"Ebola" suíno afeta cadeia alimentar global
A morte dos porcos é especialmente crítica para a China, cuja indústria suína movimenta US$ 128 bilhões
Ligia Tuon
Publicado em 5 de maio de 2019 às 08h00.
Última atualização em 5 de maio de 2019 às 08h00.
O que começou com algumas dezenas de porcos mortos no nordeste da China agora afeta toda cadeia alimentar global.
A China, que tem metade dos suínos do mundo, identificou a primeira ocorrência da gripe suína africana em agosto de 2018, em uma fazenda com menos de 400 porcos nos arredores de Shenyang. Quarenta e sete suínos morreram devido à doença contagiosa viral, provocando medidas de emergência como o abate em massa e um bloqueio para impedir o transporte de gado. Depois de alguns dias, um aviso do governo declarava que o surto havia sido "efetivamente controlado".
Era tarde demais. A doença já tinha literalmente se tornado viral e se espalhado por centenas de quilômetros com animais doentes, contaminando alimentos, poeira em pneus de caminhões e roupas. Nove meses depois, o contágio se espalhou por todo o país, cruzou fronteiras com a Mongólia, o Vietnã e o Camboja, e deu impulso aos mercados de carnes globalmente.
Enquanto estimativas oficiais indicam 1 milhão de porcos abatidos, os dados de abate sugerem que um número 100 vezes maior será eliminado do rebanho de 440 milhões de suínos da China em 2019, o "ano do porco" do zodíaco chinês.
O Departamento de Agricultura dos EUA projetou em abril uma redução de 134 milhões de cabeças - equivalente a toda a produção anual de suínos nos Estados Unidos - e a pior queda desde que o departamento começou coletar os dados do segmento na China em meados da década de 1970.
"É uma situação sem precedentes", disse Arlan Suderman, economista-chefe da INTL FCStone, que analisa os mercados de commodities há quase quatro décadas. "Isso vai impactar os preços dos alimentos globalmente."
O surto da febre suína africana que se espalha pela Ásia é inegavelmente preocupante, matando praticamente todos os porcos que infecta com uma doença hemorrágica que lembra o ebola em humanos. Não há dados sobre infecção de humanos.
A morte dos porcos é especialmente crítica para a China, cuja indústria suína movimenta US$ 128 bilhões, com o terceiro maior consumo per capita do mundo.
O rebanho de porcos da China pode diminuir em até 30%, disse Juan R. Luciano, presidente da Archer-Daniels-Midland, umas das maiores tradings de commodities agrícolas.
“A China precisará claramente importar quantidades substanciais de carne de porco e, provavelmente, outros tipos de carne e aves para atender a demanda”, disse Luciano a analistas em uma teleconferência em 26 de abril. As compras chinesas de carne também podem impulsionar as vendas de farelo de soja, uma fonte de ração animal, da América do Norte, Brasil e Europa, disse.
Os preços da carne suína na China no atacado mostram alta de 21% na comparação anual, e também subiram nos EUA e na União Europeia depois que os processadores enviaram mais produtos para a China. O preço do bacon na Espanha aumentou cerca de 20% em março, enquanto o da carne de porco subiu 17% na Alemanha, segundo a Interporc, uma associação industrial com sede em Madri.
O rali também impulsiona outros mercados de carnes. As exportações de carne bovina da Austrália para a China aumentaram 67% no primeiro trimestre. No Brasil, as ações de frigoríficos como JBS e Minerva subiram em meio ao otimismo de vendas mais fortes para o mercado chinês.