ARMÍNIO FRAGA: “Não podemos continuar com 30 partidos. Não há foco” / Exame.com
Da Redação
Publicado em 8 de abril de 2017 às 08h36.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h38.
Paula Rothman, de Cambridge
“O que deu errado com o Brasil?” Foi com essa pergunta que Larry Summers, ex-secretário do Tesouro Americano, começou sua entrevista com o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga na sexta-feira 7 de Abril.
A conversa era um dos momentos mais aguardados do primeiro dia da MIT-Harvard Brazil Conference, evento organizado nos Estados Unidos por alunos brasileiros de duas das melhores instituições de ensino do mundo – o Massachusetts Institute of Technology e a Universidade Harvard.
Mais de 400 participantes lotaram o salão do hotel Marriot, em Cambridge, cidade vizinha a Boston, para assistir à conversa. A plateia incluía nomes de peso do cenário político e econômico atual, como o empresário Jorge Paulo Lemann, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad e o ex-Senador e o atual Vereador por São Paulo, Eduardo Suplicy.
Summers e Fraga, que se conhecem há mais de 25 anos, discutiram a atual situação do Brasil em clima descontraído. “Tenho essa sensação de déjavu”, disse Summers, relembrando os vários momentos históricos em que o país deu sinais de crescimento para depois mergulhar em graves crises. Ele pediu a Fraga que ajudasse um estrangeiro a entender o que havia acontecido desta vez.
Erros e acertos da era PT
“O presidente Lula surpreendeu a todos quando assumiu e jogou fora o programa do PT – aterrorizante para qualquer um que se tenha se dado ao trabalho de lê-lo,” disse Fraga. “Ele turbinou as políticas sociais e manteve a disciplina macroeconômica.” Os problemas teriam demorado para aparecer graças ao bom momento da economia global, mas a situação mudou nos primeiros anos do governo Dilma. “Os preços das commodities caíram e ela continuou insistindo nas apostas erradas até chegar à situação extrema que vimos no ano da reeleição. Houve uma perda total de disciplina fiscal. O modelo chamado de Nova Matriz Econômica, com subsídios amplos, incentivos fiscais, proteção à competição externa… Isso não funciona.”
Fraga mencionou ainda a corrupção – “que não foi inventada hoje” – como um dos fatores que nos levaram à atual situação. “Os problemas que estamos enfrentando agora são mais profundos porque o estado foi capturado por diferentes grupos com os mais diversos interesses – não foi apenas o governo ou uma coalisão no poder. O governo e o iniciativa privada se aproveitaram e se uniram nesse modelo antigo e falido. Os resultados estão aí,’” disse. “Estamos no meio de uma recessão.”
“Se você fosse presidente do Brasil, o mundo seria um lugar melhor”, disse Summers, rindo, ao final da resposta. O comentário foi ovacionado pela plateia – composta, em sua maioria, por estudantes e empresários brasileiros – e seguido de mais uma pergunta: quais seriam os passos mais importantes para colocar o país na rota de crescimento de novo?
Como sair do poço
O primeiro passo listado por Fraga seria a reforma política. “Não podemos continuar com 30 partidos. Não há foco,” disse. Ele também mencionou outras mudanças no sistema, como testar o voto distrital misto – que funciona em países como a Alemanha. O economista, no entanto, se mostrou contrário à atual proposta em discussão no Congresso de listas partidárias fechadas. “Acho que é um modelo inadequado. Ele tira das pessoas o direito de ranquear quem será eleito,” disse.
Em segundo lugar está a saúde fiscal do país. “Temos um sistema excessivamente caro,” disse. “Há um mundo de problemas econômicos ligados à produtividade. Do nosso sistema de impostos às leis de trabalho – há muito o que mudar. Mas eu tendo a ver o copo meio cheio e acredito que, se um governo fosse eleito com essa plataforma, poderia fazer um bom trabalho.”
Ao final da conversa, Larry Summers questionou o brasileiro sobre o que o preocupava no mundo, além da situação econômica do próprio país. “No geral, me preocupo mais com tendências políticas do que com econômicas,” disse Fraga. “A política em muitos países está ficando tensa, com a presença de figuras autoritárias. Isso me assusta. Esse é um mundo perigoso, para além dos perigos financeiros.”