Crise pode causar década perdida no mercado de trabalho das cidades
Educação e Saúde continuaram evoluindo durante a crise, mas com ritmo mais lento da década; já Emprego e Renda só voltarão em 2027 para nível de 2013
João Pedro Caleiro
Publicado em 28 de junho de 2018 às 17h01.
Última atualização em 28 de junho de 2018 às 20h10.
São Paulo – Com quase 3 milhões de postos de trabalho formais perdidos entre 2015 e 2016, a recessão foi um massacre para os municípios brasileiros .
É o que mostra o Índice FIRJAN de Desenvolvimento Municipal divulgado nesta quinta-feira (28) com dados de 5.471 municípios onde vivem 99,5% da população brasileira.
A série histórica já completa uma década, com resultados divididos em três áreas (Emprego e Renda, Educação e Saúde) e baseados em dados oficiais dos respectivos ministérios (Trabalho, Educação e Saúde).
Os índices de Educação e Saúde continuaram evoluindo mesmo durante a crise econômica, apesar do ritmo atual de melhora ser o mais fraco dos últimos 10 anos.
Em 2014 e 2015, o fator Emprego e Renda foi tão mal que conseguiu, sozinho, derrubar a nota geral. Em 2016, a recuperação da massa salarial mesmo diante do alto desemprego permitiu que a nota voltasse a subir.
A desigualdade regional continua extrema. Dos 500 municípios com melhor nota, 50% são do Sudeste e 41% do Sul. Nos 500 municípios com pior nota, dominam o Nordeste (68%) e o Norte (28%).
“É aquela coisa de que o rico cada vez fica mais rico e o pobre cada vez fica mais pobre. Isso mudou muito pouco nos últimos 10 anos”, diz Jonathas Goulart Costa, coordenador de estudos econômicos da FIRJAN.
Educação e Saúde
Os especialistas da FIRJAN notam que no caso da Educação, a influência da crise fiscal foi baixa pois os dados utilizados são focados em ensino fundamental.
Esta área é financiada em boa parte via Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) e Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério).
Estas fontes, constantes e relacionadas ao número de atendimentos, são mais uma evidência da enorme dependência do governo federal: 80% dos municípios não controlam nem 15% de todas as suas receitas.
Os dados também mostram que ainda estão distantes os objetivos do Plano Nacional de Educação (PNE). No ritmo atual, por exemplo, a meta de universalizar a educação infantil na pré-escola, prometida para 2016, só será cumprida em 2035.
Das variáveis em saúde, a que mais exige atenção é o atendimento pré-natal para gestantes: um terço delas, ou um milhão de mulheres, não tiveram a quantidade mínima de consultas recomendada pelo Ministério da Saúde.
Mas também chama a atenção a alta taxa de óbitos infantis por causas evitáveis: em 2016, mais de 27 mil crianças morreram por fatores que poderiam ter sido evitados por serviços de saúde.
Emprego e Renda
No caso de Emprego e Renda, o declínio da nota brasileira começa em 2013 e é interrompido em 2015.
Apesar de 2016 ter sido em muitos sentidos o auge da crise, repetindo a queda de 3,5% do PIB (Produto Interno Bruto) do ano anterior, para o Índice da FIRJAN ele já aparece como um ano de leve recuperação.
60% das cidades continuaram fechando vagas, incluindo todas as capitais, mas a melhora na massa salarial foi o que compensou: 4 mil municípios tiveram alta na renda média do trabalhador.
"O movimento é explicado pelo aumento no rendimento real do trabalhador formal, em parte por conta da política de reajuste do salário mínimo", diz a nota da FIRJAN para a imprensa.
Quem já estava empregado ganhou mais, mas o salário obrigatório mais alto pode gerar o ônus de tornar menos vantajoso para o empregador contratar novos funcionários.
“Em 2016 o reajuste dos salários foi acima do que a economia estava suportando. E se aumenta o preço, precisa ajustar na quantidade. Você tenta resolver o problema e acaba gerando outros”, diz Jonathas.
Vale lembrar também que especialmente em pequenas cidades do interior, grande parte dos empregos é ligada ao setor público e por isso menos vulnerável ao ciclo econômico.
A partir de agora, mesmo se o índice de Emprego e Renda crescer no mesmo ritmo médio do período entre 2009 e 2012, que era de 1,5% ao ano, só voltaremos ao nível de 2013 em um longínquo 2027.
"Isso aponta que a recessão custou mais de uma década de desenvolvimento para o mercado de trabalho formal dos municípios", diz a nota.
Destaques
Nos 8 anos entre 2006 para 2013, a categoria “desenvolvimento alto e moderado” em Emprego e Renda ganhou 103 municípios brasileiros.
Nos 3 anos seguintes, entre 2013 e 2016, a categoria perdeu 936 municípios – quase 10 vezes mais.
Hoje, apenas 5 municípios brasileiros tem desenvolvimento alto em Emprego e Renda: São Bento do Norte (RN), Capanema (PR), Telêmaco Borba (PR), Selvíria (MS) e Cristalina (GO).
O grande destaque negativo foi o Rio de Janeiro. O estado tinha 15 cidades com alto desenvolvimento na categoria geral e hoje tem apenas duas.
Já a cidade do Rio caiu da 5ª para a 11ª no ranking geral das capitais, puxada em grande parte pela piora no item Emprego e Renda.
"Niterói e outros municípios muito ligados à indústria de óleo e gás sofreram bastante, mas o principal fator na capital foi a construção civil. Teve muita obra de infraestrutura para Copa e Olimpíadas e quando isso acabou os empregos não permaneceram”, diz Jonathas.