Economia

"Ele cortou primeiro" é álibi de bancos centrais em afrouxamento

Com praticamente todas as principais instituições cortando taxas, a corrida ao fundo do poço corre risco de interferir no impacto da política monetária

Haruhiko Kuroda: em meio à onda de cortes, crescem expectativas de que o presidente do Banco do Japão precisará empurrar a taxa para território ainda mais negativo (Kiyoshi Ota/Bloomberg)

Haruhiko Kuroda: em meio à onda de cortes, crescem expectativas de que o presidente do Banco do Japão precisará empurrar a taxa para território ainda mais negativo (Kiyoshi Ota/Bloomberg)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 6 de outubro de 2019 às 08h00.

Última atualização em 6 de outubro de 2019 às 08h00.

Presidentes de bancos centrais, da Austrália à Índia, apontam o dedo para a onda de afrouxamento monetário global na tentativa de justificar os recentes cortes das taxas de juros.

O presidente do banco central da Austrália, Philip Lowe, alertou colegas reunidos no encontro anual de Jackson Hole em agosto que mais estímulos poderiam elevar os preços dos ativos.

No entanto, esta semana, ele mesmo também reduziu os juros do país para um recorde de baixa. Para justificar a decisão, Lowe disse que o dólar australiano poderia se valorizar caso o banco central não agisse.

Na sexta-feira, o presidente do banco central da Índia, Shaktikanta Das, realizou seu quinto corte seguido das taxas. Seguindo o compromisso do presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, de fazer “o que for preciso”, Das disse que a política monetária permanecerá acomodativa pelo tempo que for necessário para retomar o crescimento. Das também destacou a mudança global em direção ao afrouxamento.

Também aumentam as expectativas de que o presidente do Banco do Japão, Haruhiko Kuroda, precisará empurrar a taxa para território ainda mais negativo - se não por outro motivo, para evitar um fortalecimento prematuro do iene. Quanto à futura presidente do BCE, Christine Lagarde, a perspectiva de um Brexit sem acordo pode dar mais motivos para um afrouxamento ainda maior.

Com praticamente todos os principais bancos centrais do mundo diminuindo as taxas (a China é uma exceção) e justificando os cortes de uns e de outros para agir, a corrida rumo ao fundo do poço corre o risco de interferir no impacto da política monetária.

Certamente, juros mais baixos podem ajudar a estimular a economia se houver demanda suficiente por crédito, e o pagamento de dívidas existentes se torna mais barato, liberando recursos para o consumo. Mas o canal monetário - a desvalorização normalmente esperada se um país cortasse os juros sozinho - é anulado.

“Se todo mundo está afrouxando, não há canal de taxa de câmbio”, disse o próprio presidente do BC da Austrália em junho.

O afrouxamento monetário também encolhe o rendimento dos títulos, o que pode inflacionar os preços dos ativos e ameaçar a estabilidade, os mesmos riscos alertados por Lowe e outros chefes de bancos centrais.

Pelo menos, muitos serão considerados culpados caso a corrida rumo ao fundo do poço termine mal.

Acompanhe tudo sobre:Banco CentralJurosPolítica monetária

Mais de Economia

Em discurso de despedida, Pacheco diz não ter planos de ser ministro de Lula em 2025

Economia com pacote fiscal caiu até R$ 20 bilhões, estima Maílson da Nóbrega

Reforma tributária beneficia indústria, mas exceções e Custo Brasil limitam impacto, avalia o setor

Opinião: nem as SAFs escapam da reforma tributária