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Somar para multiplicar

Parcerias entre empresas, inclusive concorrentes, ajudam a reduzir custos, ganhar competitividade e, principalmente, fazer coisas novas

Luciana Astolpho, do Grupo Libra, e Alcino Therezo Jr., da Santos Brasil, entre os funcionários que participaram do treinamento em conjunto das duas empresas: elas desenharam um curso e formaram 30 profissionais, dos quais 17 foram contratados (Fabiano Accorsi/VOCÊ RH)
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Da Redação

Publicado em 15 de julho de 2014 às 10h05.

São Paulo - Em vez de inimigo, parceiro . É assim que algumas empresas estão enxergando seus concorrentes. Na contramão da lógica industrial tradicional, em que as inovações são guardadas a sete chaves, já há companhias que estão fomentando a criação de ideias em conjunto e compartilhando o desenvolvimento de novos produtos, projetos e programas que atendam às necessidades de ambos os lados.

Ainda pontual no mercado, esse tipo de parceria deve ganhar espaço, especialmente na gestão de pessoas . “Unir esforços para inovar é uma grande tendência”, diz Felipe Monteiro, especialista em inovação aberta e professor da escola de negócios Insead, na França. “Os gestores começaram a perceber que nenhuma empresa, por mais completa que seja, tem todo o conhecimento dentro dos próprios muros.”

Os números ajudam a reforçar essa percepção. De acordo com um estudo divulgado em setembro de 2013 pela consultoria PwC, as empresas que colaboraram três vezes mais com parceiros externos na hora de inovar cresceram mais rapidamente, a uma taxa de 62% nos últimos cinco anos, ante 21% das que não fizeram parcerias.

“A capacidade de buscar sinergia com programas e multiplicar os resultados dos investimentos é muito maior se estivermos juntos”, afirma Cláudia Falcão, diretora de RH e sustentabilidade do Grupo Libra.

Cláudia foi procurada em 2012 por um de seus principais concorrentes, a Santos Brasil. Com sérias dificuldades para contratar mão de obra, o diretor de RH da empresa portuária, Alcino Therezo Jr., fez duas tentativas mais comuns para solucionar o problema.

A primeira foi qualificar as pessoas da região de Santos por meio do Sistema S, mas logo percebeu que não havia cursos adequados para formar profissionais no setor. Depois, tentou formar pessoas dentro da empresa — e esbarrou nos altos custos.

Foi então que o executivo teve a ideia de se unir a alguém que estivesse enfrentando os mesmos desafios. E não pensou em ninguém melhor do que o próprio concorrente. Assim nasceu, em 2012, a parceria da Santos Brasil com o Grupo Libra.

Juntas, as empresas procuraram a Universidade Católica de Santos (UniSantos), desenharam o conteúdo do treinamento, ofereceram as instalações para o curso e dividiram os custos com professor. As 30 pessoas que participaram do treinamento de nível técnico (entre estudantes de engenharia e tecnólogos da região do porto) também foram selecionadas pelas duas companhias.

“Desenvolvemos o curso a seis mãos”, afirma Luciana Astholfo, gerente de RH/ADM do Grupo Libra, responsável pelo projeto na empresa. O curso durou seis meses e formou estagiários em sala de aula e na operação das companhias. Ao fim, a Santos Brasil contratou 14 pessoas, e o Grupo Libra efetivou três.

“Em um processo como esse todo mundo sai ganhando”, diz Therezo Jr. “Quem não começar a pensar em compartilhar processos de formação e qualificação, num mercado em que falta mão de obra qualificada, vai acabar disputando profissionais, inflacionando o mercado e, por fim, inviabilizando o negócio.”

Também satisfeito com o resultado, o Grupo Libra passou a investir em outras parcerias. Hoje, a empresa está desenvolvendo, no Rio de Janeiro, um projeto de formação de jovens na área de logística com empresas do mesmo setor da região e com o governo do estado.

“Além de conseguirmos formar um banco de cadastro com profissionais qualificados, reduzimos custos, seja no processo seletivo, porque diminui o risco de erros de contratação, seja no processo de qualificação”, afirma Cláudia.

