Ciência

Startup produz molécula no tomate para tratamento do colesterol ruim

Peptídeo inibe a proteína que degrada receptores no fígado responsáveis por capturar LDA da circulação sanguínea

A plataforma e a molécula estão em processo de patenteamento (./Thinkstock)

A plataforma e a molécula estão em processo de patenteamento (./Thinkstock)

AF

Agência Fapesp

Publicado em 25 de agosto de 2021 às 11h57.

Última atualização em 25 de agosto de 2021 às 12h15.

Pesquisadores da startup paulista Crop Biotecnologia desenvolveram uma plataforma para expressar em tomate peptídeos (moléculas de aminoácidos que compõem as proteínas) para o tratamento de doenças crônicas.

Por meio da plataforma, os pesquisadores já obtiveram um peptídeo para o tratamento do colesterol por via oral, que inibe a pró-proteína convertase subtilisina/kexina tipo 9 (PCSK9) – molécula que degrada receptores no fígado responsáveis por capturar colesterol ruim (LDA) da circulação sanguínea.

Desenvolvidas por meio de um projeto apoiado pelo Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), da Fapesp, a plataforma e a molécula estão em processo de patenteamento e já despertaram o interesse de licenciamento por duas indústrias farmacêuticas e de investimento por um fundo de venture capital.

“Por meio de entrevistas que realizamos na fase final da participação no programa PIPE Empreendedor, conseguimos obter duas cartas de interesse de indústrias farmacêuticas e a assinatura de um term sheet [acordo de pré-investimento] com um fundo de venture capital”, disse Lucas Ribeiro, cofundador e diretor científico da Crop Biotecnologia, em palestra no encerramento da 18ª turma do programa de capacitação em empreendedorismo de alta tecnologia.

Antes de participar do PIPE Empreendedor, a ideia dos fundadores da empresa era cultivar tomates que expressam o peptídeo inibidor da PCSK9, liofilizá-los e fornecer o produto na forma de um extrato em pó para indústrias do segmento de nutracêuticos e de alimentos funcionais. O aditivo pode ser encapsulado em uma matriz vegetal também desenvolvida pela empresa e integrante da plataforma, que confere maior estabilidade do peptídeo ao pH estomacal, permitindo que seja administrado via oral, e aumenta a absorção intestinal.

Ao conversar durante o treinamento com representantes de 47 empresas, eles constataram, contudo, que o mercado de nutracêuticos é 30 vezes menor do que o farmacêutico. Além disso, teriam de superar barreiras de regulamentação, por ser tratar de um produto obtido por engenharia genética de um fruto.

“Com base nessa constatação, começamos a olhar para o mercado farmacêutico, em que o peptídeo tem alto potencial de comercialização”, relatou Ribeiro.

De acordo com estudos de mercado, o segmento de medicamentos para redução de colesterol cresce 3% ao ano e deve atingir o valor de US$ 37,7 bilhões em 2027. Os principais medicamentos existentes hoje para essa finalidade são as estatinas e os anticorpos monoclonais.

Ao conversar com representantes da indústria farmacêutica e potenciais investidores, porém, os empreendedores constataram que a plataforma para desenvolver peptídeos terapêuticos com administração via oral teria mais valor do que somente a molécula para o tratamento de colesterol alto.

“Para os potenciais investidores, seria interessante que nossa plataforma abrangesse outros peptídeos terapêuticos”, afirmou Ribeiro.

A partir dessa dica, os empreendedores fizeram um rastreamento de peptídeos terapêuticos utilizados que poderiam ser desenvolvidos por meio da plataforma e identificaram 95.

A maior parte desses peptídeos é administrada de forma injetável e eles apresentam potenciais riscos de complicações na aplicação. Além disso, o custo de produção é muito alto.

O custo para sintetizar por via química apenas 100 miligramas do peptídeo inibidor da PCSK9, por exemplo, é de cerca de R$ 70 mil.

“As entrevistas que fizemos durante o PIPE Empreendedor nos deram novas ideias para tentarmos obter provas de conceito mais rápidas e expressar outras moléculas já validadas por meio da plataforma que desenvolvemos”, ressaltou Ribeiro.

A estratégia de licenciar a plataforma também possibilita ganhar mais fôlego para novos projetos, avaliou Aruã Prudenciatti, CEO e cofundador da empresa.

“Foi uma alternativa que vimos para superar o “vale da morte” de startups de biotecnologia, que levam anos para desenvolver um produto e gerar receita. É fundamental ter saídas no meio do caminho, como o licenciamento de tecnologias que gerem capital para reinvestir em outras ideias”, afirmou.

Interação com o mercado

Ajudar as startups a girar em outras direções e testar novas hipóteses – pivotar, no jargão do empreendedorismo – é um dos principais objetivos do curso oferecido pelo PIPE-FAPESP desde 2016.

Foram treinados ao longo dos cinco anos de existência do curso representantes de quase 400 startups apoiadas pelo PIPE-FAPESP, em diversas áreas de atuação e com alto potencial de crescimento.

A última edição reuniu pesquisadores fundadores de 21 startups nos segmentos de agritech, construtech, industrial, logística, healthtech e biotech.

“O objetivo do programa é oferecer treinamento para que os empreendedores acessem e interajam com o mercado e consigam aumentar suas redes de relacionamento comerciais”, diz Marcelo Nakagawa, membro da Coordenação da Área de Pesquisa para Inovação da FAPESP e um dos coordenadores do programa.

Os participantes são estimulados durante o treinamento a entrevistar cem potenciais clientes, parceiros e usuários da tecnologia que estão desenvolvendo para evoluir seus modelos de negócios.

O evento pode ser assistido na íntegra em https://fapesp.br/15023.

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