Apostas esportivas: empresa brasileira se tornou líder graças ao atendimento e tecnologia (Getty images/Getty Images)
Repórter de Brasil e Economia
Publicado em 13 de novembro de 2024 às 07h30.
No ecossistema das casas de apostas, as populares bets, as fintechs são um dos principais atores de meios de pagamento. Essas empresas processam milhões de transações de Pix do apostador para a casa e da casa para o apostador.
Às portas da regulação do mercado, que começa em janeiro de 2025, CEOs de duas dessas empresas que atendem as chamadas bets mostram que a maioria das apostas está sendo realizada por pessoas das classes C, D e E e veem os grandes bancos brasileiros como os principais concorrentes nos próximos anos.
Cristiano Maschio, CEO e fundador da Qesh, empresa criada em 2019 por meio de um programa de aceleração da Visa, aponta que os dados do mês de outubro mostram que 77% das apostas processadas pela fintech foram realizadas por pessoas das classes C, D e E . Foram quase duas milhões de transações por Pix, totalizando um volume de R$ 156,3 milhões.
“As apostas são mais comuns entre as faixas de renda mais baixa, o que nos preocupa. Embora as apostas sejam feitas principalmente via Pix, e não com crédito direto, existe o problema social das apostas na população de baixa renda”, afirma Maschio.
O executivo destaca que as fintechs de pagamento podem ajudar a identificar padrões de comportamento, como frequência das apostas, fornecendo dados que auxiliam as casas de aposta a implementar bloqueios e ações preventivas. "A ideia é ajudar nas medidas de jogo responsável", diz.
João Gabriel Mendonça Franco, CEO da Paag, empresa que atende entre 30% e 40% das casas de apostas regulamentadas, aponta que as transações realizadas também mostram um grande volume de pessoas de baixa renda.
"Hoje, o perfil mais comum é de renda mais baixa, principalmente das classes C, D e E. Esse dado preocupa, pois são camadas da sociedade com maior vulnerabilidade financeira. Nossa equipe trabalha com soluções que ajudam as casas de apostas a entenderem e acompanharem", afirma Franco.
Uma das soluções ofertadas pela Paag é uma ferramenta que utiliza reconhecimento facial e verificação de identidade para garantir que o apostador está realmente em controle de sua conta.
"Estamos também em fase de testes de uma inteligência artificial que ajudará a identificar padrões de comportamento indicativos de vício ou possível lavagem de dinheiro. Nossa expectativa é lançar essa ferramenta no primeiro semestre do ano que vem", diz.
Uma análise técnica divulgada pelo Banco Central a pedido do senador Omar Aziz (PSD-AM) mostrou que beneficiários do Bolsa Família gastaram R$ 3 bilhões em apostas online em agosto deste ano. O estudo, vale ressaltar, tem lacunas, ressaltadas pelo próprio BC.
Um levantamento contrato pelo setor de apostas, por sua vez, apontou que o valor gasto pelo beneficiários do programa social foi de apenas R$ 210 milhões no mesmo período.
Sobre o futuro do setor, Maschio enxerga uma concorrência difícil quando os grandes bancos brasileiros, como Itaú, Bradesco e Banco do Brasil, entrarem de vez no mercado. Hoje, a Qesh atende cerca de 10% das casas de apostas que solicitaram autorização para operar no Brasil.
“O que pesa contra nós é que eles têm estrutura para manter custos baixos e oferecer a operação sem muitos intermediários, o que significa menor custo e maior competitividade para as casas de aposta. Quando os grandes bancos ativarem suas operações diretas com apostas, o custo de uma operação de Pix para essas casas será muito menor ”, diz.
Para enfrentar o cenário, Maschio aposta em diversificar a atuação da empresa, que também atende varejo e agronegócio. Segundo ele, o foco será expandir soluções no agronegócio e em serviços de emissão de cartão e crédito para empresas, como cartões de benefício white-label.
“Sabemos que a operação em apostas será desafiadora com o tempo, especialmente com a entrada dos grandes bancos, mas estamos diversificando para acompanhar a mudança do mercado”, afirma.
Diferentemente de seu concorrente, João Gabriel Mendonça Franco, CEO da Paag, vê que, embora interessados, os bancos não conhecem as particularidades do setor.
“Os bancos estão interessados, mas o setor de apostas é muito específico e exige um dinamismo que as instituições tradicionais não conseguem oferecer com a estrutura que têm hoje ”, afirmou Franco.
Para ele, os processos “burocráticos” dos bancos tornarão difícil operar em um mercado que demanda agilidade e resposta rápida, sendo mais provável que os bancos acabem adquirindo fintechs especializadas para ingressar no setor.
Sobre os desafios para o próximo ano, Franco apontou que, além de combater a ludopatia (vício em apostas), o setor enfrenta uma "instabilidade política". Ele se refere à disputa entre estados e União pela competência de regulamentar as apostas, processo que, segundo ele, exigirá adaptação e aprendizado.
“Acredito que, ao longo dos próximos anos, as coisas vão se organizar e teremos uma regulamentação consolidada, adaptada à realidade brasileira”, declarou.
Em linha com as preocupações, o setor foi impactado pela notícia de que o Procurador-Geral da República (PGR), Paulo Gonet, entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando grande parte das normas que regulamentaram os jogos e apostas online no Brasil.
O PGR considera que a legislação é “insuficiente para proteger direitos fundamentais dos consumidores”, alegando que fere direitos à saúde, alimentação, do consumidor, da criança e do adolescente, do idoso e da pessoa com deficiência.
O órgão pede uma liminar (decisão provisória) contra as normas, o que poderia suspender as apostas e jogos online no país.
Na véspera, o ministro do STF, Luiz Fux, afirmou que a Corte deve juglar, no primeiro semestre de 2025, a ação que discute os impactos das apostas online e promete "ajustes" nas regras sobre as bets.