Foi também pensando no custo-benefício que a cervejaria holandesa Heineken e a fabricante americana de alimentos Mars implantaram em 2012 o primeiro programa de trainees integrado. De cara, o modelo chamou a atenção dos candidatos. Atraídos pela oportunidade de ingressar em duas empresas de nome ao mesmo tempo, uma população de quase 20.000 jovens entrou numa disputa para conquistar uma entre as dez vagas oferecidas.

Além da exposição para as duas marcas, o programa compartilhado possibilitou a formação de profissionais com mais de uma visão de negócio a um custo reduzido. A Across, consultoria responsável pelo desenho do projeto, cobrou o valor de um único programa de trainee, mas o preço foi dividido pelas duas empresas.

Durante o programa, as companhias também aproveitaram o momento em que todos estavam juntos para reduzir custos com treinamento, salas e logística. Para Fernanda Bueno, gerente de inovação da Across, ao adotar um modelo como esse, o gestor de RH sinaliza que está pensando fora da caixinha.

“Nesse caso, os profissionais de RH puderam demonstrar que são realmente estratégicos e olham também para o negócio e para o mercado”, diz.

De dentro para fora

Um bom começo para se aproximar de um potencial parceiro é convidá-lo para conversar. Sim, só para isso. Quase como quem chama um vizinho para tomar café. Você também pode se convidar para entrar na casa dele — receber um não é o pior que pode acontecer. O melhor é sair de lá com a cabeça cheia de ideias.

Foi assim com a Telefônica Vivo. Em outubro de 2013, a empresa pediu para participar da Festa do Futuro, da Natura, um momento em que os funcionários da fabricante de cosméticos se reúnem para contribuir com novos pensamentos. A Natura disse sim, e seis funcionários da Telefônica Vivo puderam entrar na festa.

“Partimos do pressuposto de trocar ideias livremente, sem precisar desenvolver projetos comerciais imediatamente”, diz Pablo Larrieux, diretor do Centro de Inovação da Telefônica Vivo.

Desse momento, nasceram 15 ideias, e uma delas — o desenvolvimento de um sensor para colocar na embalagem dos produtos — já virou protótipo. A Natura gostou tanto de receber convidados que realizou o segundo encontro, com a empresa Arco, de tecnologia.

“É possível fazer isso com outras empresas, desde que os temas tenham interface para uma boa conversa, e as pessoas gostem de trocar ideias”, afirma Angela Montebello, coordenadora de desenvolvimento de RH da Natura.

Cientes de que boas conversas podem render as melhores histórias, algumas companhias já investem em estruturas mais robustas para promover esse tipo de encontro. A petroquímica Braskem mantém uma área de inovação de tecnologia com 300 funcionários espalhados pelo mundo dedicados a compartilhar projetos.

“Cerca de 20% dessas pessoas estão trabalhando agora de alguma forma com outras empresas em um objetivo comum, com propósitos semelhantes, novas rotas do setor petroquímico, tecnologia e produtos”, afirma Marcelo Arantes, vice-presidente de pessoas e organização.

Extremamente estratégica, a área de inovação da Braskem foi responsável por 19% da receita da companhia em 2013, o que representou 41 bilhões de dólares.

Também preocupada em gerar mais ideias além de suas equipes, a DuPont inaugurou no Brasil, em 2012, o Centro de Inovação. Já é o sétimo da companhia no mundo. O objetivo é trazer clientes e parceiros para trabalhar em conjunto com a empresa e apontar necessidades e desafios da indústria.

No último ano, mais de 360 projetos foram desenvolvidos em parceria com outras empresas. Além de solucionar os problemas e introduzir novas tecnologias no mercado, a DuPont ganhou um potencial de 250 milhões de ­reais em vendas com os projetos desenvolvidos no Brasil para os próximos quatro anos.

Um deles foi com a fabricante de autopeças Magneti Marelli. Num esforço conjunto, as duas empresas prepararam o primeiro cárter — recipiente que armazena o óleo do motor do carro — feito de plástico do país, que deverá chegar ao mercado em 2015.

