Mutação: mesmo uma dose dez vezes mais tóxica de inseticida matou apenas 30% dos mosquitos (Joao Paulo Burini/Getty Images)
AFP
Publicado em 11 de janeiro de 2023 às 14h56.
Última atualização em 11 de janeiro de 2023 às 15h22.
Os mosquitos que transmitem a dengue e outras doenças virais desenvolveram uma alta resistência a inseticidas em algumas regiões da Ásia, de modo que novos métodos são urgentemente necessários para impedir sua propagação — de acordo com um estudo japonês publicado recentemente.
A aplicação de inseticidas em áreas infestadas por mosquitos é uma prática comum em regiões tropicais e subtropicais. A resistência já era uma preocupação, mas a magnitude do problema não era exatamente conhecida até agora.
O cientista japonês Shinji Kasai e sua equipe estudaram mosquitos de vários países asiáticos e de Gana e observaram mutações genéticas que tornam alguns imunes a inseticidas amplamente usados, como a permetrina.
"No Camboja, mais de 90% dos mosquitos Aedes aegypti, principal vetor dos vírus da dengue, zika, chikungunya e febre amarela, têm uma combinação de mutações que levam a um nível de resistência extremamente alto", explicou Kasai, entrevistado pela AFP.
Este diretor do Departamento de Entomologia Médica do Instituto Nacional de Doenças Infecciosas do Japão descobriu que alguns tipos de mosquito, que deveriam ser 100% eliminados com inseticidas, não passam de 7%.
Mesmo uma dose dez vezes mais tóxica matou apenas 30%. Os níveis de resistência variam de acordo com a região.
"São totalmente diferentes" entre o Camboja e o Vietnã, por exemplo, detalha Kasai.
Seu trabalho também revelou que, em Gana, em partes da Indonésia e de Taiwan, os inseticidas existentes continuam funcionando por enquanto.
Também se observou a resistência a inseticidas no "mosquito tigre" (Aedes albopictus), embora em menor grau.
Este estudo publicado no final de dezembro no periódico Science Advances mostra que "as estratégias comumente usadas podem não ser eficazes" para controlar populações de mosquitos nocivos", afirmou o professor Cameron Webb, especialista da Universidade de Sydney entrevistado pela AFP.
Novos produtos químicos são necessários, mas autoridades e cientistas também devem pensar em novos métodos de proteção, como as vacinas, ressalta Webb.
Apenas algumas vacinas contra a dengue estão disponíveis atualmente. A do grupo farmacêutico japonês Takeda foi aprovada no ano passado pela Indonésia, e depois pela União Europeia, enquanto o uso da vacina do grupo francês Sanofi é muito limitado, porque pode agravar a doença em pessoas que nunca contraíram esse vírus.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os casos de dengue aumentaram dramaticamente em todo mundo nos últimos 20 anos, com entre 100 e 400 milhões de infecções por ano. Mais de 80% dos casos são leves, ou assintomáticos, mas há complicações com risco de vida.
Kasai, que teme que os mosquitos super-resistentes que identificou se espalhem para outras partes do mundo "em um futuro próximo", também recomenda que os inseticidas variem mais, mas o problema é que seus modos de ação são, com frequência, parecidos.
As alternativas são intensificar os esforços para eliminar as zonas de reprodução desses insetos, ou esterilizar os mosquitos machos por meio da bactéria Wolbachia, um método inovador que já deu resultados animadores em nível local.
Onde e quando exatamente as mutações de resistência a inseticidas apareceram em mosquitos ainda é um mistério.
Kasai agora está expandindo sua pesquisa para outras regiões da Ásia e também examina amostras mais recentes do Camboja e do Vietnã para ver se algo mudou, em comparação com seu estudo anterior, que cobriu o período 2016-2019.
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