O economista Roberto Macedo (--- [])
Da Redação
Publicado em 11 de setembro de 2009 às 10h00.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou nesta sexta-feira que o PIB (soma das riquezas produzidas por um país) registrou crescimento de 1,9% no segundo trimestre em relação aos três meses anteriores. Considerado o tamanho da crise que abalroou a economia mundial nos meses anteriores, este é, sem dúvida, um motivo para comemoração. O vice-presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Roberto Macedo, afirma, no entanto, que ainda é cedo para afirmar que o Brasil saiu da crise. Economista com passagens pelo Ministério da Fazenda, BNDES, BID, Banco Mundial, Fipe e Ipea, Macedo diz que a indústria e a agropecuária ainda trabalham em patamares bem inferiores ao período pré-crise, explica onde estão os gargalos da economia e dá sugestões para o país dar um novo salto. Leia a seguir os principais pontos da entrevista:
Portal EXAME - A velocidade com que a economia brasileira saiu da crise surpreendeu?
Roberto Macedo - O Brasil ainda não saiu da crise. O PIB cresceu no segundo trimestre, mas havia caído 0,8% nos três primeiros meses do ano e 3,6% no quarto trimestre do ano passado. Então o setor produtivo ainda opera bem abaixo do patamar pré-crise. Economistas criaram o consenso de que recessão é quando o PIB de um país cai por dois trimestres consecutivos. Por esse conceito, realmente saímos da recessão. Mas essa não é a melhor forma de enxergar a situação atual. A recessão causada por essa crise pode ser comparada à queda em um buraco. O Brasil chegou no fundo no primeiro trimestre e agora se encontra escalando esse buraco pelas beiradas. O país vai sair de lá em breve, mas isso ainda não aconteceu.
Portal EXAME - Que setores apresentam maior dificuldade para reagir?
Macedo - Há dois motores da economia brasileira que ainda não estão funcionando direito. O primeiro é o das exportações [que caíram 11,4% no segundo trimestre]. As vendas ao exterior foram bastante prejudicadas durante a crise, principalmente aquelas destinadas a clientes de países desenvolvidos. A crise paralisou essas economias e é óbvio que os fornecedores desses países seriam prejudicados. Apesar da recente melhora na Europa, nos Estados Unidos e até mesmo no Japão, acredito que as empresas que exportam para esses mercados devem continuar sem motivos para comemorar até o final do próximo ano. Já as empresas que exportam para outros mercados começam a dar sinais mais claros de retomada.
Portal EXAME - O Brasil é uma economia relativamente fechada. A pujança do mercado interno não é capaz de compensar a queda das exportações?
Macedo - O problema é que tem outro motor interno da economia que ainda engasga: o dos investimentos. Com a crise, a taxa de investimento do Brasil caiu de cerca de 19% para 16% do PIB. O investimento público no Brasil deveria servir de indutor para o investimento privado, mas isso não acontece. Veja a China. Eles investem cerca de 40% do PIB. Veio a crise e a economia chinesa vai crescer 8%, ao invés dos 10% dos anos anteriores. Na Índia foi parecido. Eles investem 30% do PIB e vão crescer 6% neste ano, ao invés de 8%. Já o Brasil sairá de um crescimento de 5% em 2008 para algo próximo a zero neste ano. Foi uma freada muito forte. Temos que investir pelo menos 25% do PIB para evitar esse tipo de solavanco. (Continua)
Portal EXAME - O Banco Central derrubou os juros básicos da economia para 8,75% ao ano, a menor taxa da história. Isso não vai incentivar os investimentos?
Macedo - Os juros deveriam ser ainda menores. Não podemos nos contentar com essa taxa, que ainda é uma das mais altas do mundo. O problema é que o governo gasta demais e não reduz a dívida pública. Eu sou favorável àquela ideia do Delfim Netto e do Antonio Palocci [ex-ministros da Fazenda] de déficit zero. Acho que o governo não deveria gastar mais do que arrecada, incluindo nessa conta as despesas com juros. O problema de gastar demais é que o mercado não sabe se o país terá dinheiro suficiente para pagar sua dívida, e os juros não caem como deveriam. Além disso, o governo gasta errado, contrata funcionários públicos demais. Não são gastos que levam ao crescimento.
Portal EXAME - Que outras medidas poderiam ajudar o país a investir mais?
Macedo - Acredito que os tributos estão muito centralizados no governo federal. Uma vez me disseram que uma mesma obra custa menos se for custeada por um município do que por um estado. E também custa menos se for paga por um estado do que pela União. Isso faz todo o sentido. O governo municipal tem recursos escassos, não pode desperdiçar. E está próximo da obra, fica fácil de fiscalizar. Já a União está distante e tem muitos recursos. Todo mundo quer se aproveitar dessa fartura de recursos da União. Além disso, o governo federal está distante da obra, não percebe quando há desperdício.
Portal EXAME - Isso basta para elevar os investimentos?
Macedo - Não. Outro problema é o das licenças ambientais. Há empresas dispostas a investir bilhões de reais em uma hidrelétrica, por exemplo, e o governo fica preocupado com o bem-estar dos bagres do rio. A concessão de licenças deve ser mais rápida e observar os interesses do país. O Brasil também precisa de uma reforma da Previdência que comece a tornar a aposentadoria dos funcionários públicos e privados semelhante. Não faz sentido termos funcionários públicos que se aposentam com salário integral. Começando pelos servidores que serão contratados, temos que tentar a igualar as regras para os dois regimes de previdência.