“Somente quando compartilhamos ideias conseguimos multiplicar o conhecimento”, diz Claudia Pohlmann, diretora de recursos humanos da DuPont, revelando que as maiores inovações acontecem quando você derruba os próprios muros.

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São Paulo - Em vez de inimigo, parceiro . É assim que algumas empresas estão enxergando seus concorrentes. Na contramão da lógica industrial tradicional, em que as inovações são guardadas a sete chaves, já há companhias que estão fomentando a criação de ideias em conjunto e compartilhando o desenvolvimento de novos produtos, projetos e programas que atendam às necessidades de ambos os lados.

Ainda pontual no mercado, esse tipo de parceria deve ganhar espaço, especialmente na gestão de pessoas . “Unir esforços para inovar é uma grande tendência”, diz Felipe Monteiro, especialista em inovação aberta e professor da escola de negócios Insead, na França. “Os gestores começaram a perceber que nenhuma empresa, por mais completa que seja, tem todo o conhecimento dentro dos próprios muros.”

Os números ajudam a reforçar essa percepção. De acordo com um estudo divulgado em setembro de 2013 pela consultoria PwC, as empresas que colaboraram três vezes mais com parceiros externos na hora de inovar cresceram mais rapidamente, a uma taxa de 62% nos últimos cinco anos, ante 21% das que não fizeram parcerias.

“A capacidade de buscar sinergia com programas e multiplicar os resultados dos investimentos é muito maior se estivermos juntos”, afirma Cláudia Falcão, diretora de RH e sustentabilidade do Grupo Libra.

Cláudia foi procurada em 2012 por um de seus principais concorrentes, a Santos Brasil. Com sérias dificuldades para contratar mão de obra, o diretor de RH da empresa portuária, Alcino Therezo Jr., fez duas tentativas mais comuns para solucionar o problema.

A primeira foi qualificar as pessoas da região de Santos por meio do Sistema S, mas logo percebeu que não havia cursos adequados para formar profissionais no setor. Depois, tentou formar pessoas dentro da empresa — e esbarrou nos altos custos.

Foi então que o executivo teve a ideia de se unir a alguém que estivesse enfrentando os mesmos desafios. E não pensou em ninguém melhor do que o próprio concorrente. Assim nasceu, em 2012, a parceria da Santos Brasil com o Grupo Libra.

Juntas, as empresas procuraram a Universidade Católica de Santos (UniSantos), desenharam o conteúdo do treinamento, ofereceram as instalações para o curso e dividiram os custos com professor. As 30 pessoas que participaram do treinamento de nível técnico (entre estudantes de engenharia e tecnólogos da região do porto) também foram selecionadas pelas duas companhias.

“Desenvolvemos o curso a seis mãos”, afirma Luciana Astholfo, gerente de RH/ADM do Grupo Libra, responsável pelo projeto na empresa. O curso durou seis meses e formou estagiários em sala de aula e na operação das companhias. Ao fim, a Santos Brasil contratou 14 pessoas, e o Grupo Libra efetivou três.

“Em um processo como esse todo mundo sai ganhando”, diz Therezo Jr. “Quem não começar a pensar em compartilhar processos de formação e qualificação, num mercado em que falta mão de obra qualificada, vai acabar disputando profissionais, inflacionando o mercado e, por fim, inviabilizando o negócio.”

Também satisfeito com o resultado, o Grupo Libra passou a investir em outras parcerias. Hoje, a empresa está desenvolvendo, no Rio de Janeiro, um projeto de formação de jovens na área de logística com empresas do mesmo setor da região e com o governo do estado.

“Além de conseguirmos formar um banco de cadastro com profissionais qualificados, reduzimos custos, seja no processo seletivo, porque diminui o risco de erros de contratação, seja no processo de qualificação”, afirma Cláudia.

Foi também pensando no custo-benefício que a cervejaria holandesa Heineken e a fabricante americana de alimentos Mars implantaram em 2012 o primeiro programa de trainees integrado. De cara, o modelo chamou a atenção dos candidatos. Atraídos pela oportunidade de ingressar em duas empresas de nome ao mesmo tempo, uma população de quase 20.000 jovens entrou numa disputa para conquistar uma entre as dez vagas oferecidas.

