Ciência

Cientistas criam transistor que simula funcionamento de neurônios

Dispositivo consegue enxergar a luz, contar e armazenar informação em sua própria estrutura, prescindindo de uma unidade complementar de memória

Neurônios: transistor foi produzido por técnicas de crescimento epitaxial – isto é, pela deposição de camadas ultrafinas sobre um substrato cristalino (Getty Images/Getty Images)

Neurônios: transistor foi produzido por técnicas de crescimento epitaxial – isto é, pela deposição de camadas ultrafinas sobre um substrato cristalino (Getty Images/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 24 de abril de 2017 às 09h26.

Um transistor capaz de simular algumas funcionalidades dos neurônios foi criado a partir de experimentos e modelagens realizados por pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), da Universidade de Wurzburg, na Alemanha, e da Universidade da Carolina do Sul, nos Estados Unidos.

O dispositivo, que possui partes micrométricas e partes nanométricas, consegue enxergar a luz, contar e armazenar informação em sua própria estrutura, prescindindo de uma unidade complementar de memória.

Sua descrição consta do artigo “Nanoscale Tipping Bucket Effect in a Quantum Dot Transistor-Based Counter”, publicado na revista Nano Letters. A pesquisa foi apoiada pela FAPESP por meio dos projetos “Propriedades de transporte e computação quântica em nanoestruturas”, “Network for nano-optics and nano-electronics” e “Fenômenos ópticos e de transporte em nanodispositivos”.

“Nesse trabalho, demonstramos a capacidade de transistores baseados em pontos quânticos [quantum dots] executarem operações complexas diretamente na memória. Isso pode levar ao desenvolvimento de novos tipos de dispositivos e circuitos computacionais, nos quais as unidades de memória estejam combinadas com as unidades de processamento lógico, economizando espaço, tempo e consumo de energia”, disse Victor Lopez Richard, professor do Departamento de Física da UFSCar e um dos coordenadores do estudo.

O transistor foi produzido por técnicas de crescimento epitaxial – isto é, pela deposição de camadas ultrafinas sobre um substrato cristalino.

Nessa base microscópica, gotas nanoscópicas de arseneto de índio funcionam como pontos quânticos, confinando elétrons em estados quantizados.

As funcionalidades de memória decorrem da dinâmica de carga e descarga elétrica dos pontos quânticos, engendrando padrões de corrente com periodicidade modulável pela voltagem aplicada nas portas [gates] do transistor ou pela luz absorvida pelos pontos.

“A grande virtude do nosso dispositivo é que ele possui uma memória intrínseca, armazenada como carga elétrica no interior dos pontos quânticos. O xis da questão é controlar a dinâmica dessas cargas de modo que o transistor possa manifestar diferentes estados. Suas funcionalidades englobam as capacidades de contar, lembrar e realizar as operações aritméticas simples normalmente feitas pelas calculadoras. Porém em escalas de espaço, tempo e energia incomparavelmente menores”, informou Richard.

Segundo o pesquisador, não se espera que o transistor venha a ser utilizado em computação quântica porque esta baseia-se em outros efeitos quânticos, como o “emaranhamento”.

O emaranhamento ocorre quando pares ou grupos de partículas são gerados ou interagem de tal maneira que o estado quântico de cada partícula não pode ser descrito independentemente, mas depende do conjunto, por mais distantes que as partículas se encontrem umas em relação às outras.

Mas pode levar à elaboração de uma plataforma utilizável em equipamentos como contadoras ou calculadoras, com a memória intrinsecamente vinculada ao próprio transistor, e todas as funcionalidades disponíveis dentro do mesmo sistema, em escala nanométrica, sem a necessidade de um espaço outro para o armazenamento.

“Além disso, como os pontos quânticos são sensíveis a fótons, podemos dizer que o transistor é capaz de enxergar a luz. E, tanto quanto a voltagem elétrica, a absorção fotônica possibilita controlar a dinâmica de carga e descarga dos pontos quânticos, simulando as respostas sinápticas e algumas funcionalidades neurais”, acrescentou.

Mas novas pesquisas serão necessárias antes que o transistor possa vir a ser utilizado como recurso tecnológico.

Porque, por enquanto, ele só funciona em temperaturas extremamente baixas, da ordem de 4 kelvin, correspondentes à temperatura do hélio líquido.

“Nossa meta é torná-lo funcional em outros patamares – até mesmo na temperatura ambiente. Para isso, os espaços eletrônicos do sistema deverão estar suficientemente espaçados, de forma a não serem afetados pela temperatura. Será preciso controlar melhor também as técnicas de síntese e crescimento do material, de modo a sintonizar os canais de carga e descarga. E a quantização dos estados armazenados nos pontos quânticos”, ressalvou Richard.

Este conteúdo foi originalmente publicado no site da Agência Fapesp.

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