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E o Brasil, como é que fica?

A economia vai sentir o baque, mas pode não ser tão forte

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h29.

  • Veja especial sobre o conflito

    Desde dezembro de 1994, com a turbulência que se seguiu à desvalorização do peso mexicano, o Brasil tem enfrentado quase anualmente complicações no front externo. Foi assim com as crises asiática, russa e argentina e com três eventos ocorridos em solo americano: o crash das ações de empresas ponto-com, a derrubada das torres gêmeas do World Trade Center e a descoberta de megafraudes nos balanços de grandes corporações. Em todos os casos, a economia brasileira saiu arranhada, e o crescimento, comprometido. O que se pergunta agora é se a crise no Iraque representará mais um obstáculo no caminho do Brasil -- logo agora que o governo Lula começa a colher os primeiros resultados econômicos positivos das duras medidas tomadas desde a posse, em janeiro.

    Por enquanto, é difícil fazer qualquer afirmação com dose maior de certeza. Por um lado, o mundo inteiro deverá sentir o efeito negativo do conflito -- e o Brasil não será exceção. Por outro, a economia brasileira está distante da confusão, tem relativamente pouca interação com os países do Oriente Médio e deve ficar longe dos holofotes (em momentos como este, quanto menos aparecer, melhor). Portanto, é provável que uma guerra traga desdobramentos contraditórios.

    Um primeiro efeito possível se dará sobre os fluxos financeiros. "A guerra provoca aversão ao risco, reduzindo o fluxo de capitais para os mercados emergentes", diz Alexandre Bassoli, economista-chefe do HSBC. É claro que, entre os países emergentes, Rússia ou Turquia têm muito mais com que se preocupar pelo simples fato de estar geograficamente próximos do Iraque. A favor do país, conta também a própria evolução econômica recente. "O Brasil vem reduzindo drasticamente sua dependência em relação ao capital externo", diz Oswaldo de Assis, sócio do banco Pactual. Mas, em um cenário extremo de fuga de dinheiro para os países centrais -- hipótese ainda distante --, a economia brasileira não ficaria ilesa. O dólar e a inflação subiriam, e o governo teria de voltar a adotar medidas difíceis para manter a estabilidade.

    O preço do petróleo é outro elemento importante no cenário futuro. O Brasil produz quase 90% do que consome, o que faz com que a alta de preço seja minimizada. Importar os 10% que ainda não são produzidos no Brasil não é lá tão difícil, mesmo num ambiente de preços nas alturas. O problema é que, por uma decisão do governo, o que os brasileiros pagam pela gasolina acaba seguindo de perto a cotação internacional. Em momentos de petróleo caro, tal regra traz uma pressão inflacionária. Foi o que se viu nos últimos meses (veja gráfico na pág. 28). Logo após o anúncio do ultimato ao ditador Saddam Hussein, no entanto, a cotação do petróleo caiu. Se o preço continuar nos patamares atuais, não haverá necessidade de novos reajustes de preço nos postos -- uma notícia e tanto para a equipe econômica do ministro Palocci. Se o petróleo subir novamente, o cenário de inflação voltará a se complicar.

    Outro problema potencial está no comércio internacional. Por enquanto, as empresas brasileiras ainda não trabalham com a hipótese de exportações em queda. O grosso das vendas brasileiras destina-se a países longe do epicentro da crise. "Vendemos principalmente para China, Japão, Coréia e Europa, mercados que não deverão ser muito afetados", diz Fábio Barbosa, diretor financeiro da Vale do Rio Doce. "Apenas 5% de nossas vendas vão para o Oriente Médio", diz Julio Cardoso, presidente da Seara Alimentos, uma das maiores exportadoras de aves e suínos.

    Mesmo entre as empresas que têm negócios com os países árabes, nem todos estão pessimistas. "Os conflitos anteriores na região nunca chegaram a alterar nossas vendas por ali", diz Nildemar Secches, presidente da Perdigão, uma das maiores empresas brasileiras do setor de alimentos. Secches continua a acreditar em vendas maiores em 2003. "Nunca interrompemos o fluxo de nossas exportações para aquela região, mesmo com a guerra entre Irã e Iraque, a invasão do Kuwait, a Guerra do Golfo e a recente invasão do Afeganistão", diz José Augusto Lima de Sá, presidente da Doux Frangosul, subsidiária brasileira da francesa Doux e terceira maior produtora e exportadora de aves no Brasil.

    O problema, portanto, não é tanto uma queda das vendas para o Oriente Médio, região que não pesa muito na balança de comércio. Mas a situação pode ficar muito complicada na hipótese de a guerra empurrar as economias centrais para uma recessão. "Um cenário desses inibiria o crescimento das exportações", diz o sociólogo Marco Aurélio Garcia, assessor especial do presidente Lula para assuntos internacionais.

    A conclusão é que a guerra deverá ter impactos negativos para o Brasil, mas ainda não dá para saber qual a intensidade. "É ilusão achar que o conflito será positivo, mas tudo vai depender de quanto tempo vai durar", diz Otaviano Canuto, secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda. A boa notícia é que o país está bem mais forte hoje do que estava até bem pouco tempo atrás. Contam a favor do país a fantástica melhora nas contas externas, o acordo com o FMI e o conseqüente aporte de dinheiro e, acima de tudo, a postura madura com que o governo Lula tem tratado os temas econômicos, em claro contraste com o discurso do passado. Tudo isso tem ajudado na reavaliação que os mercados financeiros estão fazendo do Brasil. A guerra, portanto, chega num momento em que a nota atribuída ao país está melhorando. O risco Brasil estava em 1 051 pontos no dia 18 de março, após ter experimentado um pico de 2 390 pontos em julho do ano passado -- e ainda há espaço para que caia mais. "Ajudaria muito o país se o presidente Lula aproveitasse o momento internacional difícil para avançar sua agenda no Congresso Nacional", diz o economista Eduardo Giannetti.

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