Além da exposição para as duas marcas, o programa compartilhado possibilitou a formação de profissionais com mais de uma visão de negócio a um custo reduzido. A Across, consultoria responsável pelo desenho do projeto, cobrou o valor de um único programa de trainee, mas o preço foi dividido pelas duas empresas.

Durante o programa, as companhias também aproveitaram o momento em que todos estavam juntos para reduzir custos com treinamento, salas e logística. Para Fernanda Bueno, gerente de inovação da Across, ao adotar um modelo como esse, o gestor de RH sinaliza que está pensando fora da caixinha.

“Nesse caso, os profissionais de RH puderam demonstrar que são realmente estratégicos e olham também para o negócio e para o mercado”, diz.

De dentro para fora

Um bom começo para se aproximar de um potencial parceiro é convidá-lo para conversar. Sim, só para isso. Quase como quem chama um vizinho para tomar café. Você também pode se convidar para entrar na casa dele — receber um não é o pior que pode acontecer. O melhor é sair de lá com a cabeça cheia de ideias.

Foi assim com a Telefônica Vivo. Em outubro de 2013, a empresa pediu para participar da Festa do Futuro, da Natura, um momento em que os funcionários da fabricante de cosméticos se reúnem para contribuir com novos pensamentos. A Natura disse sim, e seis funcionários da Telefônica Vivo puderam entrar na festa.

“Partimos do pressuposto de trocar ideias livremente, sem precisar desenvolver projetos comerciais imediatamente”, diz Pablo Larrieux, diretor do Centro de Inovação da Telefônica Vivo.

Desse momento, nasceram 15 ideias, e uma delas — o desenvolvimento de um sensor para colocar na embalagem dos produtos — já virou protótipo. A Natura gostou tanto de receber convidados que realizou o segundo encontro, com a empresa Arco, de tecnologia.

“É possível fazer isso com outras empresas, desde que os temas tenham interface para uma boa conversa, e as pessoas gostem de trocar ideias”, afirma Angela Montebello, coordenadora de desenvolvimento de RH da Natura.

Cientes de que boas conversas podem render as melhores histórias, algumas companhias já investem em estruturas mais robustas para promover esse tipo de encontro. A petroquímica Braskem mantém uma área de inovação de tecnologia com 300 funcionários espalhados pelo mundo dedicados a compartilhar projetos.

“Cerca de 20% dessas pessoas estão trabalhando agora de alguma forma com outras empresas em um objetivo comum, com propósitos semelhantes, novas rotas do setor petroquímico, tecnologia e produtos”, afirma Marcelo Arantes, vice-presidente de pessoas e organização.

Extremamente estratégica, a área de inovação da Braskem foi responsável por 19% da receita da companhia em 2013, o que representou 41 bilhões de dólares.

Também preocupada em gerar mais ideias além de suas equipes, a DuPont inaugurou no Brasil, em 2012, o Centro de Inovação. Já é o sétimo da companhia no mundo. O objetivo é trazer clientes e parceiros para trabalhar em conjunto com a empresa e apontar necessidades e desafios da indústria.

No último ano, mais de 360 projetos foram desenvolvidos em parceria com outras empresas. Além de solucionar os problemas e introduzir novas tecnologias no mercado, a DuPont ganhou um potencial de 250 milhões de ­reais em vendas com os projetos desenvolvidos no Brasil para os próximos quatro anos.

Um deles foi com a fabricante de autopeças Magneti Marelli. Num esforço conjunto, as duas empresas prepararam o primeiro cárter — recipiente que armazena o óleo do motor do carro — feito de plástico do país, que deverá chegar ao mercado em 2015.

“Somente quando compartilhamos ideias conseguimos multiplicar o conhecimento”, diz Claudia Pohlmann, diretora de recursos humanos da DuPont, revelando que as maiores inovações acontecem quando você derruba os próprios muros.

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