Matéria, radiação e caos: simulação sem precedentes mostra interior de buraco negro (MARK GARLICK/SCIENCE PHOTO LIBRARY/Getty Images)
Redação Exame
Publicado em 22 de dezembro de 2025 às 08h31.
Não é ficção científica — é astrofísica com exascale. Pela primeira vez, cientistas conseguiram simular com precisão realista como a matéria espirala rumo a um buraco negro, liberando quantidades colossais de energia no processo. O feito marca um avanço histórico: trata-se da primeira simulação que resolve, sem atalhos, as equações completas da relatividade geral sob domínio da radiação.
O estudo foi publicado no The Astrophysical Journal e liderado por Lizhong Zhang, pesquisador do Institute for Advanced Study (IAS) e do Flatiron Institute. A equipe utilizou dois dos supercomputadores mais poderosos do planeta para alcançar um nível de detalhe que, até agora, estava além do alcance da ciência computacional.
Por décadas, simulações de buracos negros dependeram de aproximações — especialmente na hora de lidar com radiação, que interage de forma complexa com o gás ao redor do buraco negro. A nova abordagem abandona esses atalhos e trata a radiação como ela realmente se comporta no espaço-tempo curvado pela gravidade extrema.
“O nosso é o único algoritmo que faz isso hoje”, disse Zhang. O código desenvolvido pela equipe consegue capturar os fluxos de matéria, a emissão de luz, os ventos e até a formação de jatos com base na física completa.
O foco do estudo foram os buracos negros estelares, com cerca de 10 massas solares. Embora não produzam imagens como as de buracos supermassivos, esses objetos oferecem evolução rápida e espectros detalhados, permitindo comparar a simulação com observações reais.

A concordância entre os espectros simulados e os dados astronômicos foi considerada notável — uma prova de que o modelo reflete fielmente o que ocorre no cosmos.
A simulação foi realizada em duas máquinas exascale: Frontier (Oak Ridge) e Aurora (Argonne). Com poder de cálculo de quintilhões de operações por segundo, elas permitiram rodar o código AthenaK, otimizado para enfrentar o problema mais desafiador da astrofísica computacional moderna.
Christopher White (Flatiron e Princeton) desenvolveu o algoritmo de transporte de radiação. Patrick Mullen (Los Alamos), ex-membro do IAS, liderou a integração ao código principal.
A simulação é apenas a primeira de uma série. A equipe agora pretende aplicar o novo framework a diferentes sistemas — inclusive buracos negros supermassivos como o de M87 ou o Sgr A*, no centro da Via Láctea. A ideia é testar se o modelo se mantém robusto em escalas maiores e sob diferentes condições físicas.
“Essa conquista une duas coisas raras: software de ponta e tempo de máquina em supercomputadores de elite”, explicou James Stone, coautor do estudo e professor no IAS. “Agora começa o trabalho de entender tudo o que esses dados podem revelar.”