Guedes: em dezembro o ministro admitiu publicamente que um imposto sobre transações seria "inescapável" num contexto de desoneração da folha de pagamentos das empresas (Adriano Machado/Reuters)
Reuters
Publicado em 23 de setembro de 2020 às 18h41.
Última atualização em 23 de setembro de 2020 às 19h52.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou nesta quarta-feira que o estímulo à geração de empregos demandará uma "substituição tributária", mas a ideia para bancar a desoneração da folha das empresas segue sendo a criação de um novo — e amplo — imposto sobre transações, nos moldes da extinta CPMF.
A investida nunca deixou de fazer parte dos planos da equipe econômica e vem sendo gestada desde a campanha presidencial em 2018. Segundo uma fonte do time de Guedes com conhecimento direto do assunto, desde o início de setembro a intenção era aguardar o veredito das lideranças políticas para encaminhar formalmente a proposta.
Esse desenho ganhou contornos mais firmes nesta manhã, com o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), afirmando que, após uma reunião do presidente Jair Bolsonaro com líderes no Congresso e ministros, ficou acertado que o governo enviará o texto com novas propostas de mudanças tributárias primeiro para os líderes e para o relator da reforma, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).
A equipe econômica quer que a contribuição patronal seja zerada especialmente na faixa entre um e dois salários mínimos, onde está o universo de 70% dos trabalhadores brasileiros, para incentivar a criação de empregos no pós-crise. Para tanto, será necessário discutir a extensão da base tributária e o tamanho efetivo da desoneração.
A própria assessora especial do ministro da Economia, Vanessa Canado, reconheceu no último mês que o imposto que está sendo estudado nos moldes da CPMF não tributa só operações digitais, mas todas as transações da economia, justamente para que tenha essa característica de base ampla.
Em setembro do ano passado, o então secretário especial da Receita, Marcos Cintra, foi demitido em meio à demora na formatação final da reforma tributária e polêmica sobre a criação de um novo imposto sobre transações financeiras. Bolsonaro chegou a dizer que a saída de Cintra devia-se à tentativa de ressuscitar a CPMF.
Mas já em dezembro Guedes admitiu publicamente que um imposto sobre transações seria "inescapável" num contexto de desoneração da folha de pagamentos das empresas.
Ao mesmo tempo, o novo chefe da Receita, José Tostes Neto, apontou, também no apagar das luzes de 2019, que os estudos para bancar a desoneração da folha de pagamentos a partir da instituição de um imposto sobre transações financeiras haviam sido feitos e estavam prontos, mas deixaram de ser considerados em razão de diretriz colocada pelo governo de não tratar do tema "momentaneamente".
Na equipe econômica, a visão é que a articulação política está mais fortalecida agora e, ao mesmo tempo, o debate é justificável num momento em que lobbies de vários setores pressionam pela derrubada do veto presidencial à prorrogação da desoneração da folha que já vigora para alguns segmentos até o ano que vem.
O time de Guedes quer uma desoneração mais ampla da folha, não restrita aos 17 setores atualmente contemplados e, para tanto, conta com a ideia do novo imposto, encarado como de fácil e barato recolhimento.
Críticos da iniciativa, por outro lado, argumentam que um novo tributo nos moldes da CPMF seria excessivamente cumulativo pela sua incidência em cascata, e que impactaria a intermediação financeira de modo mais rápido e expressivo do que no passado, afetando a dinâmica de investimentos, a expansão do crédito e a quantidade de dinheiro vivo em circulação.
(Por Marcela Ayres; edição de Isabel Versiani)