Economia

Cumprir arcabouço exigiria aumento de até 2,3 p.p. do PIB na carga tributária, estima BTG

Sem a elevação da carga, dívida bruta pode superar 100% do PIB na próxima década mesmo com os gatilhos atuais do arcabouço

Carolina Riveira
Carolina Riveira

Repórter de Economia e Mundo

Publicado em 4 de maio de 2023 às 16h04.

Última atualização em 4 de maio de 2023 às 16h25.

O cumprimento da meta de resultado primário proposta pelo governo no arcabouço fiscal demandaria, para os próximos três anos, uma elevação da carga tributária entre 1,8 p.p. e 2,3 p.p. do produto interno bruto (PIB), segundo projeção de analistas do BTG Pactual.

A variação dependeria do nível de despesa de 2024, de acordo com relatório assinado por Fabio Serrano, do BTG (do mesmo grupo de controle da EXAME).

O texto do arcabouço prevê como meta zerar o déficit primário a partir de 2024 e estabilizar a dívida pública progressivamente a partir de 2026, quando haveria superávit de 1%.

  • Se houvesse essa elevação na carga, a dívida pública se estabilizaria no fim desta década entre 80% e 85% do PIB.
  • Já sem aumento de impostos, dentro do novo arcabouço, a dívida bruta seguiria subindo ao longo dos próximos anos e ficaria acima de 100% do PIB em 2035.

Isso ocorreria mesmo se acionado o gatilho que limita despesas a 50% da variação do ano anterior.

Estimativa do BTG Pactual para dívida bruta nos diferentes cenários de cumprimento do arcabouço (BTG Pactual/Reprodução)

Isto é, se não houver elevação da carga, a estabilização da dívida não será atingida mesmo se cumpridas as restrições impostas no texto do arcabouço — algo que o mercado vem questionando, dada a falta de punição prevista a governos que não cumprirem as restrições.

No relatório, analistas apontam que as projeções do governo para aumento de arrecadação sem elevação da carga podem não se concretizar.

“Os números oficiais para as medidas de arrecadação parecem estar superestimados e podem enfrentar resistência política e risco de judicialização”, escreveu Serrano.

Desafios de arrecadação

Outro estudo, do Núcleo de Política Econômica e do Observatório de Política Fiscal do FGV/Ibre, projetou no início de abril que um aumento de 1,3 p.p. do PIB na arrecadação seria necessário para cumprir as metas no arcabouço, segundo cálculos do economista Manoel Pires. O desafio para chegar lá, porém, é garantir o avanço da arrecadação -- estratégia adotada pelo governo.

Dentre as propostas da Fazenda estão temas como tributação de apostas online, imposto cobrado sobre recursos fora do país (em offshore) e revisão de benefícios fiscais.

Pela estimativa oficial, o conjunto de medidas poderia arrecadar entre R$ 132 bilhões e R$ 151 bilhões. O relatório do BTG trabalha com estimativa de R$ 39 bilhões para o governo federal.

Uma das principais dúvidas é a inclusão de benefício de ICMS (concedido pelos estados a empresas com isenção fiscal) na base de cobrança do IRPJ/CSLL (tributo federal sobre o lucro).

Com a inclusão do benefício estadual na base que é tributada pelo governo federal, o governo espera arrecadar entre R$ 85 bilhões e R$ 90 bilhões, a maior parte do ajuste via arrecadação aventado. O BTG estima valor menor, de R$ 31 bilhões para o setor público como um todo e, desse total, R$ 19 milhões nos cofres do governo federal.

Possibilidades de arrecadação aventadas pelo governo (BTG Pactual)

“A inclusão de benefícios do ICMS na base de cálculo do IRPJ e CSLL representa mais da metade das receitas geradas pelas medidas em análise, e enfrentará resistência política e risco de judicialização”, escreve Serrano, do BTG.

O analista aponta ainda que a redução de benefícios fiscais federais já foi tentada e não obteve sucesso. Os benefícios fiscais em âmbito federal superam R$ 450 bilhões em 2023, como a EXAME mostrou, incluindo frentes como Simples, dedução de Imposto de Renda e Zona Franca de Manaus.

Dúvida sobre o superávit necessário

O patamar do juro real e crescimento do PIB também trazem desafios para se cumprir as projeções. O superávit de 1% do PIB, que o Tesouro estima ser suficiente para estabilizar a dívida bruta, pode não ser o bastante em alguns cenários.

O Tesouro, ao que tudo indica, trabalha com cenário visto como otimista por alguns agentes de mercado, de 3,5% ou 4% de juro real — baixar o patamar de juro real, hoje em torno de 7%, exigiria um movimento combinado de redução na taxa Selic e contenção da inflação.

Pelos cálculos do BTG, um crescimento de 2% do PIB e juro real de 5% exigiriam um resultado primário de 2% do PIB para estabilizar a dívida.

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