Economia

Arcabouço não estabiliza dívida e Brasil precisa ousar para melhorar fiscal, diz Ana Paula Vescovi

Economista-chefe do Santander afirma que o Brasil precisa de mais reformas estruturantes para mudar o patamar e sair "das cordas que está há 10 anos"

Ana Paula Vesconi: economista-chefe do Santander diz que é preciso mudanças estruturantes (Leandro Fonseca/Exame)

Ana Paula Vesconi: economista-chefe do Santander diz que é preciso mudanças estruturantes (Leandro Fonseca/Exame)

André Martins
André Martins

Repórter de Brasil e Economia

Publicado em 18 de novembro de 2024 às 21h21.

A economista-chefe do Santander, Ana Paula Vescovi, afirmou nesta segunda-feira, 18, que o arcabouço fiscal aprovado pelo governo Lula em 2023 não será suficiente para estabilizar a dívida pública sozinho. Segundo ela, é necessário ousar mais na condução fiscal para criar um ambiente que permita juros mais baixos e sustentáveis no longo prazo.

“Poderíamos ousar mais na política fiscal para dar mais espaço para conviver com juros mais baixos, neutros e naturais. Porque, à medida que temos juros mais altos, um menor número de projetos se viabiliza, e isso gera pressão por mais subsídios e excepcionalidades”, disse a economista durante a live sobre os desafios da política fiscal para 2025, organizada pela Warren Investimentos.

Ela aponta que o Brasil precisa de mais reformas estruturantes para mudar o patamar e sair "das cordas que está há 10 anos".

Ex-secretária do Tesouro Nacional e ex-secretária executiva do Ministério da Fazenda, Vescovi disse que o resultado das eleições municipais deste ano, com a vitória de partidos de centro e centro-direita, sinaliza um desejo da população por mais inovação e oportunidades igualitárias.

“O resultado das urnas neste ano mostrou que a sociedade quer mais dinamismo e inovação, principalmente nas políticas sociais e no empreendedorismo”, afirmou.

Em relação às críticas de suposto exagero do mercado quanto ao quadro fiscal, a economista alertou que o atual cenário, com depreciação cambial e projeções de inflação acima da meta, já afeta a vida da população, especialmente com a alta nos preços de alimentos.

“Não é uma questão teórica que acontece apenas nos mercados. Podem estar exagerando ou não, mas a preocupação deve ser em prevenir que isso atinja as empresas”, destacou Vescovi.

Ela acrescentou que, com a alta da taxa de juros, o receio é de que a deterioração fiscal contamine o setor real da economia, ampliando a perda de confiança e prejudicando tanto pessoas quanto empresas.

“Acho que agora é o momento de frear esse processo de deterioração e impedir que essa perda de confiança que contaminou os mercados chegue ao setor real. Porque já está afetando a vida das pessoas”, disse a economista.

Viabilidade do pacote é um fator importante

Vescovi afirmou ainda que o pacote de gastos, que deve ser anunciado pelo governo nos próximos dias, precisa ser viável do ponto de vista político.

A economista destacou que, como é esperado o envio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), será necessária aprovação de 308 deputados e 48 senadores em dois turnos em cada Casa.

“O Congresso vai ter que analisar e aprovar essas medidas. A viabilidade e factibilidade dessas medidas é um fator importante”, afirmou Vescovi.

Segundo a economista, a expectativa do Santander é de um corte de R$ 70 bilhões, acumulado para 2025 e 2026. Ela acredita que o anúncio do pacote pode ajudar a conter a percepção de risco do mercado, mas ressaltou que é necessário também conter a velocidade de crescimento dos gastos obrigatórios.

“O debate não para por aqui. Óbvio que estamos preocupados com o curto prazo, é um sinal importante, mas não podemos perder de vista o contexto maior, considerando o cenário mundial somando contra os emergentes”, disse.

yt thumbnail

Corte de gastos do governo Lula

O governo Lula está discutindo um pacote de medidas para atingir as metas fiscais e implementar o novo arcabouço fiscal. Nas últimas semanas, a equipe econômica, liderada pelos ministros Fernando Haddad e Simone Tebet, tem se reunido com o presidente e outros ministros para definir estratégias de controle de despesas.

A expectativa, como mostrou a EXAME, é que o pacote seja anunciado após a cúpula do G20. O governo deve enviar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) com mudanças para melhorar o quadro fiscal do país.

A projeção de alguns agentes do mercado, como a Warren e o Santander, é de um pacote de R$ 70 bilhões, contemplando medidas para 2025 e 2026.

Em entrevista à emissora Times Brasil, Haddad afirmou que o pacote está pronto e será anunciado em breve. O ministro declarou ainda que aguarda uma resposta do Ministério da Defesa, que também pode ser impactado pelo pacote de medidas contra o crescimento de gastos.

Acompanhe tudo sobre:Ajuste fiscalMinistério da Fazenda

Mais de Economia

Benefícios tributários deveriam ser incluídos na discussão de corte de despesas, diz Felipe Salto

Um marciano perguntaria por que está se falando em crise, diz Joaquim Levy sobre quadro fiscal

Campos Neto: Piora nas previsões de inflação não é culpa de 'malvados da Faria Lima'

Salário mínimo pode ir a R$ 1.521 em 2025 com nova previsão de inflação