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João Pedro Caleiro
Publicado em 4 de agosto de 2014 às 10h15.
São Paulo - Quase 200 palestinos já morreram na faixa de Gaza nos últimos 8 dias de ofensiva israelense, mas a violência não é a única preocupação dos moradores de um dos lugares mais isolados economicamente do mundo.
O pedacinho de 40 quilômetros de extensão espremido entre o Mar Mediterrâneo e o resto do Oriente Médio, que já estava sujeito a uma série de controles há décadas, está bloqueado por mar e terra por Israel desde 2007.
A atitude foi uma reação à tomada do governo da faixa pelo Hamas - que é, ao mesmo tempo, partido político, entidade filantrópica e organização armada, e não reconhece o direito de existência de Israel.
O Hamas venceu eleições em 2006 e conquistou o controle definitivo de Gaza em 2007 após uma disputa com o Fatah, do presidente Mahmoud Abbas, que conta com o apoio do Ocidente e governa a Cisjordânia, o outro território palestino.
Consequências
A razão para o bloqueio foi impedir o abastecimento de armas para o Hamas. Como efeito colateral, acabou asfixiando ainda mais a já frágil economia de Gaza.
Seus 1,8 milhão de habitantes produzem apenas uma pequena fração do que precisam, então dependem de bens importados que só podem chegar ao seu território de duas maneiras oficiais: pela fronteira com o Egito em Rafah e pelas passagens com Israel.
Entre 2007 e 2010, só era permitida a entrada de bens considerados "essenciais" e em quantidades calculadas. Cimento, de possível uso militar, foi banido - o que matou a indústria da construção civil, a maior fonte de crescimento no território. As exportações também foram restritas.
Foi neste cenário que os túneis clandestinos criados e controlados pelo Hamas para contrabandear armamentos passaram a ser importantes passagens também para combustível, animais, carros e todo tipo de produto.
Em 2010, o bloqueio foi relaxado e a economia da faixa conseguiu crescer 15% no ano seguinte. Só que os conflitos continuaram, e no ano passado foram os túneis que passaram a se tornar alvos - dessa vez, do Egito.
A queda de Hosni Mubarak e ascensão da Irmandade Muçulmana haviam sido vistas como uma janela de oportunidade pelo Hamas, que se afastou de antigos aliados como Síria, Irã e o Hezbollah, do Líbano, para focar na colaboração com um Egito em ebulição.
Só que a esperança durou pouco e a estratégia saiu pela culatra. Quando os militares egípcios deram o golpe e voltaram ao poder um ano atrás, trataram de acabar com os túneis - até março deste ano, foram 1.370 destruídos, segundo o exército.
Agora, apenas uma pequena parte da demanda por combustível é atendida, e com preços muito maiores do que antes, o que significa longos blecautes de até 16 horas por dia.
O governo, que taxava os bens contrabandeados nos túneis, acabou perdendo uma parcela enorme de sua receita. 4 em cada 10 empregos existentes são no setor público, e os salários estão reduzidos e atrasados há meses.
O desemprego está em 40% e 80% das famílias dependiam de ajuda humanitária para sobreviver já em novembro passado, de acordo com a Oxfam. A assistência internacional é uma das maiores fontes de recursos para a Palestina, mas seu fluxo é inconstante e gera dependência.
É neste cenário que começou o novo conflito - e é difícil encontrar alguma razão para esperança no futuro próximo:
"A persistência de restrições israelenses para as exportações de Gaza e o controle da importação de insumos do investimento privado continuam a minar as perspectivas de crescimento de médio prazo", segundo um relatório do FMI, que prevê um crescimento de apenas 3% nos próximos anos - praticamente nulo, considerando que a população cresce em um ritmo parecido.