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Médicos estudam problemas de anestesia com ajuda de ovelhas

Estudos estão apontando para efeitos colaterais perturbadores que variam do delírio a uma imunossupressão que prolifera o câncer

(Peter Cade/Getty Images)

Lucas Agrela

Publicado em 17 de fevereiro de 2019 às 05h55.

Última atualização em 17 de fevereiro de 2019 às 05h55.

Debaixo de lençóis cirúrgicos verdes e de um emaranhado de tubos, uma ovelha saudável e jovem está passando por um procedimento de bypass cardiopulmonar para ajudar a responder a uma de várias perguntas urgentes sobre um pilar da medicina moderna: a anestesia.

Quase dois séculos depois de os anestésicos terem revolucionado a cirurgia, cada vez mais estudos estão apontando para efeitos colaterais perturbadores que variam do delírio a uma imunossupressão que prolifera o câncer. Pesquisadores sedaram a ovelha no mês passado na Universidade de Melbourne, na Austrália, para tentar entender por que operações comuns a coração aberto provocam lesão renal aguda em até um terço dos pacientes -- como parte de um trabalho mais amplo para estudar o impacto da anestesia no sistema imunológico, no cérebro e em outros órgãos.

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As descobertas já estão contradizendo décadas de mensagens reconfortantes sobre o caráter inofensivo de ser colocado em um estado similar ao sono. “Os anestesistas, agora, procuram dizer que, na verdade, não é tão seguro assim”, disse Andrew Davidson, chefe de pesquisa em anestesia do Murdoch Children’s Research Institute, em Melbourne. "As pessoas não morrem na sala de cirurgia, mas muitos não voltam para casa.”

Dos 200 milhões de adultos em todo o mundo que se submetem anualmente a cirurgias não-cardíacas, mais de 1 milhão morre nos 30 dias seguintes. Esse risco salta para 1 em 20 pacientes com 70 anos ou mais.

Riscos

A menos de dois quilômetros do centro de Davidson, no Royal Children’s Hospital em Melbourne, grupos separados do Florey Institute of Neuroscience and Mental Health e do Peter MacCallum Cancer Centre estão trabalhando para entender se os gases voláteis inalados, como o isoflurano e o sevoflurano -- usados pelos anestesistas em 80 por cento dos pacientes para deixá-los inconscientes -- podem ser mais prejudiciais do que agentes intravenosos como o propofol e o fentanil.

Como 313 milhões de operações são realizadas a cada ano, as descobertas podem ter implicações econômicas e sociais globais significativas e podem ser o prenúncio de uma mudança de paradigma no tratamento cirúrgico, dizem os pesquisadores.

O conhecimento científico sobre o assunto é conflitante e incompleto. Um estudo de Davidson e colegas, publicado na quinta-feira na revista médica Lancet, concluiu que uma hora de anestesia geral na primeira infância não tem impacto duradouro no desenvolvimento do cérebro humano. Mas algumas cirurgias podem durar mais tempo e os médicos da Mayo Clinic descobriram uma relação entre anestesia e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade em crianças (TDAH).

A relação com o TDAH é “cientificamente plausível, mas a evidência não é sólida”, segundo Davidson.

Estado anormal

As descobertas sobre a neurotoxicidade estão desafiando as crenças tradicionais de que a anestesia geral simplesmente “desliga o cérebro” por um período, após o qual ele volta ao estado pré-anestésico, disse Davidson.

“A anestesia é um estado muito anormal para o cérebro”, disse ele. “Então faz sentido que os circuitos cerebrais não sejam os mesmos antes e depois do anestésico.”

Isso provavelmente não seja importante em pacientes adultos jovens, disse Davidson. “Mas se o paciente for velho ou muito jovem, então talvez comece a ter importância.”

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