Economia

Às vésperas de entrega ao Congresso, arcabouço fiscal ainda divide opiniões entre economistas

Texto que propõe novas regras fiscais está previsto para ser enviado para apreciação de parlamentares nesta segunda

Congresso Nacional: texto deverá ser entregue nesta segunda (EBC/Reprodução)

Congresso Nacional: texto deverá ser entregue nesta segunda (EBC/Reprodução)

Estadão Conteúdo
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Agência de notícias

Publicado em 16 de abril de 2023 às 09h37.

Última atualização em 16 de abril de 2023 às 09h41.

O duelo é de titãs. Após 15 dias do anúncio do desenho do novo arcabouço fiscal e à espera dos detalhes do texto final do projeto - que será encaminhado amanhã ao Congresso -, economistas e especialistas em contas públicas estão divididos sobre a qualidade da nova regra de controle das contas públicas.

No grupo dos que receberam bem a proposta estão o Fundo Monetário Nacional (FMI); o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto; o banqueiro Luiz Carlos Trabuco Cappi, presidente do conselho de administração do Bradesco; o ex-secretário de Fazenda do Estado de São Paulo Felipe Salto; e o coordenador do Observatório Fiscal da FGV, Manoel Pires.

Na mesma linha do presidente do BC, que avaliou o arcabouço como "superpositivo", Nigel Chalk, diretor-adjunto do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI, elogiou o projeto: "Estamos bem impressionados com o ajuste fiscal proposto para o médio prazo, no sentido de aumentar o resultado primário. Isso permitirá um bom equilíbrio". Trabuco disse que as regras oferecem um avanço ao País ao combinar criatividade, flexibilidade e simplicidade.

No grupo dos economistas com as críticas mais ácidas estão Affonso Celso Pastore (ex-presidente do BC), Carlos Kawall (ex-secretário do Tesouro, hoje na Oriz Partners), Marcos Lisboa (ex-secretário de Política Econômica e sócio da Gibraltar Consultoria), Marcos Mendes (pesquisador associado do Insper), Elena Landau (coordenadora do programa econômico da então presidenciável Simone Tebet) e Rogério Werneck (professor da PUC).

Lisboa e Mendes fizeram simulações e escreveram um artigo em conjunto, logo após o anúncio do arcabouço, no qual apontam que a proposta apresentada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad está baseada em parâmetros inconsistentes. "A receita vai ter de estar lá em 2026, em valores de hoje, uns R$ 380 bilhões acima do que é atualmente. São 2,7 pontos porcentuais a mais em termos de PIB", disse ao Estadão. Mendes contou que segue fazendo simulações com a equipe e aguarda a divulgação do texto.

Pastore avaliou que a equação do novo arcabouço só fecha com "aumento brutal de carga tributária". Werneck também foi duro: "A verdade é que não há como enxergar na proposta de arcabouço fiscal algo que, mesmo remotamente, possa ser associado à ideia de ajuste fiscal."

Kawall questionou, em artigo publicado no Estadão/Broadcast: "Se a regra por si só não garante a sustentabilidade da dívida pública, a qual virá com a elevação das receitas, via redução de jabutis tributários ou qualquer outra medida de aumento de arrecadação, qual é então o papel disciplinador da regra?"

Cautela

Há também o grupo dos cautelosos, que aguardam a linha fina dos detalhes do texto. Entre eles, o experiente José Roberto Mendonça de Barros, que foi da equipe econômica de FHC. "Finalmente, chegou a proposta de arcabouço fiscal. Antes de tudo, ela significa que o governo poderá ter um rumo que busque conciliar sustentabilidade e melhoria social. E não uma guerra de posições que apenas resulte na aceleração do processo inflacionário e em estagnação."

Com larga experiência na gestão das contas públicas, a dupla de ex-secretários do Tesouro Ana Paula Vescovi (diretora do Santander) e Jeferson Bittencourt (ASA Investments) fez alertas sobre a dificuldade de cumprimento das metas fiscais e a dependência da regra ao crescimento da arrecadação, com medidas ainda não anunciadas.

"Quem já passou pelo governo e administrou Fiscos federal, estaduais ou municipais sabe que é muito difícil você, em um ciclo de desaceleração econômica, conseguir aprovar medidas, ainda que sejam para aparar arestas do sistema tributário", disse Vescovi ao Estadão/Broadcast. Já Bittencourt avaliou que vincular o crescimento das despesas ao aumento das receitas dificulta o ajuste.

Outro renomado especialista em contas públicas, Fabio Giambiagi, fez contas que mostram "tudo para cima": gasto, receita e resultado. "O arcabouço fiscal é a banda diagonal endógena de Fernando Haddad. De qualquer forma, ele merece ser apoiado, porque ele será bombardeado pelos tonton macoutes, quando perceberem o que a regra implica para 2024", ironizou.

Piso de despesas

Giambiagi não diz, mas sua fala é uma referência indireta ao valor que a nova âncora vai permitir aumentar de gasto em 2024, no primeiro ano da sua vigência. A depender do comportamento da regra, ela pode ficar mais próxima do piso de 0,6% acima da inflação previsto no arcabouço. Um "mau começo", na visão dos petistas - o que pode provocar uma alta rejeição entre seus parlamentares.

O governo mudou, inclusive, o cálculo de referência da receita que servirá de base para definir o crescimento da despesa. Vai abater da receita a arrecadação com royalties, concessões e dividendos, na tentativa de um cenário mais favorável.

No partido do presidente Lula, as críticas têm aumentado. Lideranças veem a regra de Haddad como um "novo teto de gastos". O ministro e sua equipe saíram em defesa da regra numa mobilização junto às lideranças do Congresso, empresários, investidores internacionais e nacionais. Em meio a esse trabalho e aos problemas de comunicação com as medidas tributárias para garantir R$ 150 bilhões de receitas - e sustentar a trajetória de metas fiscais e a volta do superávit -, a equipe econômica viu a Bolsa ter a melhor semana do ano e o dólar fechar abaixo de R$5.

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