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Com apelo dos consumidores, grifes incluem diversidade nas lideranças

Pressionados pelos consumidores e pela repercussão nas redes sociais, grifes se movimentam para incluir lideranças mais diversas

Virgil Abloh, em Paris: primeiro afrodescendente em cargo de direção no Grupo LVMH. (Edward Berthelot/Getty Images)
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Julia Storch

Publicado em 5 de julho de 2022 às 08h40.

Ainda são poucos os exemplos de pessoas negras comandando grandes marcas. Em março deste ano, o britânico Maximilian Davis foi nomeado o novo diretor criativo da italiana Salvatore Ferragamo. Nascido em Manchester, na Inglaterra, Davis se formou pela prestigiada instituição London College of Fashion. Há dois anos ele fundou sua marca homônima, Maximilian.

A história de Davis se assemelha à de Virgil Abloh, que por meio de um estágio na Fendi entrou em contato com os grandes players da moda, até o lançamento da sua Off-White e a nomeação em 2018 como diretor artístico da Louis Vuitton, se tornando o primeiro afro-americano com o cargo em uma marca de luxo francesa.

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Muitas vezes, no entanto, as contratações escondem segundas intenções. O termo “penhasco de vidro” foi cunhado pela publicação Business of Fashion e define a contratação de mulheres e grupos minorizados como um último esforço para liderar uma empresa em apuros. A estratégia é baseada em bons resultados do mercado. Em 2019, por exemplo, o Grupo LVMH teve um crescimento de 20% nas vendas atribuído à nomeação de Abloh.

Quando o recorte é de gênero, quase exclusivamente os homens brancos ocupam cargos de CEO em grandes casas de moda. Um dos poucos exemplos de mudança aconteceu em dezembro do ano passado, quando a ­Chanel nomeou Leena Nair, uma ex-executiva da Unilever, para o cargo mais alto.

Porém, as lideranças diversas se resumem a poucos nomes quando relacionadas a importantes marcas tradicionais de moda. Nenhuma mulher negra dirigiu uma grande empresa de moda na última década. “Quando olhamos para a cadeia produtiva da moda, vemos a população negra trabalhando em chão de fábrica”, comenta Adriana Barbosa, fundadora da Feira Preta e CEO da Casa PretaHub. “Ainda estamos no começo das contratações de pessoas negras em cargos de liderança. Quando afunilamos para o campo da moda, ainda há um tabu sobre o processo intelec­tual, de quem faz o design. Ainda somos vistos como mão de obra”, diz.

Para a estilista Cíntia Felix, fundadora da marca AZ Marias, as pessoas negras precisam ter padrões altos para provar para os outros que são capazes. No ano passado, Felix fez sua estreia na São Paulo Fashion Week, ao ser apadrinhada pelo projeto Sankofa. “A união das potências não tira o lugar de ninguém, mas traz o reconhecimento para pessoas e empresas”, diz.

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Adriana Barbosa, da Feira Preta: marcas precisam ter mais diversidade em seus quadros (Divulgação/Divulgação)

O projeto, que se tornou fixo em todas as edições da semana de moda, agora inclui maior diversidade étnica e racial no line up dos desfiles e no casting de modelos e fotógrafos. “O tratado instituiu a proporcionalidade de profissionais em 50% em suas equipes em trabalhos dentro e fora da São Paulo Fashion Week. É um compromisso da pessoa com o mercado”, conta Rafael Silvério, criador da marca Silvério, cocriador da start­up Vamo (Vetor Afro-Indígena na Moda) e do projeto Célula Preta, no evento Casa de Criadores.

Para a CEO e cofundadora do Ateliê Xongani, Ana Paula Xongani, o processo de entendimento da moda afro-brasileira aconteceu durante a graduação em design de moda, quando ela percebeu a ausência de pesquisas sobre o assunto e decidiu explorar a temática. “Sou empresária de moda porque é a plataforma para transformar os discursos, para conversar. A moda para mim é um meio, e não um fim”, comenta.

Segundo dados da consultoria McKinsey, em 2019 as mulheres ocupavam, em média, 26% dos cargos no conselho em empresas de varejo e de consumo, e representavam 14% dos executivos. Já pessoas etnicamente diversas preenchiam apenas 16% dos assentos do conselho e 13% dos cargos executivos. Para a consultoria, em cinco anos de pesquisa com 1.000 empresas em 15 países, foi notada uma conexão entre a diversidade na liderança das empresas e a probabilidade de melhora do desempenho financeiro. “As empresas no quartil superior em diversidade de gênero têm 25% mais chances de superar as do quartil inferior. Da mesma forma, as empresas no quartil superior em diversidade étnica têm 36% mais chances de superar seus pares menos diversificados.”

Os consumidores também são um fator de mudança nas marcas. “A exigência por diversidade, de modo geral, é uma ação muito potente, principalmente por meio das redes sociais, com muitas pessoas falando como as marcas precisam se adequar. Os consumidores não aceitam mais estar em um lugar de aceitar sem questionar”, diz Xongani.

Para a empresária, a demora nas mudanças empresariais acontece pelo processo de observação das próprias fragilidades. “São poucas as marcas que estão dispostas a fazer esse olhar de revisão, de se perceberem gordofóbicas, racistas e capacitistas. Movimentar-se para esse lugar de pensar diversidade é o primeiro passo para se perceber falho.”

Maximilian Davis, em Londres: formado pela London College of Fashion, diretor da Ferragamo e dono de marca independente (Tolga Akmen/AFP/Getty Images)

Barbosa concorda com Xongani em relação às atitudes necessárias para mudanças nas lideranças empresariais. “Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que há um déficit entre as contratações. Isso é importante para entender onde está a ausência. A partir desse primeiro diagnóstico, é preciso começar a construir um plano que parta do princípio da cultura organizacional. Não se trata apenas de ação, é preciso mudar a mentalidade”, diz.

Um exemplo de empresa americana que buscou revisão em seu quadro de colaboradores é a Levi’s, que passou por reestruturações para aumentar as políticas raciais na empresa após o assassinato de George Floyd, em 2020. Na época, a marca centenária de jeans mapeou a composição racial dos funcionários nos Estados Unidos e se comprometeu a equiparar no caso dos executivos de liderança.

Nos mais de 20 anos alavancando empresas fundadas por pessoas negras por meio da Feira Preta, Adriana Barbosa comenta ter notado mudanças significativas no mercado. “Pautas ativistas começaram a refletir dentro dos setores de varejo, que está mais suscetível para escutar o que o consumidor quer. Mas falta trazer essas vozes para dentro dessas empresas, para ajudar na construção dessa transformação social e mercadológica. Temos pautas ativistas e identitárias dentro de um setor de varejo, e isso é um processo que eu não vejo em outro país da América Latina. O Brasil é uma referência, mas ainda temos muita história para contar.”

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