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Das "Highlands" à Guanabara, gaitas de fole ressoam no Rio de Janeiro

O toque exótico é um chamariz para fazer apresentações em outros municípios, como em Maricá, em 28 de maio, para celebrar o aniversário de 208 anos da cidade

A banda da escola de música Vieira Brum em Maricá (AFP/AFP)
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AFP

Publicado em 3 de junho de 2022 às 16h43.

Última atualização em 3 de junho de 2022 às 16h58.

Coqueiros, areia, 30 graus a menos de um mês do inverno e o som de... gaitas de fole!? O cenário inusitado se passa em uma praia de Maricá, município da região dos Lagos do Rio de Janeiro, onde jovens de "kilt" fazem ecoar esse instrumento tipicamente escocês.

Davi Portugal, de 11 anos, se esforça para segurar firme o instrumento que é quase do seu tamanho. A cada sopro, suas bochechas incham como bolas de tênis.

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"Gostei do som porque é muito bonito, é diferente", diz à AFP o menino, que sonha em entrar para a Marinha.

Com o irmão, Caio, de 14 anos, ele faz parte da banda da escola Vieira Brum de São Gonçalo, cidade da região metropolitana do Rio de Janeiro. O toque exótico é um chamariz para fazer apresentações em outros municípios, como em Maricá, em 28 de maio, para celebrar o aniversário de 208 anos da cidade.

"A primeira vez que ouvi alguém tocar a gaita causou um impacto muito grande em mim, mas de primeira não queria aprender de forma nenhuma porque teria de usar o 'kilt'. Então causou uma estranheza porque ainda existe um certo preconceito no nosso país", diz Jhonny Mesquita, de 32 anos, regente da banda escolar, a respeito da saia xadrez típica usada pelos homens na Escócia.

"Mas depois, aprendendo sobre a cultura, e o que esse instrumento representa, as pessoas acabam entendendo a história. O som me chamou a atenção. É um som diferenciado, que não se vê em todo lugar", acrescenta.

"O Pelé da gaita"

Mesquita foi buscar as origens de sua nova paixão em uma viagem de duas semanas que fez à Escócia em 2017.

Em um vídeo, ele aparece em um estádio de Aberdeen (nordeste da Escócia), tocando Asa Branca, de Luiz Gonzaga, usando camisa da seleção brasileira por cima do kilt e fazendo embaixadinha com uma bola de futebol.

"Isso repercutiu muito, fui chamado de 'Pelé da gaita de fole' em jornais", conta, orgulhoso, este rapaz negro de cabelos curtos, que assim como os outros integrantes do grupo veste 'kilt' nas cores vermelha, preta e branca, boina preta, jaqueta azul marinho e uma pequena bolsa de couro.

Mesquita é uma pequena celebridade em São Gonçalo: professor de música em colégios, tocou gaita em programas de TV e até no prestigiado Teatro Municipal do Rio de Janeiro.

Mas o que mais o orgulha é ver jovens de bairros carentes se interessarem pela música graças a este instrumento tão peculiar.

"A essência do nosso projeto é atrair jovens e ocupar a mente deles para que fiquem longe das drogas, da prostituição, da marginalidade", explica.

Ele também dirige a associação Brasil-Escócia, um coletivo de 18 gaiteiros que também se apresentam "em comunidades em que a gente nem pode tirar fotos para registrar devido à criminalidade", além de unidades socioeducativas, para onde são levados menores infratores.

A banda da escola de música Vieira Brum toca em praça de Maricá, Rio de Janeiro (AFP/AFP)

Novos horizontes

Mesquita aprendeu a tocar a gaita aos 15 anos na escola Vieira Brum, graças a um militar que tocava em um grupo da Marinha e decidiu dar aulas nesse centro educacional.

Desde então, transmite seu conhecimento para as novas gerações de rapazes que vestem com orgulho a saia escocesa.

Com um orçamento apertado, a criatividade é vital para cobrir as despesas da associação.

"É difícil trazer o instrumento de fora, a maioria das gaitas foi doada. Também recebemos uniforme da polícia escocesa. Já os 'kilts' foram confeccionados pela mãe de um integrante do grupo", conta Mesquita.

A associação foi chamada para participar em julho de um festival na Bélgica, mas acabou desistindo do convite por falta de patrocínio.

"Era a primeira vez que uma banda brasileira tinha sido convidada a esse evento que já acontece há 35 anos. Tentamos de todas as formas, mas realmente as passagens aumentaram muito", lamenta.

O "Pelé de la gaita" se consola em ver que o instrumento ampliou os horizontes de seus alunos.

"Jovens que pareciam sem futuro promissor acabam ganhando bolsas universitárias, maior facilidade para entrar na Marinha, Aeronáutica" em bandas militares, enumerou.

"É emocionante ver meu filho tocar, ver a dedicação dele. Por enquanto, toca pandeirola. Pediu para aprender a gaita de fole também. Fica muito entusiasmado. Melhorou até o estudo dele", diz Alice Cortes da Silva, ex-aluna da escola, muito orgulhosa ao ver, João Luciano, de 9 anos, tocar na praia em Maricá.

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