares na estrutura invernal de Alpensia, onde serão realizadas a maioria das competições, construindo linhas de trem-bala, resort de luxo, estádios e trampolins de esqui espetaculares. E não parou por aí: foram desembolsados mais 2 milhões de dólares para traduzir em inglês todas as placas das estradas, os menus dos restaurantes e até para trocar a mobília dos banheiros públicos e deixá-los mais aptos para as exigências dos visitantes estrangeiros.
Mais dinheiro foi investido em cursos de idiomas para os funcionários dos hotéis, taxistas e voluntários. Tudo muito parecido com as Olimpíadas do Rio de Janeiro de 2016. E assim como no caso dos jogos brasileiros, é difícil, se não impossível, calcular se tudo isso voltará nas caixas sul-coreanas de alguma forma no futuro. O risco muito concreto é que a magia das Olimpíadas evapore após o dia 25 de fevereiro, com a cerimônia de encerramento dos jogos, deixando o contribuinte sul-coreano pagando o pato.
Até porque somente uma pequena parte desses 13 bilhões de dólares, apenas 2,5 bilhões de dólares, foi garantida pelos patrocinadores e pelo Comité Olímpico Internacional (COI), o resto saiu do bolso de um governo que não poupou esforços para se mostrar ao mundo. O valor gasto em PyeongChang é exatamente o mesmo gasto nas Olimpíadas do Rio. Só que na Cidade Maravilhosa foram realizadas 306 competições em 28 esportes diferentes, com mais de 11.000 atletas participantes que invadiram a Cidade Olímpica, enquanto em PyeongChang são apenas 102 competições em 7 esportes, e 2.925 atletas participantes. Ou seja, se no Rio 2016 o custo foi de 1,18 milhão de dólares por atleta, em PyeongChang esse custo é quase quatro vezes mais: 4,44 milhões de dólares por atleta.
E jà há casos bem polêmicos, como o do Estádio Olímpico de Pyeongchang, com uma capacidade de 35.000 pessoas em 8 níveis, que em pouco mais de um mês e meio não existirá mais. Até aí, tudo bem. O problema é um custo de 109 milhões de dólares. A estrutura hospedará apenas quatro eventos: as cerimônias de abertura e encerramento dos Jogos Olímpicos de Inverno e Paralímpicos. Fim da história. Depois disso do estádio olímpico sul-coreano haverá apenas vídeos e fotografias. Será demolido porque sua manutenção teria custos exagerados e injustificados pelo uso que poderia ser feito dele no futuro.
Destino mais irônico será o do Gangneung Oval, sede das competições de patinagem de velocidade. A estrutura custou 90 milhões de dólares e no final dos jogos parece que será reconvertida em armazenamento para peixes congelados.
Claro, geralmente eventos olímpicos conseguem levantar receitas enormes, entre venda de ingressos, turismo, direitos de transmissão televisiva e patrocínios internacionais. Não por acaso, cinco empresas sul-coreanas peso-pesados decidiram investir nos jogos para se garantir visibilidade: Samsung, Hyundai-Kia, Lotte, LG e KT. E também as vendas de ingressos registraram resultados positivos. Lee Hee-beom, chefe do Comitê Organizador de PyeongChang 2018, afirmou na segunda-feira passada que 826.000 ingressos já foram vendidos, 77,3% do total disponível. “Vendemos entre 7.000 e 10.000 ingressos diariamente. Neste ritmo, estou confiante de que podemos ter os locais cheios”, declarou Lee. Todavia, na conta final as entradas representam apenas 5% do total dos gastos.
O consolo maior dos coreanos, na verdade, é a base de comparação. Para os Jogos de Sochi de 2014, na Rússia, foram gastos 51 bilhões de dólares (cerca de 168,3 bilhões de reais). E a opacidade dos gastos do governo russo mostra que esse valor pode ser ainda maior. Sochi é considerado hoje o evento esportivo mais caro de todos os tempos.
Com o valor gasto para as Olimpíadas o governo sul-coreano não se limitou a construir infraestruturas enormes, que correm o risco de se tornarem elefantes brancos inúteis e abandonados, mas decidiu desfrutar a ocasião para investir pesado em treinamento e preparo. Por isso foi criado o Centro Nacional de Treinamento Taereung, uma escola de preparação atlética localizada ao norte de Seul, que se tornou o lar de cerca de 400 atletas de 20 disciplinas diferentes. Além disso, foi também construído o Centro Nacional de Treinamento Taebaek, especializado em disciplinas de montanha. Mas o investimento maior foi o gigantesco Centro Nacional de Treinamento Jincheon, uma mega-estrutura para até 1200 atletas de 37 esportes diferentes, que foi inaugurado imediatamente antes da cerimonia de abertura da Olimpíada.
Além disso, o governo sul-coreano criou um programa de investimento em atletas que garante ao esporte nacional todos os anos cerca de 350 milhões de dólares (200 milhões para o profissionalismo, 180 milhões para o esporte em nível amador e 20 milhões para o esporte em escolas públicas). O objetivo dos sul-coreanos é aproveitar dessa ocasião para criar novas gerações de esportistas de inverno que possam conquistar mais medalhas para o país. Não que hoje os resultados dos sul-coreanos sejam negativos: na Olimpíada de Sochi em 2014 o pequeno pais asiático de 51 milhões de habitantes conquistou 3 medalhas de ouro, 3 de prata e duas de bronze. O mesmo número de medalhas de ouro da China, que tem 1,5 bilhão de habitantes e mais medalhas que o Japão, do Reino Unido e até da Finlândia, que graças a sua localização geográfica deveria ser uma potência dos esportes invernais.
E, diga-se de passagem, os atletas também tem suas vantagens monetárias para ganhar medalhas. Além de levarem para casa honra e glória olímpica para sì e para seus países, eles também recebem benefícios econômicos interessantes. Cada medalha pendurada no colo têm um valor que os comités olímpicos nacionais pagam. Os norte-americanos, por exemplo, receberão 25.000 para cada ouro, 15.000 para cada prata e 10.000 para os bronzes. A Alemanha pagará 20.000 euros para os ouros, enquanto a Itália será bem mais generosa: 150.000 euros por cada medalha dourada de seus atletas vestidos Armani. Mas o recorde é de Singapura, que pagará 757.000 dólares por cada ouro levado para casa. Obviamente as esperanças de medalhas dos atletas cingapurianos são mínimas até porque a delegação do país asiático é de um único atleta.
O Brasil, por sua vez, paga por volta de 33.000 para cada medalha que os dez atletas da delegação olímpica conseguirão conquistar, independentemente do metal. É um dinheiro que dificilmente sairá dos cofres do comitê olímpico nacional.